sábado, 21 de dezembro de 2013

Volatilidade marcou a economia brasileira em 2013, diz IPEA


É o que aponta a Carta de Conjuntura nº 21, lançada pelo Ipea no Rio de Janeiro, nesta quinta-feira

A volatilidade foi uma das principais características da economia brasileira em 2013. Essa é uma das conclusões daCarta de Conjuntura nº 21, lançada nesta quinta-feira (19/12), em uma coletiva de imprensa no Ipea, no Rio de Janeiro. “A indústria e até mesmo o varejo apresentaram oscilações muito fortes. Acima do normal. Por isso, todas as taxas e informações devem ser analisadas com cautela”, apontou Fernando Ribeiro, Coordenador de Conjuntura do Instituto.

A Carta destaca ainda que os números mais recentes da economia brasileira vêm corroborando o cenário traçado nas últimas análises do Ipea, segundo o qual o crescimento reduziria seu fôlego no segundo semestre de 2013, por conta da desaceleração dos investimentos e da manutenção de um aumento apenas moderado no consumo das famílias. De acordo com o documento, o recuo do PIB, que apresentou no terceiro trimestre desse ano uma queda de 0,5%, já era esperado, uma vez que o segundo trimestre marcara uma taxa inesperada de 1,8%.

A taxa de desemprego permaneceu no nível mais baixo na história. Para Fernando Ribeiro, os patamares atuais são explicados pela desaceleração do crescimento da População Economicamente Ativa (PEA).
No que tange o comércio exterior, vislumbra-se um mercado mais equilibrado para o próximo ano. A estabilização da China, a saída da Europa do período de recessão e a força do setor privado norte-americano indicam que a situação da economia mundial tende a melhorar, ainda que na América Latina existam países com dificuldades, como a Argentina. “Para o Brasil, foi um ano ruim nas exportações, mas a tendência é positiva e já há indicações de melhora à frente”, afirmou.

Carta de Conjuntura
A publicação trimestral tem como objetivo analisar a evolução da conjuntura econômica brasileira por meio de seus principais indicadores: atividade econômica, mercado de trabalho, inflação, setor externo, moeda e crédito, finanças públicas e economia mundial.

Miriam Leitão: "Dólar sobre, IGPM também"... Só que não

Ficou tão ridículo, que a Leitão saiu da frente do gráfico e começou a andar pelo estúdio.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Suprema Corte do Canadá derruba leis antiprostituição

Terri-Jean Bedford em corte canadense (foto: Reuters)


De: BBC

Justiça quer que Parlamento do Canadá reformule leis contra a prostituição
A Suprema Corte do Canadá derrubou de forma unânime leis nacionais que proibiam a prostituição.Os magistrados canadenses entenderam que as legislações que proíbem bordéis, que impedem que profissionais do sexo se comuniquem em público com potenciais clientes e consideram fora da lei quem sobrevive da prostituição devem ser banidas.Na prática, o governo canadense terá agora um ano para criar uma nova legislação sobre o assunto.A decisão é resultado de um processo movido por prostitutas.Todos os nove juízes que compõe a entenderam que as leis atuais são "totalmente desproporcionais"."Não é um crime no Canadá ser pago em troca de sexo", escreveu a magistrada Bever Mclachlin na decisão publicada nesta sexta-feira."O Parlamento tem o direito de criar regulações e evitar perturbações à sociedade, mas não se isso custar a saúde, a segurança ou a vida das prostitutas", afirmou a juíza.De acordo com ela, a lei atual não impõe apenas condições para o trabalho dos profissionais do sexo. "Ela vai um passo além ao impor condições perigosas para a prostituição; ela impede que pessoas envolvidas com uma atividade arriscada – porém legal – tomem medidas para diminuir seus riscos".Se os parlamentares do país não aprovarem novas versões das leis em doze meses, elas serão automaticamente derrubadas – mas até lá devem continuar em vigor.O ministro da Justiça canadense, Peter MacKay, disse que o governo irá refletir sobre "esse problema tão complexo"."Estamos revendo a decisão e explorando todas as opções possíveis para tratar dos danos significativos que decorrerem da prosttuição e prejudicam comunidades, os envolvidos na atividade e as pessoas vulneráveis".Um grupo canadense que diz lutar pelo direito das mulhres condenou a decisão."Agora nós confirmamos que não tem problema comprar e vender mulheres e meninas nesse país", afirmou Kim Pate, diretoda da Associação Canadense de Sociedades Elizabeth Fry, à TV estatal canadense.Um processo movido por três mulheres com experiência no comércio do sexo, Terri-Jean Bedford, Amy Lebovitch e Valerie Scott, deu início à discussão.Os governos federal e de Ontario apelaram contra dois aspectos da decisão. Eles pedem que a proibição de bordéis não seja derrubada e propuseram a manutenção de alguns aspectos da legislação que impede pessoas de viverem da prostiuição.Advogados do governo de Ottawa teriam argumentado que são os próprios profissionais do sexo que se colocam em risco ao adotar a atividade e não as condições impostas pela lei.Mas a Suprema Corte decidiu que muitos profissionais da área não têm outras opções. O órgão afirmou que alguns dos fatores que levam à prostituição são desespero, vício em drogas, doenças mentais e pressão de cafetões. "Muitas vezes eles (profissionais do sexo) têm poucas opções além de vender seus corpos", afirmou McLachlin em seu voto.Pressão dos cafetões

17 anos da morte de Carl Sagan

 Aproveito  texto dos 15 anos da morte de Carl Sagan, pois não vejo nada a acrescentar nestes

15 anos da morte de Carl Sagan

Fonte: Bule Voador Autor: André Rabelo
Hoje completam-se 15 anos desde que Carl Sagan faleceu, no dia 20 de dezembro de 1996. O mais estranho da data de hoje é que Carl Sagan não parece estar morto – sua influência ainda é grande ao redor deste pálido ponto azul que habitamos. As pessoas ainda o enaltecem, leem e recomendam de maneira entusiasmada os seus livros, como se fossem lançamentos recentes. Ele inspirou a vida de muitos homens e mulheres que nunca o conheceram pessoalmente.
Carl Sagan foi, sem dúvida, um grande cientista com uma brilhante carreira acadêmica. Mas ele foi mais além do que muitos dos seus colegas acadêmicos contemporâneos. Ele foi um cientista com uma incrível sensibilidade para questões sociais, éticas e políticas que raras vezes pôde ser observada em outros cientistas. Foi, sem dúvida, um dos maiores defensores, entusiastas e comunicadores da ciência moderna. Sua preocupação em quebrar as “muralhas” que impedem o compartilhamento do conhecimento científico encantou a vida de muitas pessoas que tiveram seus corações despertados para a busca cuidadosa do conhecimento. Ann Druyan, sua esposa em vida, descreveu esta postura de Sagan na introdução do livro Variedades da experiência científica: Uma visão pessoal da busca por Deus:
“Quando topava com uma muralha – a muralha do jargão que mistifica a ciência e isola seus tesouros do restante de nós, por exemplo, ou a muralha que cerca nossa alma e nos impede de abraçar de verdade as revelações da ciência -,  quando topava com uma dessas velhas e infindáveis muralhas, ele usava, como um Josué moderno, todas as suas muitas variedades de força para derrubá-la.”

Uma postura admirável de Sagan que vale a pena destacar na data de hoje foi a sua imensa preocupação não só com a razão e a ciência, mas com a humanidade, o convívio entre as pessoas e o futuro da nossa espécie. Em muitos dos seus livros, Sagan buscou alertar enfaticamente sobre o risco que significava o aquecimento global e a destruição da natureza. Foi um implacável crítico do desenvolvimento das bombas nucleares e do programa Guerra nas Estrelas, defendendo a importância da discussão ética acerca do desenvolvimento científico e tecnológico. Também criticou sinceramente a intolerância religiosa, a pseudociência, a política, a educação e os deslizes éticos de cientistas.
Sua paixão pela interrogação cética do universo como uma maneira humilde e ousada de compreendê-lo fica evidente ao longo da sua vasta obra literária e sua famosa série televisiva Cosmos. Em outro trecho da introdução referida anteriormente, Ann Druyan ilustra a visão de  Sagan sobre a importância da ciência:
“A convicção permanentemente revolucionária da ciência, de que a busca pela verdade não tem fim, era para ele a única abordagem humilde o suficiente para fazer jus ao universo que revelava. A metodologia da ciência, com seu mecanismo de correção de erros para nos manter honestos, apesar da tendência crônica para projetar, para nos equivocar, para iludir a nós e aos outros, era para ele o auge da disciplina espiritual”
Como descrevi em texto anterior, Sagan demonstrou em episódios marcantes a humildade e diplomacia que conquistou tantos admiradores e aliados ao redor do mundo. Diante daquela que ele considerava uma das maiores ameaças para o futuro da humanidade, a crise ambiental, Sagan reconheceu prontamente nas religiões uma parceria necessária. A despeito de qualquer reserva que tivesse, ele soube humildemente liderar um pedido de cooperação com as principais instituições religiosas da época, tendo o apoio quase unânime das mesmas na busca pela preservação ambiental. Eu penso que é deste tipo de postura humanista, agregadora e comunitária, voltada para causas que unam as pessoas, que o mundo necessita cada vez mais – não só de outros cientistas, mas de políticos, religiosos e autoridades.

terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Cheiro de rua no Fórum de Direitos Humanos

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ANDRESSA PELLANDA

Num evento com 9 mil participantes em Brasília, debates teóricos alternam-se com reivindicações concretas por uma democracia real
Por Andressa Pellanda
Norberto Bobbio, em seu Dicionário de Política, explica que os direitos humanos podem ser classificados em direitos civis, políticos e sociais. “Os primeiros são aqueles que dizem respeito à personalidade do indivíduo (liberdade pessoal, de pensamento, religião, de reunião e liberdade econômica), através da qual é garantida a ele uma esfera de arbítrio e de liceidade, desde que seu comportamento não viole o direito dos outros. Os direitos civis obrigam o Estado a uma atitude de impedimento, a uma abstenção. Os direitos políticos (liberdade de associação nos partidos, direitos eleitorais) estão ligados à formação do Estado democrático representativo e implicam uma liberdade ativa, uma participação dos cidadãos na determinação dos objetivos políticos do Estado. Os direitos sociais (direito ao trabalho, à assistência, ao estudo, à tutela da saúde, liberdade da miséria e do medo), maturados pelas novas exigências da sociedade industrial, implicam, por seu lado, um comportamento ativo por parte do Estado ao garantir aos cidadãos uma situação de certeza”.
A luta pelos direitos humanos remonta há muitos séculos atrás. Grandes declarações de direitos humanos foram o cume de grandes revoluções – como a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, após a Revolução Francesa, em 1789 – ou de grandes guerras – como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, logo no final da Segunda Guerra Mundial, em 1948. O fruto das primeiras, para fazerem valer o direito reivindicado; o das segundas, para impedir que sejam novamente cometidas atrocidades e violações desses direitos.
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Fórum Mundial de Direitos Humanos, que se encerrou na última sexta, em Brasília, mostrou que vivemos, hoje, ambas as situações. O mundo respira ainda, 61 anos depois da Declaração dos Direitos Humanos, guerras, estados de exceção, graves violações. Ao mesmo tempo, na era da comunicação, da internet e, principalmente, das redes, os povos olham para os sistemas políticos e percebem a necessidade iminente de mudança, de maior participação. E o Brasil não foge à lógica.
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A questão indígena no país é um dos casos de grave violações de direitos sociais e civis, que não tem recebido o devido olhar do governo brasileiro. No segundo dia de evento, durante a conferência que tratava dos direitos humanos como bandeira de luta dos povos, com a presença da ministra dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, um grupo de indígenas da etnia Tuxa, da Bahia, juntamente com outros índios, da Aldeia Maracanã, fizeram um protesto, carregando cartazes até o palco principal. Neles, podíamos ver escritos: “Não à PEC 215” (PEC que transfere para o Congresso a prerrogativa de demarcar as terras indígenas e facilita a revisão das terras já demarcadas, em tramitação no Congresso Nacional); “500 anos de genocídio”; “A Aldeia Maracanã resiste”; entre outros.
Um dos indígenas do grupo levantava energicamente os braços, enquanto gritava pelo seu povo: “é genocídio! Meu povo está morrendo! Tem gente morrendo todos os dias! Todos os dias! Morrendo!”. A palavra “morrendo” ecoava nos ouvidos de cada presente naquele auditório cheio. A plateia se levantou, um silêncio atingiu o ambiente e, além dos clamores do índio, só se ouviam os sons dos cliques das dezenas de câmeras profissionais apontadas para eles. Seguranças da organização do evento foram fortemente vaiados quando se aproximaram para retira-los do palco.
No dia seguinte, em outra sala, estavam todos esperando para começar uma atividade intitulada “o papel da Polícia Militar na defesa dos direitos humanos”, proposta pelo Comando Geral da PM do Distrito Federal. Começou com o hino nacional e, em seguida, praticamente não houve atividade. O que se ouvia no lugar eram palavras de ordem, com força, “não a-ca-bou, vai acabar, eu quero o fim da polícia militar!”. Era quase impossível entrar na sala, lotada. Ao passar no corredor, muitos estavam exaltados. “Como eles acham que defendem os direitos humanos?! A polícia mata todo dia! Todo dia!”. O burburinho da atividade se estendeu pelos espaços do Fórum chegando a, minutos depois, levantar uma manifestação pelos corredores pela desmilitarização da polícia militar: “Acabou a alegria, a polícia mata pobre todo dia!”, gritavam. A semelhança com os clamores indígenas talvez não seja mera coincidência. Ambos os protestos mostram não só que queremos ter nossos direitos mais básicos garantidos, mas que queremos ser ouvidos.
Ministra Maria do Rosário, no encerramento: "não há caminho sem diálogo"
Ministra Maria do Rosário, no encerramento: “não há caminho sem diálogo”
De fato, foi possível perceber a luta forte pelos direitos sociais e civis no Fórum Mundial. Como já abordado, indígenas clamavam pelos direitos cultural e religioso, mas também pelo direito à vida. Muitas outras atividades também entram nesse escopo, como debates pró direito de grupos LGBTT, da mulher, pela educação, saúde etc. Ao mesmo tempo, porém, em todos os dias de Fórum, inúmeras atividades se propuseram a tratar dos direitos políticos e, nesse caso, a palavra “participação” foi a bola da vez. Em entrevista coletiva pouco antes da cerimônia de encerramento do Fórum, inclusive, a ministra Maria do Rosário, afirmou que o evento “marca um caminho que é irrenunciável para a democracia, que é o caminho do diálogo”.
“O direito à participação não se efetiva somente com a oferta de participação, se faz necessário o reconhecimento social do grupo que almeja participação”, defendeu Bruno Vanhoni, Secretário Nacional da Juventude, em uma atividade do Unicef sobre participação cidadã de adolescentes e jovens. A reflexão aqui presente, mas também em diversas outras atividades sobre o tema, foi a de que a participação é um direito político e a cidadania é o fruto, o conteúdo desse direito. Foram uníssonas as mais diversas vozes na defesa de novos canais capazes de captar essas tão reclamadas novas formas de participação.
O Fórum Mundial de Direitos Humanos, assim, foi mais um símbolo dos mecanismos formais de reconhecimento dos direitos humanos dos povos pelo globo. Ele foi marcado também pela presença, cada vez mais contundente e vigorosa, do clamor pela efetivação desses direitos nas mais variadas esferas sociais, civis e políticas. O Fórum, que reuniu cerca de 9 mil pessoas de diversas partes do mundo, mostrou que o mundo ainda tem fome, ainda tem sede, e ainda tem medo. Não só de alimento, mas de igualdade; não só de água, mas de direitos; não só da morte, mas da opressão. O índio pede voz. O pobre pede escolha. E a sociedade pede participação.

Em 2006, o colorado derrotava o Barça. Que outro time tem essa glória?

Não adianta. Por mais m... que os caras façam, eu sou colorado!

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Trabalho sexual, dignidade e preconceitos


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Nos últimos anos, prostituição foi equiparada a tráfico humano e ofício indesejável. Este erro brutal atinge, infelizmente, as feministas ortodoxas
Por Marília Moschkovich | Imagem: Pan Yuliang
I. Porto Alegre, janeiro de 2002
Fórum Social Mundial. Eu devia ter uns quinze anos. Na vasta programação, uma oficina me chamou a atenção: um debate organizado pela “Liga Brasileira de Prostitutas” (se não me falha a memória, o nome era esse na época). Era novidade pra mim que as prostitutas se organizassem – eu que, menina de classe média, jamais havia conhecido prostituta alguma, claro. Quem seriam aqueles seres praticamente de outro mundo? Achando inconcebível a ideia de alguém se prostituir por escolha, resolvi ir à atividade para conhecer “de perto” as mazelas das pobres, coitadas e exploradas mulheres que eu escutava que eram tão oprimidas.
Foi um tapa na cara.
Escutando o que as debatedoras tinham a dizer, ficou claro para mim que o estereótipo que eu tinha dessas mulheres era uma grande bobagem, e uma bobagem extremamente estigmatizante. Em primeiro lugar, porque ele não dava conta da diversidade de contextos e situações vividos por elas. Quer dizer, ali na minha frente, microfone em punho, havia três debatedoras. A primeira era uma travesti, formada em Direito, advogada, com os documentos regularizados, mas que não conseguia trabalho na área. Por isso, mantinha a prostituição como principal fonte de renda. A segunda era uma mulher cisgênera, que havia trabalhado como empregada doméstica, preferindo mais tarde a prostituição. A terceira era também travesti, que desde sempre havia escolhido a prostituição como trabalho.
Estavam presentes ali características diversas que desconstruíam o mito perverso que confunde prostituição com tráfico de pessoas. Nenhuma delas havia sido traficada, e nenhuma delas tinha a prostituição como única escolha profissional. Ao longo da discussão, contaram suas histórias, mostrando que, em dado momento na vida, definiram que o ritmo de trabalho e a renda obtidas com a prostituição eram melhores do que dezenas de outras possibilidades – atendente de loja, caixa de supermercado, diarista, doméstica mensalista, garçonete e atendente de telemarketing eram algumas das profissões que contavam ter descartado. Foi ali que me caiu a ficha: desconsiderando que o trabalho das prostitutas é um serviço quase sempre (mas nem sempre) sexual, o que o diferenciava então de subempregos bem aceitos socialmente?
Corta. (e guardem a pergunta)
II. Paris, janeiro de 2010
O mandato do conservador Nicolas Sarkozy chegava a sua metade. Dentre as medidas retrógradas adotadas, o movimento feminista francês (em parte) esbravejava quando desembarquei no aeroporto Charles de Gaulle em férias, preparando-me para ingressar no mestrado. Havia poucos dias ou semanas as prostitutas haviam sido proibidas de trabalhar em público, procurando clientes nas ruas. A medida fez com que muitas trabalhadoras autônomas passassem a se submeter a regras de outrem (proprietários de casas, donos de apartamentos e motéis/hotéis, etc), tampouco regulamentadas no país.
Naquele mês, uma de minhas atividades favoritas era ir ao cinema. Passei em frente a uma portinha na boca da praça Saint Michel, e um cartaz anunciava em letras enormes o documentário “Travailleuses du sexe et fières de l’être” (algo como “Trabalhadoras do sexo, com orgulho”). Haveria um debate, após a exibição do documentário, com o documentarista e uma antropóloga. “Cadê as putas?”, pensei logo, “Elas não têm nada a dizer no debate?” – mas supus que estariam bem representadas no filme.
O filme… Ah, o filme.
Tentei encontrá-lo com legendas e não consegui. Para quem quiser arriscar o francês, fazer legendagem ou tentar legendas automáticas no youtube, o documentário completo pode ser acessado aqui. O filme faz um panorama da situação dos direitos trabalhistas de prostitutas e outras trabalhadoras e trabalhadores do sexo (alô, minha gente, o mercado do sexo é bem amplo, viu?) em diferentes países da Europa. Por meio das entrevistas, mostra o quanto a garantia de direitos básicos afeta a vida dessas mulheres. No debate em seguida, lá estavam elas, como eu, na plateia: desafiando o documentarista e a antropóloga que defendiam (!) a lei assinada por Sarkozy. Com feministas de diferentes grupos, deixavam claro que queriam que essa fosse uma escolha profissional como outra qualquer.
Algum tempo mais tarde assisti também o incrível 69 – Praça da Luz (veja aqui), documentário de Carolina Markowicz e Joana Galvão, sobre a vida de prostitutas que trabalham no centro de São Paulo. Quem assistir por último é a mulher do padre!
Corta de novo.
III. Quase-janeiro de 2014
O debate volta à tona. O PL 4211/2012 (clique para ler na íntegra), chamado de Lei Gabriela Leite, é defendido pelo deputado federal Jean Willys, por alguns grupos feministas e por prostitutas politicamente organizadas no Brasil. Ao mesmo tempo, é atacado por ativistas feministas mais ortodoxas e suas organizações (como a Marcha Mundial das Mulheres, ou a organização de mulheres da CUT). Embora esteja na crista da onda, o debate sobre essa lei específica começou tão logo ela surgiu. Em pouco mais de um ano já vimos militantes feministas atacando a proposta, outras divergindo da posição oficial do grupo ao qual pertenciam e defendendo o projeto, e eu dei meu pitaco aqui.
Para animar o debate corrente (que se acirra com a proximidade da Copa do Mundo, evento que além de movimentar bilhões no mercado do esporte também aquece o mercado do sexo), na semana passada o governo francês aprovou uma lei criminalizando os clientes de prostitutas. O presidente já não é Nicolas Sarkozy, ultra-conservador, mas um representante do Partido Socialista! A medida, porém, bem poderia ter sido assinada por Sarkô, dado o teor da proposta. Em vez de criminalizar a prostituição, o Estado criminaliza sua clientela, tornando a prostituição oficialmente parte de um “mercado negro”. A divisão em terras francesas está parecida com a nossa: de um lado setores ortodoxos da esquerda e do movimento feminista ignorando os movimentos organizados dessa parte da classe trabalhadora, e de outro as trabalhadoras do sexo organizadas politicamente e setores menos ortodoxos do feminismo e da esquerda.
Mas afinal de contas, como lidar com a questão da prostituição dentro do feminismo?
IV. Três questões fundamentais
Para começar esse debate – que já mencionei e retomarei aqui em breve – é preciso atenção a três pontos fundamentalíssimos. Não são os únicos três pontos importantes da discussão, e prometo abordar outros mais adiante (inclusive alguns ligados mais diretamente aos argumentos das feministas radicais e ortodoxas sobre o assunto, que estão sendo propositalmente deixados de lado aqui, por merecerem uma análise mais fina).
1. É preciso distinguir: prostituição não é tráfico de pessoas.
Parece uma coisa boba, mas não é. A prostituição é uma das atividades econômicas associadas ao tráfico de pessoas, em especial de mulheres, nos dias de hoje. No entanto, é preciso compreender que, sendo muito mais antiga do que o tráfico de pessoas, não é a prostituição que o causa. É o capitalismo. O capitalismo causa trabalho análogo ao escravo e tráfico de pessoas em dezenas de indústrias e mercados (o que dizer daquela sua roupinha linda comprada na Marisa ou na Zara?), e não apenas no mercado do sexo. Fazer uma associação direta e necessária entre prostituição e tráfico de pessoas é uma ilusão – ilusão essa que, inclusive, apaga a realidade do tráfico de pessoas em diversas outras atividades social e moralmente “mais aceitas”.
Durante o século XX, foi criado o mito do “tráfico de mulheres”. ”Mito”, aqui, não quer dizer que ele não exista — mas que os fatos são costumeiramente distorcidos, para reforçar a ideia de que as mulheres, se não fossem forçadas, jamais aceitariam ser prostitutas. Para quem duvida ou quer se informar melhor, dois bons artigos sobre isso estão aqui e aqui. Pra quem tiver tempo, recomendo ainda o ensaio de Emma Goldman sobre o assunto , assim como sua apresentação escrita pela Profª Margareth Rago , e o ensaio-comentário da antropóloga Gayle Rubin (“The trouble with trafficking”) [livro completo, em inglês] .
2. Todo cuidado é pouco com a arrogância militante e atitudes “colonizadoras”
Uma das atitudes mais estratégicas dos grupos conservadores que associam prostituição a tráfico de pessoas é, precisamente, não escutar a classe oprimida em questão. Quer dizer: quem sabe o que é melhor para as trabalhadoras do sexo? Elas mesmas, ou as militantes, padres e pastores iluminados moral e politicamente? Falei uma vez sobre “síndrome da militância arrogante“, que é mais ou menos isso. Consideramos as ideologias como verdades absolutas e nos esquecemos de ouvir quem importa. Afinal de contas, será que acharíamos aceitável que apenas homens definissem a legislação sobre o corpo das mulheres (como o aborto)? Acharíamos aceitável que apenas brancos discutissem e fechassem leis sobre cotas raciais, ignorando a existência do movimento negro? Então por que parece tranquilo, para tanta gente, que não-prostitutas definam os direitos trabalhistas das prostitutas, ignorando completamente seu movimento politicamente organizado e suas reivindicações?
No feminismo intersecional, chamamos essas atitudes de “colonizatórias” ou “colonizadoras”. Quer dizer: pessoas em situação de privilégio utilizam esse privilégio para destituírem o “outro”, desprivilegiado de agência. Agência é a capacidade – o poder – de agir, tomar decisões por si próprio, considerar os fatores e consequências envolvidos em seus próprios atos.
3. Em nossa sociedade, todo moralismo é machista.
Se considerarmos que a prostituição e o tráfico de pessoas são duas coisas distintas, fica realmente difícil entender por que a prostituição deveria ser proibida e fabricar e usar roupas, não (já que na realidade há associação entre tráfico de pessoas – especialmente mulheres – e confecções, em grandes cidades brasileiras). Eliane Brum escreveu lindamente sobre isso aqui e eu reforço a mesma posição: por que achamos que uma mulher adulta, consciente, dotada de agência, não pode escolher viver prestando serviços sexuais? Não vou nem entrar no mérito de questionar a prostituição como serviço exclusivamente sexual. Deixo isso para outra hora.
Há três grandes diferenças entre prostituição e confecção de roupas, agricultura e outras profissões também permeadas pelo tráfico de pessoas. A profissão não é regulamentada (o que torna suas trabalhadoras ainda mais vulneráveis, pois não possuem nenhuma ferramenta de proteção legal como outras categorias). O serviço está ligado, pelo menos em grande parte das vezes, à prática sexual. Disso decorre que, ao tratar o sexo como serviço pelo qual se pode pagar, a prostituição desafia uma crença moral muito forte — a de que sexo deve sempre ser feito por amor, afeto e tesão “espontâneos”.
Questões morais legítimas convertem-se em moralismo quando tenta-se utilizá-las como régua única, generalizadora e brutal sobre todas as realidades de todas as pessoas. É o que acontece quando uma militante feminista diz que a prostituição é necessariamente um mal, e que nenhuma mulher faria isso se não fosse forçada por condições econômicas ou pelo “patriarcado”. Na régua de valores dessas militantes o sexo não pode ser vendido (isso quando não trocam alhos com bugalhos e dizem que o que está sendo vendido é o corpo — uma grande mentira combatida pelos movimentos de trabalhadoras do sexo do mundo todo).
Somem a tudo isso a tal síndrome da militância arrogante – o assalto à agência dessas mulheres todas que trabalham no mercado do sexo – e, voilà, o estrago está feito. Temos então feministas que, em vez de defenderem a liberdade de as mulheres fazerem o que quiserem com os próprios corpos, defendem pautas que as proíbem de escolherem por si mesmas. Roubam-nas de sua agência. Fingem que não escutam. Invisibilizam. Ora, o raciocínio é o mesmo em relação ao aborto, minhas amigas: quem o pratica deve sofrer violências e ser abandonada pelo Estado, pelo simples fato de você estar decidida a não abortar?
Em 17 de dezembro, celebra-se o dia internacional de luta pelo fim da violência contra as trabalhadoras do sexo. Até lá, espero sinceramente que a discussão se aprofunde. Vamos trocar os discursos prontos pela informação, reflexão e debate. Acima de tudo, como sempre, meu melhor conselho para as que estamos do lado privilegiado da história (no caso, quem não trabalha no mercado do sexo) é: ouçamos.
PS.: o debate feminista sobre práticas sexuais (prostituição, BDSM, pornografia, etc) vai muito, muito longe e é delicioso; prometo voltar a ele em breve!

As balas da ditadura contra a direção do PCdoB

De: Vermelho

No livro que produziu para a Fundação Maurício Grabois em 2012 – Vidas, veredas: paixão – o escritor e jornalista paranaense Luiz Manfredini dedicou todo um capítulo ao dramático episódio conhecido como Chacina da Lapa. O relato, que segue abaixo, começa numa residência em Pequim, onde estavam hospedados João Amazonas, Renato Rabelo e Dynéas Aguiar.

 
Chacina da Lapa, SP, 16 de dezembro de 1976.

Há 37 anos a ditadura militar brasileira cometia sua derradeira atrocidade: invadiu uma casa no bairro paulistano da Lapa, onde se reunia parte da direção nacional do PCdoB. Do violento ataque restaram mortos o histórico dirigente comunista Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, um dos comandantes da guerrilha do Araguaia. João Batista Drumond, jovem dirigente vindo da Ação Popular, foi assassinado sob tortura já no dia seguinte. E foram presos Aldo Arantes, Haroldo Lima, Wladimir Pomar, Elza Monnerat, Joaquim Celso de Lima e Maria Trindade.

Tristeza na primavera de Pequim

Na manhã de final de primavera em Pequim, 17 de dezembro de 1976, um dirigente do Comitê Central do Partido Comunista Chinês (PCCh) compareceu inesperadamente à casa em que estavam hospedados três importantes visitantes estrangeiros: João Amazonas, Dynéas Aguiar e Renato Rabelo, dirigentes do Partido Comunista do Brasil. A fisionomia grave com que encarou os camaradas brasileiros superava a habitual formalidade chinesa. Foi direto ao ponto: a agência noticiosa chinesa divulgara havia pouco que a polícia invadira a casa em que se reunia o Comitê Central do PCdoB, num bairro de São Paulo. Havia mortos e presos.

João Amazonas, o único entre os três a conhecer o endereço, o confirmou: Rua Pio XI, 767, no bairro da Lapa, onde habitualmente se reunia a direção nacional do Partido. O número total de baixas e as respectivas identificações ainda estavam confusos no despacho da agência chinesa.

O dirigente chinês, respeitoso e compungido, apresentou aos brasileiros as condolências e a solidariedade do PCCh, retirando-se em seguida. Na sala ficaram os brasileiros com sua dor.

***

Aldo Arantes descia as escadarias da estação Paraíso do metrô quando um grupo de policiais que pareceu surgir do nada lhe caiu em cima, aos berros e trambolhões, sem lhe dar chance de reação. Passava das dez da noite do dia 15 de dezembro de 1976. Encapuzado, lançado no chão de um carro, ali mesmo começou a apanhar.

Menos de uma hora antes Aldo e Haroldo Lima haviam desembarcado nas proximidades do Ibirapuera de um carro do qual a marca, o modelo e a cor não conheciam, porque vendados. Recém terminara a reunião do Comitê Central do PCdoB e ambos compunham uma das duplas que, a intervalos, deixariam a casa onde ocorrera o encontro ultrassecreto. Antes haviam saído João Batista Drummond e Wladimir Pomar. Os próximos, Jover Telles e José Novaes, sairiam na madrugada seguinte, conduzidos pelo motorista Joaquim Lima e por Elza Monnerat, integrante do Comitê Central e participante da Guerrilha do Araguaia, encarregada do transporte dos participantes da reunião. Na casa restaria o histórico dirigente Pedro Pomar, Ângelo Arroyo, um dos comandantes do Araguaia, e Maria Trindade, que lá morava e ajudava na infraestrutura.

João Batista Drummond e Wladimir Pomar foram presos na região da Avenida Nove de Julho, logo após desembarcarem do mesmo carro em que, horas depois, viajariam Aldo Arantes e Haroldo Lima. Este foi seguido até em casa e preso na manhã do dia seguinte. A dupla Jover Telles e José Novaes saiu ilesa, mas não Elza Monnerat e o motorista Joaquim Celso de Lima, presos após deixá-los em algum ponto da cidade. Na manhã seguinte, 16, a casa da Rua Pio XI foi atacada por uma força descomunal de policiais e militares fortemente armados. Cobriram-na de balas, matando Pedro Pomar e Ângelo Arroyo. Maria Trindade, militante que ali morava, foi presa.

As reuniões do Comitê Central, realizadas a cada seis meses, eram cercadas de medidas extremas de segurança. Contavam sempre com apenas metade dos seus membros, que se revezavam, de modo que ao menos uma parte da direção restasse a salvo de eventual ataque repressivo. Os membros, apanhados sempre à noite em locais da cidade combinados com pouca antecedência, seguiam vendados até o local da reunião e assim permaneciam até que o carro estacionasse numa garagem fechada, com entrada direta para a casa. Os procedimentos durante a reunião eram rigorosos. Nenhum vizinho deveria suspeitar do encontro, razão pela qual a regra do silêncio era absoluta na sala com portas e janelas cerradas. Nenhuma voz elevada, nenhum debate veemente, nenhum cumprimento efusivo, nenhum movimento que resultasse em ruídos. Para todos os efeitos ali morava um casal de idosos – João Amazonas e Elza Monnerat – e os empregados Joaquim e Maria. Tudo bastante convencional.

Mas nada disso resistiu ao que de pior poderia acontecer: a existência de um traidor entre os dirigentes ali reunidos. Jover Telles, baseado no Rio de Janeiro, havia sido preso três meses antes, sem que ninguém soubesse, e negociado com a polícia. Em troca do bom tratamento, da liberdade e de algumas vantagens, entregaria a reunião do Comitê Central do Partido. Foi o que fez. Levou a repressão ao ponto onde seria apanhado para a reunião. E a polícia armou seu plano de ataque. Durante os dias em que esteve reunido com seus camaradas, Jover portou-se como se nada de anormal houvesse ocorrido.

O único dos participantes da reunião que escapou, fora o próprio Jover, foi José Novaes, que teve a sorte de sair da casa em dupla com o traidor, poupado pela polícia. Jover desapareceu antes mesmo que raiasse o dia 16 de dezembro. Somente tempos depois investigações revelaram sua traição.

As torturas começaram já após as prisões, no DOI-Codi da tristemente famosa Rua Tutóia. João Batista Drummond não resistiu e morreu horas depois. Aldo, Haroldo, Elza Monnerat e Wladimir Pomar (filho de Pedro Pomar) foram transferidos para o Rio, na madrugada do dia 17 de dezembro, onde as sevícias, sob os mais perversos requintes, se prolongaram por dias a fio no macabro quartel da Polícia do Exército, na Rua Barão de Mesquita, na Tijuca. Notório centro de torturas da ditadura, lá Aldo Arantes ouviu o que jamais abandonaria sua memória e que lhe vem frequentemente como pesadelo: certa madrugada foi acordado pelos gritos lancinantes de um homem adulto que, massacrado pelo suplício, suplicava pela mãe, não por Deus, não pelo pai, mas pela mãe. Na madrugada de terror, aquele clamor agônico: “Mãe! Mãe! Mãe”.

De volta a São Paulo, continuaram a ser torturados no DOPS e no DOI-Codi, até serem transferidos para o presídio do Hipódromo e, depois, para o do Barro Branco.

Haroldo e Aldo foram condenados a cinco anos de prisão. À pena de Haroldo somaram-se mais cinco anos de um processo anterior. Mas foram libertados bem antes, no segundo semestre de 1979, com a anistia.

***

No dia seguinte às prisões, ainda no DOPS paulista, um policial olhou fixamente Haroldo Lima, cara a cara e, com satisfeita gravidade, quase soletrando as palavras, como se as degustasse, disse:

– Comunico-lhe que o seu PCdoB acabou.

Era o tom oficial: a liquidação do Partido. Nesse dia, 17 de dezembro, um jornal mancheteava: "O PCdoB foi destruído" – e foi seguido pelo restante da mídia.

Em Pequim, João Amazonas, Dynéas Aguiar e Renato Rabelo sabiam que o Partido não fora liquidado, mas a ditadura havia atingido – e muito gravemente – sua cabeça. O Comitê Central estava pulverizado, seus membros no Brasil ou se encontravam mortos, ou presos ou desarticulados. Urgia, portanto, recompor a vanguarda partidária, o que implicava, em primeiro lugar, reunir numa direção provisória os dirigentes que se encontravam no exterior. Aos três de Pequim, se somaria Diógenes Arruda, exilado na França, Nelson Levi, que morava em Portugal, e Dynéas Aguiar, que fazia a ponte Buenos Aires/Paris.

A primeira iniciativa foi assegurar a edição mensal da A Classe Operária, cuja matriz era enviada a alguns contatos no Brasil, para reprodução, e também para a rádio Tirana, onde era veiculada no programa diário em língua portuguesa. Este era o único vínculo da direção provisória com pelo menos parte das bases partidárias espalhadas pelo país e sem ligação entre si. Em seguida, o desafio era localizar dirigentes no Brasil, na perspectiva de reorganizar o Partido a partir da realização de uma conferência nacional.

Dynéas ocupou-se dessa tarefa. Fora do Brasil desde 1972, para articular na América Latina a solidariedade à luta do povo brasileiro e difundir a Guerrilha do Araguaia, voltou a Buenos Aires, onde ainda residia e, a partir de lá, começou a recompor sua rede de contatos. Trabalho difícil e cuidadoso. Não conhecia boa parte dos dirigentes, muitos dos quais vindos ao Partido após a incorporação da AP. Ademais, não se sabia ainda o que havia ocorrido, de fato, na casa da Lapa, nem mesmo quantos estavam presos. Havia especulações, a mais dramática delas sobre possível infiltração. Assim, com extrema cautela, os contatos começaram a ser feitos, primeiro no Rio Grande do Sul, depois em São Paulo e, a partir daí, com Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro. Um contato puxando o outro, tudo vagaroso, arrastado, porque em meio a rigorosas precauções.

domingo, 15 de dezembro de 2013

Bomba! Pastor que batizou Carla Perez tornou-se babalorixá da umbanda

M de Michelle, M de Mayoría: Chile de todos.

"A Cocaína do Lula", Tucanhede ajuda Serra, mas tem que meter o Lula no meio

Eliane Tucanhede é a grande porta-voz do tucanato paulista. Agora, pra atacar Aécio, pôs na boca do Lula palavras que ele não disse. Quem deduziu que Lula ligava o pó dos Perrela ao senador do Rio de Janeiro, e, até agora pré-candidato à presidência, Aécio Neves, foi ela. Tucanhede não consegue disfarçar seu paulisto-tucanismo e Serra não desiste de destruir seus correligionários. Sucesso aos dois.

A cocaína de Lula

BRASÍLIA - Lula não precisa e não deveria desferir golpes abaixo da cintura, até porque o PT já tem bom arsenal contra os tucanos nas eleições de 2014, atacando de Siemens, Alstom, trem, metrô, palavrinhas que marcam bem uma campanha.

Com sua alta popularidade, seu poder de comando no PT e seu status de ex-presidente, ele deveria pensar bem antes de falar e mais ainda antes de insinuar. Mas Lula foi buscar mensagem subliminar de profundo mau gosto contra adversários.
Os gritos ecoavam no salão cheio de jovens e militantes no congresso do PT: "Sou brasileiro e não me engano, a cocaína financia os tucanos".
O grande líder não apenas autorizou como potencializou, jogando gasolina na fogueira: "Se for comparar o emprego do Zé Dirceu no hotel com a quantidade de cocaína no helicóptero, pelo menos houve uma desproporcionalidade no assunto".
Era para ser mais um ataque à imprensa, tática surrada de Lula para levar as plateias petistas ao delírio, mas virou uma tentativa um tanto sórdida de criar e massificar um vínculo dos tucanos com cocaína.
A referência dos militantes --que até podem ser irresponsáveis-- e do seu líder --que não tem esse direito-- era à grande dose da droga encontrada no helicóptero da família do senador Zezé Perrella.
Perrella é ligado ao candidato tucano à Presidência, Aécio Neves, mas ele não é do PSDB, é do PDT. E, aliás, até sexta não havia algo que o comprometesse com a cocaína e muito menos um documento, uma declaração ou uma revelação envolvendo o tucano com as dro- gas do helicóptero.
Derrotado usar essa sujeira já seria inadmissível. Se quem usa é potencial vitorioso, como Lula, passa a ser indigno. Enlameia não os adversários, mas a própria campanha.
Duvido que Dilma aprove. Mas também duvido que ela tenha poder para controlar Lula, o partido e até a própria campanha. Que, apesar de favorita, vai por um mau caminho.

eliane cantanhêde
Eliane Cantanhêde, jornalista, é colunista da Página 2 da versão impressa da Folha, onde escreve às terças, quintas, sextas e domingos. É também comentarista do telejornal "Globonews em Pauta" e da Rádio Metrópole da Bahia.