sábado, 14 de janeiro de 2012

A impopularidade de Clarice Lispector

publicado em Obvious
Talvez Dissesse: Façam eles o que querem de minhas palavras, pouco me importa se as enfiam em suas mochilas ou bolsos rasgados, se as mastigam ou engolem. 
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Quanto mais popular tem se tornado Clarice Lispector, antagonicamente tem se feito impopular. É com esta postura critica que tenho visto a proliferação desmedida de pequenos fragmentos de sua obra, partes amputadas de suas crônicas e romances e contos, disseminados por redes sociais e afins. A autora tem recebido por seus pseudo-discípulos o titulo de “conselheira amorosa”. Existe até um aplicativo, desses de frases automáticas do faceboock com o nome “Conselhos de Clarice Lispector”. Não vejo essa crítica com uma ótica exclusivamente negativista, penso ser um meio de refletirmos até que ponto nos acomodamos com a superfície, nesta sociedade onde a tecnologia cada dia mais acessível a todos, com suas infinitas possibilidades de informação e cultura, que entretanto se apresenta em segmentos superficiais. Fico a imaginar qual seria a postura de Clarice se estivesse viva. Frente a tal fenômeno que pode ser considerado como social, o que diria? Talvez Dissesse: Façam eles o que querem de minhas palavras, pouco me importa se as enfiam em suas mochilas ou bolsos rasgados, se as mastigam ou engolem. E pensar nessa resposta fictícia da autora me fez refletir sobre o papel, que a mesma tem assumido na atual sociedade, que pode ser visto como de resignação, retrocesso, e dissimulação por parte de seus “leitores”.
A obra de arte é circuncidada por aquilo que se vê da própria obra, sempre e cada vez, como se fosse à primeira vez em que foi vista. Essa eterna ressignificação, de atravessamento da singularidade daquele que experimenta a arte, seja ela na literatura, fotografia, pintura, teatro, música, ou qual for a modalidade em foco, será sempre o retorno de demandas internas do espectador. Tal fato, nos faz anuir que, a significação literária se coloca por uma ética do desejo, de quem a produz e experimenta. O tão profundo e o tão raso. São escolhas, que se apresentam marcadas pelo pragmatismo do séc. XXI.
Clarice deixa uma obra que revolucionou a literatura brasileira, e que, ao eleger o Mal como um de seus temas recorrentes, expressa o caráter demoníaco da linguagem. Ela amplia a produção literária de vanguarda, que era até então marcado por um ortodoxismo modernista. E ao assumir o risco pessoal de sua escrita, a configura com um padrão fatalista, mas rompido com o trágico, que emerge com dois contrapontos: O tédio e a auto-agressividade. Mas por outro lado esse campo de luta da escritora é também vivenciado por um terno sentimento de compaixão com a condição existencial, sempre culpada de si mesmo.
“ O pudesse eu um dia escrever uma espécie de tratado sobre a culpa. Como descrevê-la? Aquela que é irremissível, a que não se pode corrigir? (...) A culpa em mim é algo tão vasto e tão enraizado que o melhor ainda é aprender a viver com ela” 
A autora inaugura no Brasil um estilismo literário único, sendo aclamada e atacada pela crítica, por sua impulsividade corrosiva como peculiaridade central de sua escrita, tendo como campo de abordagem a alma humana e suas paixões.
Desse modo como conclui Yudith, crítico literário da autora, “Torna-se inevitável pensarmos esse modelo de sedução e destruição como o protótipo da poética de Clarice, que envolve o leitor, qual marinheiro encantado pela sereia, para em seguida engolir suas convicções e afogá-lo nas águas de um escrita letal. A escrita Clariana é ela mesma testemunho de um salto sobre fragmentos de uma intensa explosão psíquica criativa.“
Segundo Lucio Cardo, amigo de Clarice, em seu Diário Completo, em uma das poucas alusões que faz a autora, diz: “é um longo, exaustivo e minucioso arrolamento de sensações.” Sua escrita é a consumação de incêndio, cujas chamas são a constância de suspiros íntimos e derradeiros. Talvez seja essa uma boa metáfora para se construir uma moldura de seu retrato.
Tendo sua obra inteiramente influência por um traço biografia que é tingido por pessoalidade/personalidade ímpar, que não só estrutura como ainda a diferenciava das demais. Esse engendramento de ficção e vida, é experimentado por ela em uma constante desconstrução literária cuja  fusão de papeis que trocam-se entre si sem regras, e se fundem a gerar cópias de si mesmo, sem se permitir uma distinção racional. Assim se dá sua transmigração textual.
Para Rosenbaum outro crítico, “A ficção que se arma nesse jogo de vozes desmonta as incertezas factuais, imprimindo ao texto um caráter inacabado, aberto, questionando a verdade única da experiência narrada.”
Já para, Sergio Millet, a relação de Clarice com as palavras se faz de não domínio, "não as domina mais, então; elas é que tomam conta dela." O que nos faz entender sua intensa postura de desdobramento subversivo. Que possibilita pensarmos um efeito de embriaguez artística na autora. 
Poderia continuar a pensar, e conectar informações que justificariam minha crítica do mal estar de uma popularidade leiga, que impossibilita o mergulho, o aprofundar, que na literatura assume um caráter incrível, de quem se dispõe por uma perspectiva crítica, ultrapassar um consumo pragmático literário.
E são tantas as histórias que um mesmo romance, conto, ou crônica pode contar de nós mesmo. Por isso reconheçamos os infinitos potenciais da arte literária e não nos conformemos com menos do que, o longo mergulho ao infinito.
Abaixo deixo um trecho de uma crônica de Clarice, A descoberta do mundo, onde a narrativa se desenrola nesse entrelaço de experiências reais e ficcionais da autora.
“(...) fui preparada para ser dada à luz de um modo tão bonito. Minha mãe já estava doente, e, por uma superstição bastante espalhada, acreditava-se que ter um filho curava uma mulher de uma doença. Então fui deliberadamente criada: com amor e esperança. Só que não curei minha mãe. E sinto até hoje essa carga de culpa: fizeram-me para uma missão determinada e eu falhei. Como se contassem comigo nas trincheiras de uma guerra e eu tivesse desertado. Sei que meus pais me perdoaram eu ter nascido em vão e tê-los traído na grande esperança. Mas eu, eu não me perdôo.”
A entrevista que segue abaixo me fez acorda para Clarice Lispector. Sua depressão exalada no olhar, a fadiga das palavras, e pelos minutos que se seguem ao seu discurso, em alguns momentos, sádico, me levou a desejar o mergulho em sua vida e obra. Que tem me embriagado e feito avançar, e trazido a convicção de um infinito de águas a minha frente. 



sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Dilma não vai, Alckmin não vai e eu também não vou ao Forum de Davos

Parece mentira, mas a FSP chegou a esse ponto para poder fazer propaganda de Alckmin e de seu cuidado com o recurso público.

Chineses da linha de produção do Xbox ameaçam suicídio coletivo

Grupo de 300 funcionários foi ao topo da fábrica da Foxconn protestar contra más condições de trabalho
 
Cerca de 300 chineses que trabalham na Foxconn, a maior fabricante de componentes eletrônicos do mundo, anunciaram no último dia 3 que iriam cometer um suicídio coletivo caso seus salários não fossem elevados.
Os funcionários, que trabalham na linha de montagem do console Xbox, da Microsoft, teriam ameaçado jogar-se do topo do edifício depois que a companhia negou-lhes o pedido de aumento salarial. Eles permaneceram na cobertura do prédio por dois dias.
Efe
 
Funcionários caminham rumo à cobertura do edifício
Segundo o jornal britânico The Sun, a Foxconn sugeriu que os insatisfeitos pedissem demissão e recebessem o salário deste mês. A companhia, contudo, não cumpriu sua parte do acordo, o que desencadeou a revolta dos funcionários.
O suicídio só foi evitado quando o prefeito de Wuhan convenceu o grupo de operários a retornar para o interior do prédio. Em entrevista à emissora norte-americana CBS, um porta-voz da Microsoft, uma das clientes da Foxconn, disse que sua empresa “leva a sério as condições de trabalho nas fábricas de seus produtos e que está investigando o caso”.
Fábrica de suicídios
Segundo matéria publicada pelo site italiano Linkiesta e reproduzida no Brasil pela revista Samuel, em 2010, 14 funcionários da Foxconn cometeram suicídio em protesto contra as péssimas condições de trabalho e as baixas remunerações.
A companhia, então, comprometeu-se a rever o número de horas de trabalho, os salários e as horas extras de seus operários. A Sacom (Estudantes e Acadêmicos contra o mal-comportamento corporativo, na sigla em português) revelou, contudo, que a promessa não foi cumprida.

Cerca de 120 entrevistas conduzidas pela ONG provam que os trabalhadores “continuam sendo obrigados a fazer hora extra” ao mesmo tempo em que permanece “um estilo militar de gerenciamento”. Uma ironia quando leva-se em consideração a frase de boas-vindas do contrato de admissão da companhia: ”felicitações por fazer parte da família Foxconn”.
Terry Gou, o principal executivo da empresa, é, segundo os leitores da revista Time, uma das pessoas mais influentes do mundo. Ele planeja deslocar parte das operações da Foxconn para o Brasil, aonde o investimento inicial em linhas de produção equivaleria a 12 bilhões de dólares.
De: Opera Mundi

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

"Como Mentir com Estatística", de Darrell Huff

"O objetivo desta página é desmistificar muitas das idéias pré-concebidas sobre estatísticas, evitando que o "fascínio" por números e percentagens (ou a ignorância sobre como eles foram produzidos) turvem o senso crítico das pessoas".


Fonte: Página da Universidade Federal de Santa Catarina, em Antônio Lassance.

As informações que serão apresentadas aqui são provenientes do livro "Como Mentir com Estatística", de Darrell Huff, com pequenos acréscimos (geralmente exemplos).

    O objetivo desta página é desmistificar muitas das idéias pré-concebidas sobre estatísticas, evitando que o "fascínio" por números e percentagens (ou a ignorância sobre como eles foram produzidos) turvem o senso crítico das pessoas.

    Nem todas as estatísticas veiculadas ao público (principalmente pela mídia) estão erradas ou merecem ser consideradas com suspeição, mas muitas vezes as informações são apresentadas de forma tão incompleta que se torna difícil acreditar nelas.

Para verificar a validade de uma estatística, seja ela veiculada em um jornal de grande circulação, na TV, ou em uma revista especializada, você deve fazer cinco perguntas:

        Quem é que diz isso?
        Como é que ele sabe?
        O que é que está faltando?
        Alguém mudou de assunto?
        Isso faz sentido?

Quem é que diz isso?
Procure sempre saber quem está divulgando a estatística: pode ser uma empresa no meio de uma negociação de salários, ou um sindicato na mesma situação, ou um laboratório "independente" que precisa mostrar resultados, ou simplesmente um jornal atrás de uma boa matéria.

Uma empresa americana declarou que os salários no segundo semestre de um ano estavam muito acima daqueles pagos no início do ano, portanto não era hora do sindicato pedir um aumento. O que a empresa "esqueceu" de dizer é que no início do ano havia uma grande quantidade de trabalhadores de meio-período, e que estes passaram a cumprir turno integral a partir do segundo trimestre do ano, sendo assim seus salários teriam que forçosamente subir, mas isso não implica que os salários tenham "melhorado realmente".

Procure os viesamentos, deliberados ou inconscientes, aplicados aos resultados. Quando ouvir "pesquisa feita por médicos americanos revela..." tome cuidado: que médicos são estes? Cuidado com as declarações do tipo "Universidade de Harvard descobriu que...". Verifique se realmente há pessoas qualificadas da "instituição de prestígio" em questão divulgando as descobertas.

Presença do Estado no Brasil reflete desequilíbrio regional

Estudo do Ipea revela disparidades importantes entre os estados brasileiros em áreas como educação e saúde

O presidente do Ipea, Marcio Pochmann, lançou nesta terça-feira, 10, em São Paulo, o Comunicado do Ipea nº 129 - Presença do Estado no Brasil. Os dados divulgados são parte integrante do projeto com o mesmo titulo.
Segundo Pochmann, os principais desafios de um país em vias de tornar-se a 4ª economia do planeta são a superação da pobreza extrema e a universalização do acesso aos serviços básicos como educação e saúde. O papel do Ipea nesse contexto é analisar a atuação do Estado brasileiro para superar esses desafios: "o primeiro passo para mudar a realidade é conhecer a realidade".
No caso da assistência social, o estudo revela que a distribuição geográfica da aplicação dos benefícios de assistência social do governo federal vem encarando o problema de frente. No ano de 2011, o Programa Bolsa Família aplicou 51,1% dos benefícios na região Nordeste. Nesse caso o Estado tenta compensar as desigualdades já existentes.
Já no caso da saúde, a distribuição dos serviços espelha as desigualdades regionais, sendo que as regiões Sul e Sudeste apresentam a maior concentração de profissionais de saúde com nível superior: 3,7 profissionais por mil habitantes. A média nacional é de 3,1, sendo que nas regiões Norte e Nordeste esses números são inferiores (1,9 e 2,4 respectivamente).
Os dados referentes à educação mostram que o país vem avançando na direção da universalização do ensino, porém, com discrepâncias regionais importantes. A taxa de frequência liquida no ensino fundamental ainda não é satisfatória, sendo a pior situação no estado do Pará, com 87,2%, em contraste com o Mato Grosso do Sul, com 94,4%. No ensino médio, as disparidades entre os estados são ainda mais acentuadas.
A relação de docentes do nível médio com formação superior também apresentou avanços. Segundo Pochmann, "o Estado avançou muito na área da educação, entretanto, a sociedade do conhecimento estabelece desafios que requerem uma atuação mais decisiva". No caso do ensino superior, as desigualdades regionais são mais acentuadas: "a intervenção pública no setor do ensino superior se dá de maior forma nos estados mais ricos, ao contrário do ensino fundamental. [...] O Estado não está colocando os seus maiores esforços nos estados mais necessitados". Essa atuação acentua as disparidades regionais do Brasil.
Trabalho e emprego
No item trabalho e emprego, o dado relevante do estudo é a relação do número de trabalhadores encaminhados pelo Sistema Nacional de Emprego e daqueles realmente colocados em uma vaga de trabalho. O segundo indicador importante relaciona os colocados com o número de vagas ofertadas pelo Sine. Nos dois indicadores chama a atenção a elevada eficiência do sistema nas regiões Norte e Nordeste.
A cobertura bancária no Brasil apresentou importantes avanços desde a crise de 2008, porém, o estudo revela que somente 51% dos municípios possuem agências de bancos públicos, e a sua densidade ainda reflete as desigualdades econômicas das grandes regiões brasileiras. A região Norte conta com 2,6 agências bancárias por mil habitantes, enquanto a região Sul apresenta uma taxa de 5,3. Segundo Pochmann, nesse caso, "a presença de bancos públicos reforça as desigualdades nacionais".
No quesito segurança pública, os dados apresentados mostram uma presença da Polícia Civil em 82,4% dos municípios brasileiros. Em números absolutos, o estado de Minas Gerais conta com o maior número de municípios com delegaciass (853). O número de delegacias do meio ambiente apresenta distribuição extremamente desigual. Alguns estados sequer contam com uma unidade, como é o caso do Maranhão e do Rio de Janeiro. 
O estudo levanta também a distribuição dos seguintes estabelecimentos culturais no território nacional: bibliotecas públicas, museus, teatros ou salas de espetáculo, centros culturais, cinemas, videolocadoras, estádios ou ginásios poliesportivos, assim como provedores de internet. O Brasil possui 5.187 municípios bibliotecas públicas, sendo que 378 municípios não possuem nenhuma. 23.3% dos municípios possuem no mínimo um museu, 21,1% um teatro ou sala de espetáculo, e somente 9,1% possuem cinema. Destes, 53,1% estão na região Sudeste. 86,7% dos municípios possuem estádio ou ginásio esportivo, 55,6% possuem provedor de internet (31,8% no Sudeste) e 28% possuem livrarias. A distribuição detalhada por estado encontra-se na pagina 22 do comunicado.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

A aliança entre ciência e religião

Autor: André Rabelo
Existem diferenças fundamentais entre ciência e religião, que provavelmente se relacionam com algumas das tensões existentes entre elas. A ciência e a religião possuem um longo histórico de desavenças e atritos, mas houve mudanças nesta relação – muitos líderes religiosos e teólogos reconhecem a legitimidade de conhecimentos científicos antes rejeitados, como a teoria da evolução e os 4,5 bilhões de anos da Terra (Dawkins, 2009; Sagan, 1997).
Apesar de terem ocupado posições antagônicas em muitos momentos (quase se vendo como rivais ou inimigas), ambas possuem um inimigo em comum muito mais poderoso atualmente, que merece mais atenção do que qualquer desavença sobre quando o nosso planeta foi criado ou a eficácia da camisinha – o inimigo é a destruição desenfreada da natureza. Carl Sagan, em seu livro “Bilhões e Bilhões”, fez uma afirmação a este respeito:
Não importa de quem seja a principal responsabilidade pela crise (ambiental), não há saída sem a compreensão dos perigos e seus mecanismos e sem um profundo compromisso com o bem-estar a longo prazo de nossa espécie e de nosso planeta – isto é, em palavras bastante precisas, sem o envolvimento central tanto da ciência como da religião.
Sagan também descreveu neste livro a experiência que teve nas conferências do “Fórum Global dos Líderes Espirituais e Parlamentares”, onde representantes religiosos, cientistas e parlamentares de vários países se juntaram para discutir a crise ambiental. Na conferência de Moscou, em 1990, um grupo de cientistas apresentaram um apelo conjunto aos líderes religiosos no encontro, que responderam ao apelo quase unanimente de forma positiva.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Universindo Díaz luta pela vida em Montevidéu


Universindo Díaz: estágio avançado de mieloma múltiplo

Luiz Cláudio Cunha Exclusivo para Sul21
O historiador e ativista politico uruguaio Universindo Rodríguez Díaz, 60 anos, sequestrado em Porto Alegre pela ‘Operação Condor’ em novembro de 1978, sobreviveu a duas ditaduras e a duras torturas no Brasil e no Uruguai e agora enfrenta sua mais dura luta pela vida.
Na terça-feira, dia 3, Universindo foi internado às pressas num hospital de Montevidéu, onde vive, com fortes dores nas costas. Os exames iniciais revelaram que ele padece de um estágio avançado de mieloma múltiplo, um câncer agressivo e incurável que se desenvolve na medula, gerando um crescimento desordenado dos glóbulos brancos, derrubando o sistema imunológico, submetendo o paciente a dores fortes nos ossos e comprometendo gravemente os rins. Os médicos iniciaram uma diálise de emergência, tentando estabilizar o doente para iniciar a quimio e a radioterapia.
No sábado, o estado de Universindo agravou-se, com complicações respiratórias e neurológicas. O coração fraquejou, diante do aumento de viscosidade sanguínea que afeta todo o sistema circulatório. Ele foi transferido para a UTI, onde respira com a ajuda de aparelhos. O mieloma múltiplo é uma doença traiçoeira, assintomática, que exige um diagnóstico prévio para dar tempo ao tratamento de praxe, que começa com a quimioterapia e os corticoides e termina, em caso extremo, com transplante da medula óssea. Nos casos detectados nos estágios iniciais, a sobrevida chega a cinco anos e não passa de dois anos para os pacientes mais avançados. A aparição fulminante da doença em Universindo não permitiu, ainda, nem a adoção das etapas iniciais da oncologia.
 
É uma doença rara, que ataca apenas cinco em cada 100 mil habitantes. É uma doença de idosos e menos de 10% dos pacientes não alcançaram ainda os 50 anos de vida. O organismo debilitado de Universindo entrou precocemente nesse grupo de risco, entre outras razões, porque traz no corpo as marcas de sua dura luta para sobreviver à violência dos ‘anos de chumbo’ da década de 1970 no sangrento Cone Sul do continente.
Universindo: no corpo, as marcas da luta
Foi sequestrado aos 27 anos em 1978 em Porto Alegre junto com Lílian Celiberti (29 anos) e seus dois filhos, Camilo (8 anos) e Francesca (3). Os sequestradores cumpriam uma missão binacional da clandestina ‘Operação Condor’, com militares uruguaios atuando ilegalmente no Rio Grande do Sul com a cobertura e cumplicidade do DOPS, a polícia política do regime, comandada na capital gaúcha pelo delegado Pedro Seelig, o nome mais importante da repressão no sul do país, conhecido como o “Fleury dos pampas” — referência ao seu amigo Sérgio Fleury, delegado do DOPS paulista, envolvido com o ‘Esquadrão da Morte’ e as torturas aos presos políticos em São Paulo e no Rio de Janeiro.
Detido pessoalmente por Seelig e sua equipe no apartamento da rua Botafogo, no bairro Menino Deus, no início da tarde de domingo, 12 de novembro, Universindo começou a apanhar ali mesmo, na sala. Ligaram a TV portátil com o som bem alto para abafar o som seco das pancadas que ele recebia, sentado em uma cadeira, algemado por trás. Levou muitos socos no estômago e pancadas na cabeça desferidas por um homem forte, negro, de mão pesada. O agressor e a vítima não sabiam, mas tinham pelo menos algo em comum: a paixão pelo Internacional. Universindo havia se tornado torcedor colorado logo que chegou a Porto Alegre, meses antes, e o batedor era o ex-centro-avante do Inter “Didi Pedalada”, agora vestindo a camiseta do time barra-pesada de Seelig, outro ilustre colorado, que frequentava os vestiários do Beira-Rio e se gabava de sua amizade com o craque do time, o meia Paulo Roberto Falcão.
Lílian e Universindo: sequestro em 1978, na Rua Botafogo

As afinidades clubísticas não aliviaram as penas de Universindo. Levado encapuzado para a sede do DOPS, no segundo andar do ‘Palácio da Polícia’, sede da Secretaria da Segurança na avenida Ipiranga, o uruguaio cruzou os portões do inferno. Sem o capuz, ainda com algemas, foi golpeado por vários homens, sob o comando de Seelig. Um dos que mais batia era um compatriota, o capitão do Exército uruguaio Glauco Yannone, que dois anos antes, ainda primeiro-tenente, frequentou o curso de inteligência e tortura da notória Escola das Américas — o centro militar americano no Canal do Panamá por onde, em três décadas, passou um exército de 60 mil oficiais dos Exércitos latino-americanos que ali aprenderam as técnicas de insurreição que os levaram ao poder, pela força e pelo terror de Estado, derrubando sucessivamente os governos civis e democráticos do continente nos febris anos 60 e 70 do século passado. Desse contingente, 8.659 eram militares brasileiros e 2.806, uruguaios.
Universindo foi mais uma das cobaias que experimentaram este sinistro know-how da violência da ditadura. Tiraram suas algemas no DOPS e ataram as mãos aos tornozelos. Passaram uma barra de ferro entre os punhos amarrados e a dobra do joelho e o penduraram, a 50 cm do chão. De cabeça para baixo, Universindo parecia um frango assado, provando no corpo o suplício de uma genuína invenção brasileira: o pau-de-arara, uma prática disseminada daqui para todos os centros de tortura da região. A simples posição invertida provoca a dormência que se infiltra pelas artérias e veias dos pés e mãos, carentes do sangue que se acumula na cabeça rente ao chão. A dor, lembra Universindo ainda hoje, é insuportável, indecifrável, intangível.
As bestas que comandavam a sessão de pancada acoplaram eletrodos no braço, no pulso, na perna, na orelha, no dedo. Era uma dezena de conexões diretas com a dor, amplificada pelo balde de água que jogavam sobre a vítima para potencializar o choque elétrico. Assim, pendurado e golpeado, Universindo ficou do meio da tarde até quase meia-noite daquele domingo. Banhado em sangue, na madrugada, ele conseguiu ir ao banheiro, onde urinou sangue. Era o sinal vermelho do efeito das descargas elétricas e do pau-de-arara, que faz o organismo liberar mioglobina, uma proteína muscular que leva oxigênio à circulação. Um mecanismo de defesa que sobrecarrega os rins, detonando uma insuficiência renal aguda. Na literatura médica, isso é conhecido como rabdomiólise, o nome científico de uma síndrome causada por danos na musculatura do esqueleto provocados pelo vazamento da mioglobina no sangue.
Um guerreiro de fala mansa e sorriso largo
 
Quando escapou ainda vivo da sala de torturas do DOPS brasileiro, Universindo ainda precisou passar pelo inferno das prisões militares no Uruguai. Foi torturado no forte de Santa Teresa, Chuy, num quartel do outro lado da fronteira, no extremo sul brasileiro, e depois na sede da Compañia de Contra-Informaciones, o DOI-CODI uruguaio, na rua Colorado, em Montevidéu. O som do rádio foi aumentado, prenúncio de novos sofrimentos na oficina mecânica do lugar, improvisada como centro de tortura. Dias depois, Universindo e Lílian Celiberti deixaram aquele antro para ingressar, literalmente no El Infierno, a temida sede do 13º Batalhão de Infantaria, na esquina da avenida de Las Instrucciones com a bulevar Battle y Ordóñez, aonde o casal foi jogado na noite de 6 de dezembro — exatos 24 dias após o sequestro de Universindo e Lílian naquele maldito domingo de Porto Alegre.
As torturas no El Infierno duraram até o início de junho de 1979. Durante boa parte do tempo, Universindo, entre uma sessão e outra de pancadas, foi mantido sempre acorrentado, em posição fetal, o que lhe provocou sequelas permanentes nos joelhos. Ainda hoje ele manca, quando caminha até o seu trabalho na Biblioteca Nacional, onde o ex-estudante do curso de Medicina (abortado pela ditadura uruguaia que o levou ao exílio em 1975) cumpre com prazer o seu ofício de historiador e chefe do Departamento de Investigação Histórica.
Numa sala de tortura da ditadura, a rabdomiólise vem acompanhada de convulsões, edemas, espasmos, calafrios, cãibras, febre, insuficiência renal e respiratória. Numa sala de UTI de um hospital da democracia, agora, estes são os sintomas que, coincidência ou não, exaurem as forças de Universindo. O câncer na medula fragiliza sua defesa e torna mais difícil o combate à doença.
 Luiz Cláudio Cunha é jornalista e testemunha do sequestro de Universindo e Lilian em
Porto Alegre em 1978, junto com o fotógrafo JB Scalco | Foto: Ricardo Chaves

Três décadas depois do inferno que viveu, como tantos em tantos lugares ocultos e clandestinos do Cone Sul, Universindo paga hoje na carne o tributo do sofrimento que as ditaduras impõem a todos nós. Mas o sorriso largo, a fala mansa e a serenidade do tempo provam que nada consegue abater o espírito e a integridade de gente guerreira como Universindo Rodríguez Días.
Saúde e força, compañero!

Presidente do BC da Suíça renuncia ao cargo

Philipp Hildebrand e sua esposa são acusados de realizar operações de câmbio suspeitas
Danielle Chaves, da Agência Estado
ZURIQUE - O presidente do Banco Nacional da Suíça, Philipp Hildebrand, renunciou ao cargo em meio aos questionamentos sobre operações com câmbio estrangeiro que ele e a esposa fizeram no ano passado. "Com efeito imediato, Philipp Hildebrand está renunciando ao cargo de presidente do conselho diretor do Banco Nacional da Suíça", informou o SNB, que é o banco central do país.
Hildebrand, que enfrentará hoje mais perguntas de uma comissão política sobre suas operações com câmbio, fará um pronunciamento sobre a decisão. A autoridade esteve sob ataque durante semanas depois que informações confidenciais do banco vazaram para o governo e a imprensa suíça mostrou que ele e sua esposa fizeram operações no momento em que o SNB combatia a valorização do franco.

domingo, 8 de janeiro de 2012

Os fantásticos Chico Buarque e Olivia Byngton: "Eu e Você"

Gatos: dos antepassados longínquos aos vídeos fofos no Youtube

publicado em recortes por petit gabi
 
Parte da nossa curiosidade sobre os gatos está em tentar descobrir o que querem dizer quando miam, o que os faz se enrolarem em nossas pernas quando querem algo ou simplesmente o motivo de arranharem com tanta determinação nosso sofá novo. Como surgiram? De onde evoluíram? E por que hoje são considerados dos melhores amigos dos homens? Desenrole o grande novelo de lã que é a história dos bichinhos mais queridos para se ter como animais de estimação.
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Gato brincando (domínio público)
Animal da família dos felídeos, o Felis cattus silvestris, também conhecido como gato doméstico, evoluiu a partir do que atualmente é seu mais antigo ancestral direto conhecido, o Proailurus lemanensis, que viveu há cerca de 30-20 milhões de anos atrás (ou entre os períodos Oligoceno e Mioceno) e geralmente é considerado o primeiro "verdadeiro gato". Dele surgiu o Pseudaelurus, ancestral de todos os gatos modernos.. Estima-se que o gato tenha deixado a vida selvagem (para acabar povoando vídeos fofinhos no Youtube) entre os anos 10.000 e 9.500 a.C.
Com o cruzamento de diversas espécies, ao longo dos anos, os gatos foram se tornando menores e menos agressivos. Os humanos, por sua vez, deixaram de lado a vida de nômades e passaram a estabelecer morada em lugares fixos, trabalhando na agricultura. Diz-se que a primeira parceria entre humanos e gatos surgiu com a necessidade de exterminar os roedores que atacavam os estoques de alimentos. Um negócio bem Tom e Jerry. De qualquer maneira, conta-se que os vestígios mais antigos da domesticação dos gatos foram encontrados na ilha de Chipre. Por lá, foram descobertas sepulturas com restos mortais de gatos e humanos, juntos.
Até aqui a vida dos gatos não era lá essas coisas. Eram apenas caçadores que quebravam um galho para os humanos. Mas no Egito o negócio realmente começou a ficar bom. Com a associação de divindades como a deusa Bastet - deusa egípcia da felicidade, fertilidade, do sol e da lua - aos gatos, estes passaram a ser considerados sagrados. Se tornaram os guardiões da noite, dos mortos e dos mistérios da vida e da morte. Isso acontecia porque alguns deuses eram apresentados com corpo humano e cabeça de gato. Parece que por lá eles podiam perambular pela cidade e se aproximar de quem quer que fosse, sem serem incomodados. E se uma casa pegasse fogo, eles eram os primeiros a serem resgatados. Uma beleza!
Apesar das restrições impostas - nenhum gato deveria sair do Egito - alguma pessoa muito legal provavelmente burlou as regras e levou uns bichanos para passear em outros territórios. Para os romanos, o gato era o maior símbolo de liberdade. Na Grécia, era associado à deusa Afrodite. Em Babilônia, criou-se a lenda de que os gatos haviam surgido do espirro de um leão. Na China, estátuas de gatos eram usadas para espantar maus espíritos. No Japão, o gato morto era enterrado no templo de seu dono para garantir a ele boa sorte e tranquilidade durante toda a vida.
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Estátua de gato, no Museu Egípcio Britânico
Por muito tempo, os gatos conseguiram manter a boa fama de espírito protetor e amigo dos humanos e continuaram levando a vida numa boa até a chegada da Idade Média. Ao longo desta era cristã, os bichanos foram associados a bruxarias e houve um verdadeiro processo de demonização. Pobres gatos pretos, que sofrem até hoje com as supertições advindas desse período macabro da história. De qualquer maneira, com o fim da Idade Média e da visão preconceituosa e supersticisiosa, os gatos passaram a ocupar novamente o espaço de animal doméstico por sua sociabilidade, independência e capacidade de manter os roedores a distância.

Hoje em dia os gatos não são divindades, nem demônios, mas continuam despertando nossa curiosidade. O comportamento independente, a agilidade e os trejeitos totalmente característicos tornam os gatos verdadeiras obras de arte que ganham vida sob nossos olhos. O que explica inclusive porque se tornaram os animais domésticos mais populares do mundo, atualmente. Observar suas atitudes e reações é, sob diversos aspectos, um adorável espetáculo. E o melhor de tudo é que nunca dá para saber o que está por vir, pois são seres completamente imprevisíveis. Mesmo assim, é impossível não tentar decifrar esse bicho enigmático, cheio de personalidade e que faz das pessoas seus verdadeiros bichinhos de estimação e não o contrário, como muitos pensam.
Olhos_de_um_gato-marksebastian_ccsa20.jpgDepois de toda essa evolução biológica e histórica, os gatos não estão apenas na casa das pessoas: estão em todo lugar. De desenhos animados a filmes, de letras de músicas a pinturas, de livros a milhões de vídeos fofos, que despontam novas estrelas todos os dias no Youtube. Não conhece o Maru, o gatinho que mora no Japão e adora caixas de papelão? Pois deveria!
Algumas sugestões:
Assista
Felix, the cat (série animada - 1920)
The Aristocats (filme - 1970)
Tom e Jerry (desenho animado)
Leia
Felidae (Akif Pirincci)
O gato de botas (Charles Perrault)
Dewey – Um gato entre livros (Vicy Miron).
Ouça
História de uma gata (Chico Buarque).
Franz Marc - 1912.jpg
Gato, por Franz Marc

Poster advertising  the approaching tour of the shadow puppets theatre Le Chat Noir (the black cat) of Rodolphe Salis. 1896.jpg
Poster de promoção do teatro de marionetas "Le chat noir", de Rodolphe Salis, 1896
White_cat_by_Boston_Public_Library 1895.jpg
Gato branco, 1895 (Biblioteca Pública de Boston)

The cat of Tsar Alexis of Russia 1661.jpg
O gato do czar Alexis da Rússia, 1661

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