sábado, 8 de outubro de 2011

Che Guevara: herói, mito ou ícone?

Dia 8 de outubro, lembramos o assassinato de Che Guevara. Na real, ele foi capturado dia 8, mas morto, provavelmente dia 9. Pouco importa. O que importa é que o Che, consagrou-se como uma figura simbólica do revolucionarismo dos anos 60. Isso é suficiente.
Che foi um revolucionário na acepção mais estrita do termo. Um cara que deseja e participava de uma revolução. Era cruel? Cheirava mal? Fumava? Cuspia no chão? Tanto faz. Foi um revolucionário e sua iamgem permanece até os dias de hoje.
Não gosto de heróis, pois acabam sendo descontextualizados e elevados à perfeição. Não gosto de mitos, porque fogem do terreno da história. Tornam-se inatacáveis e inquestionáveis. E nada pode ser sacralizado. Prefiro o Che como um ícone. Um  símbolo de coisas boas pelas quais se deve lutar até as últimas consequências. Isso não morre.

O Gigante não está mais adormecido. Convenhamos...ficou bonito o vídeo

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

A morte de Steve Jobs, o inimigo número um da colaboração

Rodrigo Savazoni, em NovaE

Steve Jobs morreu, após anos lutando contra um câncer que nem mesmo todos os bilhões que ele acumulou foram capazes de conter. Desde ontem, após o anúncio de seu falecimento, não se fala em outra coisa. Panegíricos de toda sorte circulam pelos meios massivos e pós-massivos. Adulado em vida por sua genialidade, é alçado ao status de ídolo maior da era digital. É inegável que Jobs foi um grande designer, cujas sacadas levaram sua empresa ao topo do mundo. Mas há outros aspectos a explorar e sobre os quais pensar neste momento de sua morte.
Jobs era o inimigo número um da colaboração, o aspecto político e econômico mais importante da revolução digital. Nesse sentido, não era um revolucionário, mas um contra-revolucionário. O melhor deles.
Com suas traquitanas maravilhosas, trabalhou pelo cercamento do conhecimento livre. Jamais acreditou na partilha. O que ficou particularmente evidente após seu retorno à Apple, em 1997. Acreditava que para fazer grandes inventos era necessário reunir os melhores, em uma sala, e dela sair com o produto perfeito, aquele que mobilizaria o desejo de adultos e crianças em todo o planeta, os quais formam filas para ter um novo Apple a cada lançamento anual.
A questão central, no entanto, é que o design delicioso de seus produtos é apenas a isca para a construção de um mundo controlado de aplicativos e micro-pagamentos que reduz a imensa conversação global de todos para todos em um sala fechada de vendas orientadas.
O que é a Apple Store senão um grande shopping center virtual, em que podemos adquirir a um clique de tela tudo o que precisamos para nos entreter? A distopia Jobiana é a do homem egoísta, circundado de aparelhos perfeitos, em uma troca limpa e “aparentemente residual”, mediada por apenas uma única empresa: a sua. Por isso, devemos nos perguntar: era isso que queríamos? É isso que queremos para o nosso mundo?
Essa pergunta torna-se ainda mais necessária quando sabemos que existem alternativas. Como escreve o economista da USP, Ricardo Abramovay, em resenha sobre o novo livro do professor de Harvard Yochai Benkler The Penguin and the Leviathan, a cooperação é a grande possibilidade deste nosso tempo.
“Longe de um paroquialismo tradicionalista ou de um movimento alternativo confinado a seitas e grupos eternamente minoritários, a cooperação está na origem das formas mais interessantes e promissoras de criação de prosperidade no mundo contemporâneo. E na raiz dessa cooperação (presente com força crescente no mundo privado, nos negócios públicos e na própria relação entre Estado e cidadãos) estão vínculos humanos reais, abrangentes, significativos, dotados do poder de comunicar e criar confiança entre as pessoas.”
Colaboração: essa, e não outra, é a palavra revolucionária. E Jobs não gostava dela.

Menino de 11 anos é flagrado com revólver em escola gaúcha

Foto meramente ilustrativa do absurdo
Um estudante de 11 anos foi flagrado com um revólver calibre 32 dentro da mochila, na Escola Municipal de Educação Fundamental Hector da Luz Gorostide. O estabelecimento fica na localidade de Nossa Senhora das Graças, na zona rural de Quaraí (RS).
O responsável pela instituição de ensino, professor João Carlos da Rosa, desconfiou da agitação do menino e recolheu a mochila. Nela, foram localizados o revólver e mais cinco cartuchos intactos.
Conforme o professor, o aluno, que cursa a 5ª série do Ensino Fundamental, "está na escola há quatro anos e é considerado uma criança calma, que nunca havia apresentado problemas de comportamento".
Integrantes da Secretária Municipal de Educação, da Brigada Militar e do Conselho Tutelar foram acionados. Durante conversa com a conselheira tutelar o estudante informou que o revólver pertencia ao avô.
A mãe do jovem foi chamada à delegacia para prestar esclarecimentos. Segundo a conselheira tutelar, Taíse Corrêa, o menino será encaminhado para atendimento psicológico.

Albert Khan, o arquiteto da indústria de Detroit

arquitectura construcao
Arquitectos moldam as faces das cidades e, sem uma assinatura física, o estilo, materiais e elementos usados criam uma identidade muito própria. Na metrópole moderna é difícil identificar essas características e, ainda mais o é, ver na totalidade e como um todo o trabalho de um criador, um artista e um artesão.
Recuando cem anos, até ao início do século XX, com todo o desenvolvimento que o caracteriza, é possível demarcar o legado de cada arquitecto quer pela inovação quer pela estética ímpar, numa amálgama ainda mais ou menos ordenada no panorama arquitectónico. É o caso de Albert Kahn.
Sendo um dos arquitectos mais prolíficos na história Americana, e apesar de ter projectado mais de 1000 (junto com seus associados) edifícios um pouco por todo o mundo ao longo da sua carreira, Kahn, é muitas vezes apelidado como o ‘Arquitecto de Detroit’, cidade onde grande parte da sua obra ganha forma e a sua influência é mais vincada.
Ainda que o traço dos seus edifícios fosse na maioria das vezes minimalista, de linhas limpas e simples, era um designer pragmático que não se prendia a um estilo, estrutura ou organização únicos ou estritos. Além disso, possuía valores que tornavam os seus clientes leais. Tremendamente energético e com uma capacidade de focalização excepcional, era dos poucos capazes de administrar efectivamente e completar projectos dentro do tempo e orçamento estipulados, o que rapidamente atraiu capitalistas do ramo automóvel em Detroit, como Henry Ford ou Walter P. Chrysler.
Albert Kahn é o pai da fábrica americana, trazendo o modernismo europeu ao local onde as linhas de montagem foram inventadas, e criando algumas das maiores fábricas jamais construídas.
Apesar desta forte ligação à terra-natal, as origens de Kahn estão bem longe da América que o tornou famoso. O mais velho de oito irmãos, nasceu na Alemanha em 21 de Março de 1869. Logo após o seu nascimento, a família mudou-se para o Luxemburgo, de onde migrariam para os EUA em 1880, especificamente para a cidade de Detroit, no Michigan.
arquitectura construcao
Filho de um rabino – Joseph –, de trabalho instável, e de uma mãe ligada às artes visuais e à música – Rosalie –, pouco tardou para que Albert fosse obrigado a descontinuar a sua educação secundária para ajudar no sustento da família.
Além do seu interesse pela música, por influência da mãe, Albert Kahn tinha um dom para o desenho, o qual descobriu ainda muito jovem, aperfeiçoou e que lhe garantiu um emprego como aprendiz na famosa firma de arquitectos Mason & Rice, onde ingressou em 1884 e trabalhou diligentemente. A sua dedicação compensou e, aos 22 anos ganhou uma bolsa de estudo na Europa, podendo viajar a fim de desenvolver e complementar a sua formação, prática comum entre jovens arquitectos.
Porém, Kahn não tinha a formação académica de muitos daqueles que conheceu, pelo que quando voltou a Detroit juntou-se novamente à Mason & Rice. Só em 1895 foi fundada a Albert Kahn Associates, depois de anos a criar um estilo de construção aliciante, no qual o betão reforçado substituiu a madeira, permitindo não só uma melhor protecção contra o fogo mas, mais importante, a existência de enormes espaços interiores completamente desobstruídos.
Kahn e o seu escritório de 600 pessoas estiveram envolvidos em projectos para as forças armadas nas duas Grandes Guerras, para a Universidade do Michigan, variados edifícios públicos e privados, e para as fábricas. Estas, particularmente as da indústria automóvel, foram a maior consquista de Albert. A Ford River Rouge Plant é com certeza o melhor dos exemplos da arquitectura de Kahn, com os seus transportadores cruzados, enormes chaminés e uma escala monumental, empregando no seu auge 120,000 pessoas.
Em 1938, quatros anos antes da morte de Albert, a sua firma era responsável por 20 por cento de todas as fábricas da América. O seu sucesso e, consequente, volume de negócio imortalizaram Albert Kahn e as suas técnicas de construção, uso de novos materiais, aplicação de formas geométricas minimalistas e falta de ornamentação, fascinando, ainda hoje, arquitectos, artistas plásticos e historiadores.
Com uma carreira de mais de meio século, Kahn, ajudou a catapultar a América para o sucesso, naquele que foi provavelmente o período mais frenético da era industrializada. Isto tudo baseando-se em dois princípios: simplicidade e adaptação dos modelos tradicionais a novas exigências e tecnologias.
arquitectura construcao
arquitectura construcao
arquitectura construcao
arquitectura construcao


Leia mais em obvious

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

1887: Nasce o arquiteto Le Corbusier

Le Corbusier

Em 6 de outubro de 1887 nascia Charles-Édouard Jeanneret, mais conhecido como Le Corbusier, cuja obra revolucionou a arquitetura do século 20.

 
Nascido em La Chaux-de-Fonds, nos Alpes da Suíça francesa, Le Corbusier foi, juntamente com Walter Gropius e Mies van der Rohe, um dos principais precursores da Arquitetura Moderna. Sua obra foi essencial para a formação do modernismo brasileiro.
Se foi o alemão Mies van der Rohe quem deu forma à arquitetura racionalista difundida em países do Norte, como os Estados Unidos, Reino Unido e Japão, foi a obra de Le Corbusier que resgatou a herança greco-romana e um certo tempero do Oriente para a arquitetura dos países do Sul. Para ele, a arquitetura nos Alpes suíços, nas montanhas do Rio e nas ruas de Paris deveria ser semelhante àquela das costas do Mediterrâneo.

Homem de letras

Le Corbusier incorporou o que Marx chamou de o "homem renascentista do futuro". Foi pintor, arquiteto, designer e, como escritor, publicou mais de 50 livros em 60 anos de trabalho. Não foi à toa que, ao ser perguntado pela profissão, na ocasião de sua naturalização como cidadão francês, por volta de 1930, Le Corbusier respondeu: "Letrado".
Após uma série de viagens pela Europa e Turquia e após estágios nos escritórios de Auguste Perret, em Paris, e Peter Behrens, em Berlim, Charles-Édouard Jeanneret deixou finalmente sua cidade natal para viver em Paris em janeiro de 1917.
Através de publicações como a revista L'Esprit Nouveau (O Espírito Novo) e o livro Por uma Arquitetura, editados no início dos anos de 1920, Le Corbusier defende o purismo na arquitetura e lança as bases de um modernismo racionalista.
Seus estudos para estruturas independentes de pilares e lajes o levam a formular, no final dos anos de 1920, aquilo que se poderia chamar a lei fundamental do Modernismo: os "cinco pontos da arquitetura".
Prédio de Le Corbusier na Weissenhofsiedlung, em Stuttgart
Bildunterschrift: Großansicht des Bildes mit der Bildunterschrift:  
Prédio de Le Corbusier na Weissenhofsiedlung, em Stuttgart
Tais pontos foram materializados em projetos como a Villa Savoye, nos arredores de Paris, com seus pilotis, sua planta e fachada livres, seu teto-jardim e suas janelas corridas horizontais.
Tropicalismo
A viagem à América do Sul em 1929 foi essencial para a correção que se nota em seu racionalismo, a partir de 1930. Le Corbusier entregou-se não somente aos braços de Josephine Baker, com quem viajou no mesmo navio, mas deixou-se inebriar pelas montanhas do Rio e pelo curso sinuoso dos rios que viu, ao inaugurar a primeira linha de aviação comercial aérea, em viagem de Assunção para São Paulo pilotada pelo autor Saint-Éxupery.
Diferentemente do plano urbanístico que fez para Buenos Aires, Montevidéu e São Paulo, o desenho sinuoso dos prédios projetados para o Rio de Janeiro marca o início da segunda fase de Le Corbusier. Chamada de maneirista pelo crítico americano Charles Jencks, esta fase vem a influenciar de forma decisiva a opção modernista dos brasileiros de resgatar o passado colonial e mediterrâneo.
Le Corbusier voltaria poucos anos mais tarde ao Brasil para dirigir o projeto da sede do Ministério da Educação e Cultura, no Rio de Janeiro, em 1936. Entre os arquitetos que trabalhavam com Le Corbusier no primeiro arranha-céu modernista da história estavam Lúcio Costa, Afonso Eduardo Reidy e Oscar Niemeyer.

Curvas barrocas

Se a presença de Le Corbusier foi essencial para o desenvolvimento do mais importante movimento da arquitetura brasileira, a obra do pupilo Niemeyer o influencia em sua última fase, que Charles Jencks denomina de "barroca".
Tal influência se comprova no concreto das curvas da capela de Capela de Notre-Dame-du-Haut, em Ronchamp, ou nos projetos para a cidade indiana de Chandigarh.
A personalidade de Le Corbusier nem sempre foi, no entanto, das mais fáceis. Sua colaboração com o governo de Vichy durante a ocupação nazista na França e seu comportamento quanto ao projeto das Nações Unidas são exemplos do egoísmo e da ambição do mestre franco-suíço.

A arte da arquitetura

Le Corbusier tentou impedir que Niemeyer apresentasse seu projeto vencedor para a sede da ONU, já que não queria modificações em sua proposta original. Outros incidentes similares são também citados por Charles Jencks na monografia que escreveu sobre Le Corbusier.
Entretanto, nem Niemeyer nem Jencks deixam de reconhecer a genialidade de Le Corbusier, que sempre tentou dar um tom humano à sociedade industrial, aceitando a intelectualidade e o lirismo da arte e a arquitetura como parte dela.
 
Carlos Albuquerque, em Deutsche Welle

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Reitoria da USP retira placa de obra que falava em 'Revolução de 1964'

Ana Carolina Moreno Do G1, em São Paulo
Placa que cita a 'Revolução de 1964' provocou protestos na USP (Foto: Ana Carolina Moreno/G1)
Placa que cita a 'Revolução de 1964' provocou protestos na USP (Foto: Ana Carolina Moreno/G1)
A placa de um monumento em construção na Cidade Universitária, em São Paulo, foi retirada após receber protestos da comunidade da Universidade de São Paulo (USP). Ela indicava que, na Praça do Relógio, estava sendo construído um “Monumento em homenagem aos mortos e cassados na Revolução de 1964”.
Em protesto, membros da comunidade uspiana escreveram as palavras "golpe", "ditadura" e "massacre" ao redor do termo "revolução".
Placa que cita a 'Revolução de 1964' provocou protestos na USP (Foto: Ana Carolina Moreno/G1)
Funcionário retirou a placa na tarde desta terça-feira (4)
(Foto: Ana Carolina Moreno/G1)
Por volta das 13h desta terça-feira (4), funcionários da construtora que realiza a obra foram até o local para retirar a placa. Ela foi guardada atrás dos muros que fecham a construção. Os funcionários não souberam explicar quando uma nova placa seria afixada.
A reitoria da USP afirmou que "houve um erro na confecção da placa". Segundo a assessoria de imprensa, "o nome correto é 'Monumento em Homenagem aos Mortos e Cassados durante o Regime Militar'. Trata-se de um projeto do Núcleo de Estudos da Violência da USP (NEV/USP)."
A assessoria de imprensa do núcleo confirmou o erro, que teria acontecido no momento de grafar a placa, e afirmou, em nota, que o projeto tem como objetivo lembrar as vítimas dos "numerosos casos de mortes, tortura, prisões ilegais, cassações e casos de perseguição política a indivíduos" que aconteceram dentro da USP.
A lista dos nomes que irão figurar do memorial, segundo o NEV/USP, será produto da pesquisa em andamento, realizada pelos pesquisadores do núcleo, "a partir de diversos levantamentos prévios". Um deles foi publicado em livro em 2004.
A ministra Maria do Rosário, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, considerou "um absurdo" o termo utilizado na placa. "O episódio mostra a importância do projeto Direito à Memória e à Verdade, que demonstra que em 1964 houve um golpe seguido de uma ditadura", diz ela, que lembrou, ainda que o próprio nome da secretaria, que apoia a construção do monumento, foi escrito incorretamento.
Segundo a assessoria de imprensa do órgão, "o nome correto é Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e não Secretaria Especial de Direitos Humanos".

Homenagem
De acordo com informações da construtora, as obras tiveram início em agosto e devem terminar em novembro. O custo total do monumento é de R$ 89.088,13 e a inauguração está prevista para dezembro de 2011.
Os funcionários disseram que o monumento, que fica em frente ao Auditório Camargo Guarneri e a um dos prédios residenciais da Cidade Universitária, será composto de 14 placas de concreto onde estarão inscritos os nomes das pessoas cassadas e mortas durante o regime militar, que durou entre 1964 e 1985.
Canteiro de obras do monumento em homenagem aos mortos no regime militar, na USP (Foto: Ana Carolina Moreno/G1)Canteiro de obras do monumento que será construído dentro do campus da Cidade Univeristária para lembrar os mortos no regime militar (Foto: Ana Carolina Moreno/G1)

Mais uma do camarada Koba!

3 de outubro é a data comemorativa da reunificação das Alemanhas divididas no pós-guerra. Há exatos 21 anos houve essa junção, ou, como muitos dizem, a anexação da Alemanha Oriental pela Ocidental, depois da derrota da União Soviética e a derrocada dos regimes comunistas no leste europeu.
A reunificação, portanto, seria um processo ainda em curso, e que levará anos e gerações. De qualquer modo, 3 de outubro é um dia de festa na Alemanha e particularmente em Berlim, a cidade destruída pela guerra e depois fraturada pelo Muro, esse grande equívoco histórico do regime comunista.
Seja como for, há um dado interessante a ser lembrado. A primeira Alemanha a se constituir legalmente foi a Ocidental. A criação da Alemanha Oriental foi uma reposta a este gesto “separatista”, ambas gestadas ainda na década de 40.
A primeira proposta séria de reunificação das Alemanhas partiu de quem? Do camarada Koba, aliás, Josef Stalin, imaginem! (Ossip Koba era o nome de guerra do camarada nos tempos de clandestinidade no Partido Comunista). Foi feita num documento chamado de “Nota de Março”, em 1952, através do chanceler Andrei Gromyko. Stain propunha às potências ocidentais a criação de uma só Alemanha, unificada e desmilitarizada.
Ao longo do ano a proposta acabou rejeitada, à luz da doutrina mantida, sobretudo, pelos Estados Unidos a partir de um documento identificado pela sigla NSCR 68 (National Security Council Report 68), de 1950 (ainda ao tempo de Truman como presidente), mas também à luz do medo atávico da França e da Inglaterra de uma Alemanha unida. Também colaborou para a rejeição a avaliação de que uma Alemanha unificada, desmilitarizada e neutra na Guerra Fria que já galopava pelo mundo acabaria sendo inevitavelmente atraída para a órbita soviética.
A proposta de Stalin colocou a política norte-americana diante de um dilema. A primeira face do dilema era a de que ele poderia estar fazendo uma mera jogada para a platéia mundial, e assim encurralar os Estados Unidos num canto do ringue, além de caracteriza-los como “inimigos eternos” da unidade alemã. Stalin propunha uma Alemanha, livre, com liberdade de imprensa, pluripartidarismo (!), eleições livres, liberdade religiosa, etc. Também propunha que um ano depois da adoção da proposta as potências vencedoras da Segunda Guerra (o Brasil também foi um vencedor da Segunda Guerra, mas não era uma potência...) deveriam retirar seus exércitos do território alemão. Além disso, a Alemanha deveria ter acesso irrestrito ao mercado internacional – e não deveria ter alianças militares.
A segunda face, porém, foi trazida à baila por James Warburg, banqueiro norte-americano nascido na Alemanha, num depoimento perante o senado em Washington, ainda no mês de março, logo após Gromyko ter entregado a famosa nota aos representantes das potências ocidentais. Warburg, que fora conselheiro de Roosevelt (embora se afastasse dele por causa de certas medidas do New Deal...) e era membro do Conselho de Relações Exteriores, afirmou que uma das dúvidas do governo norte-americano era a de que Stalin poderia muito bem não estar blefando ao fazer a proposta.
Isso poderia trazer muito mais incômodo para a posição norte-americana que, na época, à luz do NSCR 68, privilegiava a consolidação das posições militares ao invés da ação diplomática. A principal objeção norte-americana à proposta era a de que uma Alemanha livre deveria ter a liberdade de integrar a OTAN, cuja criação datava de 1949, e fora acelerada a partir de 1950 com a deflagração da Guerra da Coréia.
A proposta também não teve acolhida na Alemanha Ocidental (criada em maio de 1949, meses antes da criação da Alemanha Oriental, que foi uma retaliação), pois a orientação do então chanceler Konrad Adenauer (democrata-cristão) era privilegiar a integração daquela ao Ocidente. Durante 1950 houve uma troca de mensagens cada vez mais irritadas entre a União Soviética e as potências ocidentais, até que finalmente a proposta foi considerada definitivamente fora do jogo.
Noam Chomsky é citado como um dos que considera que Stalin provavelmente não estava blefando com sua proposta. É muito possível que não estivesse mesmo, pois um estado-tampão (como ficou sendo, mal comparando, o Uruguai entre o Brasil e a Argentina no século XIX...) neutro entre a órbita soviética e o ocidente seria melhor do que a permanente linha de confronto entre as duas Alemanhas. Stalin não deixava de ter razão, como muito bem demonstrou a crise de 1961, quando quase eclodiu um confronto armado entre blindados soviéticos e norte-americanos no ponto conhecido como “Checkpoint Charlie”, cujas conseqüências seriam terríveis em escala mundial).
Até hoje se debate se a adoção da proposta de Stalin teria sido melhor ou não. Vá se saber! Mais uma do camarada Koba!
Flávio Aguiar é correspondente internacional da Carta Maior em Berlim.

segunda-feira, 3 de outubro de 2011

Quando a máscara vira rosto

Eliane Brum, para Época

Ter um ou mais personagens para encarar a pedreira do mundo é não só necessário, como uma questão de sobrevivência. Especialmente se você tiver uma sensibilidade extremada. Nascemos com uma pelezinha de bebê também na alma (e aqui não me refiro ao sentido religioso do termo) e precisamos protegê-la. Se há algo que os outros pressentem é o tamanho da nossa fragilidade. Por isso um chefe abusivo sempre sabe com quem pode gritar – e com quem é melhor não. Muita gente é como aqueles cães de caça farejando o flanco mais indefeso para atacar sua presa. Triste, triste. Mas mais triste é quando, em nome da necessidade de sobreviver, criamos um personagem que se mostra tão útil que acaba se confundindo com nossa derme mais profunda. Se criar personagens é preciso, despir-se deles constantemente é vital. 
Como ando bastante por aí, tanto por razões profissionais quanto por gosto, observo muito as pessoas. E seus personagens. E, muitas vezes, tenho vontade de dizer, e em algumas delas, se há um grau de intimidade que me permita falar sem ofender, eu digo: “Pronto, você já fez o seu show. Agora, por favor, para jantar comigo enfia a máscara dentro da bolsa e relaxa”.
Ninguém se iluda de que é absolutamente verdadeiro o tempo todo, até porque somos muitas verdades ao mesmo tempo e seguidamente elas são contraditórias. Aquelas pessoas que parecem muito “autênticas” porque são extrovertidas, dizem coisas chocantes, se arriscam no estilo, estão muito bem cobertas por suas máscaras e morrem de medo de serem reveladas. A máscara do “autêntico”, “louco” ou “excêntrico” é uma das mais corriqueiras. Este tipo faz piada com o ponto fraco dos outros, dando gargalhadas e batendo nas costas da vítima e, quando alguém reclama, uma meia dúzia de amigos sai em sua defesa dizendo que “é o jeito dele”. Ahan.
Há o tipo “bonzinho” que, mesmo fazendo coisas horríveis e muito bem dissimuladas de vez em quando, é tão convincente no “foi sem querer” ou “ele jamais faria isso de propósito” que é imediatamente perdoado. Existe a “mulherzinha”, tão frágil que parece que vai quebrar a qualquer adjetivo mais eloquente. Esta manipula brilhantemente nossos mais primitivos instintos de proteção e, se você tem a coragem de dizer para ela tomar jeito e prescindir do diminutivo, imediatamente é você quem vira uma megera. E há o seu oposto, “a mulher alfa”, esculpida a navalhadas, que se arma de sapatos de bico fino, terninhos de grife e cortes de cabelo modernos, mas práticos, para arrasar meio mundo a bordo de sua armadura como se o melhor produto do feminismo fosse uma mulher se tornar um clichê de homem.
Enfim, são muitas as fantasias que vestimos para não sermos engolidos pelo mundo. Em geral não somos nem mesmo uma máscara definida, como as que acabei de expor apenas como recurso didático. Não somos Batman, Coringa, Gilda, Bambi ou Madre Tereza de Calcutá. Somos uma mistura de vários estereótipos. E, se é verdade que vestimos máscaras, também é verdade que não há um “eu” essencial – mas sim um “eu” fluido e incapturável, em constante movimento de mutação. E é nesta fluidez do eu, que não pode ser confundida com ausência de rosto, que residem nossas verdades mais profundas.
Acho que nossas máscaras começam a colar no nosso rosto ainda na infância. Uma mistura entre a necessidade de rotular que os pais em geral têm e o nosso desejo de satisfazê-los – ou de escapar da prisão que intuímos. Numa família com mais de um filho é mais fácil perceber. Um é o extrovertido, o outro é o tímido, outro ainda é o rebelde. Ou um é o estudioso que “não dá trabalho nenhum”, o outro é o vagabundo que ninguém sabe “por quem puxou”. E há o outro que tem – socorro! – “transtorno do déficit de atenção e hiperatividade”.
Os pais costumam botar um rótulo em cada filho, e a escola raramente tem competência para, em vez de reforçá-los, quebrá-los para que as crianças tenham outras possibilidades de expressar aquilo que são ou se tornar algo diferente do que foram levadas a ser. Uma pena, porque quebrar máscaras impingidas ainda na infância talvez seja a grande função de um educador. É muito difícil identificar se alguém “é assim” ou se tornou o que sempre ouviu que era. Agora, que as crianças são medicalizadas cada vez mais cedo e os rótulos ganharam status de “diagnóstico”, com a entrada do “especialista”, danou-se.
De fato, ninguém é – todos nós nos tornamos. E este “tornar-se” não é um caminho linear rumo a um rosto definitivo, que daria conta de nossa essência. Não há essência, o que existe é construção a partir de um conjunto de genes, de influências ambientais e experiências as mais variadas, de inscrição no momento histórico e de livre arbítrio – ainda que o livre arbítrio nunca seja tão livre assim. Embora possa ser assustador pensar que não há um “eu” essencial a ser alcançado, de fato é bastante libertador.
Somos uma constante invenção e reinvenção. E, tão importante quanto, desinvenção. Vale a pena não esquecer que sempre podemos nos desinventar. Ainda que carreguemos conosco tudo aquilo que vivemos, a mágica está em dar novos significados a antigas experiências e ter a sabedoria de nos livrarmos do que não é nosso, apenas foi impingido a nós como uma roupa de gosto duvidoso. Por isso, é bom tomarmos muito cuidado para não rotular os outros, como se nossas sentenças fossem imunes de preconceitos. E mais cuidado ainda se estes outros forem os nossos filhos, para que nossos rótulos não virem destino.
Acho que a melhor forma de não impingir máscaras aos outros é não impingi-las a nós mesmos. É bem fácil cair na tentação de transformar uma de nossas máscaras, aquela que nos parece mais eficaz no embate cotidiano, em nosso rosto definitivo. A máscara se torna tão usada que vai se fundindo primeiro à nossa pele, depois aos nossos ossos. Não é que vire ferro, como no clássico de Alexandre Dumas. O problema é que vira carne humana, mesmo. E aí, meu amigo, fica bem difícil de arrancá-la, porque passamos a acreditar que morreremos no processo. Ou que, por trás dela, não há um ou muitos rostos, mas um vazio infinito. Muita gente se agarra a seu personagem com medo de que, se a máscara for arrancada, descubram que não há nada lá. A máscara serviria, neste caso, para esconder a ausência de face.
Tento me livrar da tentação de virar personagem, uma máscara só, pela própria escrita. Parte do ímpeto que me move a inventar outras vozes narrativas para mim e outras bases para estabelecer o cotidiano se dá pelo meu temor de acabar gostando demais de alguma máscara conveniente. Tento me quebrar o tempo todo me jogando em desafios novos sem pensar muito nos riscos para me desgarrar da tentação das certezas sobre mim. Tem funcionado.
Além das mudanças mais profundas, que quem me acompanha nesta coluna está cansado de saber, há pequenas trocas de atitude que podem ser bem divertidas. Eu sempre fui disciplinadíssima, por exemplo. Estou numa luta feroz comigo mesma para deixar de ser. No último final de semana consegui um feito inédito em 45 anos de vida: dormi 16 horas seguidas. Almocei e ainda me entreguei a mais duas horas de sesta. Vou acabar esta coluna e tomar uma cerveja em comemoração a isso.
Sempre fui pontualíssima e, como todas as pessoas pontuais deste país, esperava muito. A ponto de o garçom ficar com pena e vir conversar comigo. Agora, com exceção dos compromissos de trabalho, resolvi deixar todo mundo me esperando. É uma delícia a cara de surpresa dos amigos. Chego e está todo mundo lá. Costumava comer chocolates aos poucos. E, quando ia comer, antecipando o gosto do bombom desmanchando na minha boca, alguém lá de casa já tinha dado cabo dele. E ainda me acusava: “Você faz isso de propósito, para me tentar. Por sua causa, acabo engordando”. Pronto, além de ficar sem chocolate, ainda era culpada pelo descontrole alheio. Mudei. Agora devoro compulsivamente meus chocolates e também o dos outros.
Não, não parecem mudanças muito salutares, eu sei. Mas elas cumprem, pelo menos por algum tempo, a função de me desconstruir tanto aos meus olhos como aos olhos dos outros, que cultivam a pretensão de que a gente seja a mesma até o final dos tempos. Um peso que, com licença, não pretendo arrastar por aí como se fosse meu.
Especialmente nas questões mais profundas, desmascarar a si mesmo é uma prática importante do cotidiano. E também um ato que precisa ser constantemente recriado. Nosso instinto de sobrevivência engendra armadilhas e argumentos bem convincentes para absorver este “duvidar de si mesmo”, que nos mantêm alertas com relação a nossos próprios ardis, e acaba por torná-lo mais um penduricalho que tem apenas um efeito placebo. O que o mercado faz com a contestação ao mercado, transformando-a em um produto, nós fazemos com relação à nossa porção contestadora, ao transformá-la em nossa versão de mercado. De tal forma que, um dia, sem perceber, paramos de tirar a maquiagem no fim da noite e dormimos acreditando que a máscara é a nossa cara.
Dias atrás encontrei um conhecido muito talentoso. É brilhante mais vezes do que a maioria. Arrasta com ele uma legião de fãs. E, principalmente, tem o que dizer porque é um grande criador. Fazia algum tempo que não o encontrava pessoalmente e fiquei estarrecida ao perceber que ele tinha virado um personagem, um bufão. Não mais um bufão como forma de contestar a hipocrisia, mas um bufão como forma de não ser contestado em sua hipocrisia.
Torço para que ele perceba a tempo que a máscara é uma versão bem pobre dele mesmo, já que não tenho intimidade para dizer a ele eu mesma. Enquanto isso, ao testemunhar a figura triste em que ele se transformou, tratei de aprimorar meus próprios alarmes antimáscaras. E escrevi esta coluna na esperança de que ela possa ajudar a acionar a sirene em cada leitor. As máscaras têm sua função, desde que não nos apeguemos a elas a ponto de fazer da mais confortável um rosto que agrada a todos – menos a nós mesmos.
(Eliane Brum escreve às segundas-feiras.)

A gravação de "Get Back" dos Beatles

 Beatles Get Back Musica Pop Gravacao Lennon McCartney
Quando Paul McCartney compôs "Get Back " já há algum tempo que as relações entre os quatro músicos andavam tensas, especialmente com John Lennon. O "regresso" que o refrão da música repete (get back to where you once belonged) era o retorno ao tempo dos espectáculos ao vivo, cuja dinâmica e envolvimento constituia um forte elo de união entre os Beatles. Paul fez tudo para promover as actuações ao vivo mas sem grande sucesso. O famoso concerto de 30 de Janeiro de 1969 no telhado do Apple Studio onde interpretaram "Get Back", foi um desses casos. Foi também a última aparição pública da banda que, pouco tempo depois, se dissolveria. Não houve retorno.
Mas houve outras sessões de gravação deste tema e dos outros que viriam a ser editados no álbum "Let it be", que originalmente se deveria chamar "Get Back". A sessão do telhado foi apenas a mais conhecida e nem sequer foi a escolhida para integrar o álbum. Ficam aqui algumas imagens raras de uma das sessões de estúdio, com o Billy Preston no piano eléctrico e, por breves instantes, o olhar furtivo dos Rolling Stones...


Leia mais em obvious