quarta-feira, 30 de março de 2011

Política doméstica poluiu debate sobre direitos humanos

A decisão do governo brasileiro de apoiar o envio de um representante da Comissão de Direitos Humanos da ONU ao Irã produziu uma grande confusão. O ambiente já estava envenenado, mas este é outro assunto. Eu queria voltar à Comissão de Direitos Humanos porque, nesse imbróglio todo, as críticas que mais ouvi foi que ela seria "hipócrita", porque não investiga a situação de direitos humanos das ditaduras árabes, não investiga Israel ou Honduras e, sobretudo, não investiga as violações cometidas pelos americanos.
Não é verdade. Mais uma vez, as pessoas confundem as limitações do Conselho de Segurança e da Assembléia-Geral da ONU, onde os EUA tem poder de veto, com a Comissão de Direitos Humanos, onde não há poder de veto. Na Comissão, discute-se sobre tudo, nenhum país escapa.
Eu mesmo fiz declarações apressadas, mas meu erro não foi defender a Comissão, e sim defendê-la pouco, sem estar embasado em dados mais consistentes. Agora que eu estou pesquisando as atividades e o histórico da CDH da ONU, surpreendo-me em saber que há relatórios sobre Arábia Saudita, inúmeras denúncias contra Israel, relatórios sobre Colômbia, Yemen, Bahrein, Myanmar, o golpe de Estado em Honduras, sobre Costa do Marfim, etc.
Os EUA tem sido alvo de várias missões e relatórios da CDH da ONU. Há um relatório, por exemplo, que denuncia duramente os EUA pelos abusos cometidos no Iraque, com base em documentos vazados pelo Wikileaks.
O Brasil também foi visitado muitas vezes por representantes da CDH, que não pouparam críticas aos problemas encontrados por aqui.
Não são justas, por isso, as acusações de que a CDH seria "hipócrita" ao decidir enviar um representante para checar a situação de direitos humanos no Irã. A CDH tem sido aberta às denúncias de abuso em qualquer país, sem discriminação. Ao votar para o envio de representante ao Irã, o Brasil foi coerente com votações similares referentes a outros países.
Também não é verdade que se trata da "primeira vez" que o Brasil vota contra o Irã. O certo é que essa é a primeira votação do gênero sobre o Irã, país que tem sido alvo frequente de discussões sobre direitos humanos por parte de especialistas, e não apenas por causa da perseguição norte-americana, mas por denúncias graves de abusos feitas por intelectuais iranianos respeitados e pela sociedade civil do país. Assim como há denúncias feitas contra vários outros países.
Ao Brasil interessa fortalecer as organizações multilaterais, e estabelecer limites ditados pelo direitos internacional. O governo Lula não votou em favor do Irã nas últimas votações que ocorreram no Conselho de Segurança e na Assembléia Geral porque ele negasse que houvesse problemas na área de direitos humanos no país, e sim porque ele entendeu que, no primeiro caso, o assunto era o direito ao enriquecimento de urânio e, no segundo, o fórum não era o correto. Na votação realizada na Assembléia Geral, a representante brasileira foi bem enfática ao declarar que a posição do Brasil, ao se abster, era um protesto contra o fato de que o assunto estava sendo tratado no lugar errado; direitos humanos devem ser tratados na Comissão de Direitos Humanos, porque aí há muito menos manipulação por interesses geopolíticos.
De: Óleo do Diabo

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