sábado, 21 de setembro de 2013

Honestino Guimarães recebe hoje anistia política post mortem em cerimônia na UnBdes na política

Luciano Nascimento 
Repórter da Agência Brasil

Brasília – O ex-presidente da União Nacional dos Estudantes (UNE) Honestino Guimarães vai ser declarado hoje (20) anistiado político post mortem, em cerimônia na Universidade de Brasília (UnB), onde ele estudou geologia. Na solenidade, o secretário nacional de Justiça,  Paulo Abrão, lerá o pedido de desculpas oficial do governo brasileiro e declarará Honestino anistiado. Parentes, amigos e ex-companheiros de movimento estudantil de Honestino participam da solenidade, ao lado de professores e alunos da universidade.
"Homenagear Honestino Guimarães é um forma de, emblematicamente, oficializar o pedido de desculpa do Estado a sua família, gesto que o país, até o momento, não havia feito", disse, antes da cerimônia, o secretário Paulo Abrão, que preside a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.
Para Abrão, o gesto significa também o reconhecimento formal de Honestino como um dos protagonistas da história da resistência à ditadura militar. "Ele simboliza a forma pela qual os estudantes se engajaram contra a ditadura militar, mostrando que a nossa juventude sabe lutar contra a opressão. Ele serve de exemplo para que a juventude continue lutando pelos seus direitos", acrescentou.
Natural de Itaberaí, em Goiás, aos 17 anos, Honestino foi o primeiro colocado no vestibular da UnB para geologia, em 1965. Por seu envolvimento com a política estudantil, foi preso diversas vezes. Em agosto de 1967, preso pela quarta vez, foi eleito presidente da Federação dos Estudantes Universitários de Brasília. Em 26 de setembro de 1968, foi desligado da universidade como punição por ter liderado movimento pela expulsão de um falso professor da UnB, informante da ditadura. Naquele ano, casou-se com Isaura Botelho.
Em 1968, com a edição do Ato Institucional Nº 5 (AI-5), que suspendeu várias garantias constitucionais, Honestino passou a viver na clandestinidade, com Isaura, em São Paulo. Em 1970, nasceu a filha do casal, Juliana. Quando o então presidente da UNE, Jean Marc van der Weid, foi preso, Honestino assumiu a presidência interina da entidade, permanecendo até 1971. No congresso da UNE naquele ano, foi eleito presidente. Coordenou encontros estudantis e lutou contra o regime militar até ser preso no Rio por agentes do Centro de Informações da Marinha (Ceninar), em outubro de 1973, quando desapareceu, após cinco anos de clandestinidade. Tinha 26 anos.
Juliana disse que a homenagem ao pai emociona, mas ressaltou que isso não basta. "Estamos atrás da verdade. Já se passaram 40 anos, e eu ainda não sei onde está meu pai. Não sabemos o que aconteceu no dia 10 de outubro, quando ele desapareceu. O ato é um pedacinho, temos muita coisa para buscar, [para ir] atrás da memória do que aconteceu. É uma coisa de respeito com ele e com todo mundo [que desapareceu]", desabafou Juliana Guimarães.

Com apenas 3 anos à época do desaparecimento, Juliana quase não conviveu com o pai e espera que as comissões Nacional da Verdade e Anísio Texeira de Memória e Verdade da UnB possam contribuir com a investigação sobre o paradeiro do corpo dele. Até hoje, não se conhece o local, nem as circunstâncias da morte ou mesmo o paradeiro dos restos mortais de Honestino. "As comissões estão aí para que se consigam as respostas. O paradeiro dele a gente ainda não sabe. É preciso descobrir o que aconteceu com todas as pessoas que sumiram e que ninguém dá uma resposta."
Na cerimônia, também estão sendo homenageados professores, funcionários e ex-alunos da UnB perseguidos pelo regime militar por suas posições políticas e pela defesa da democracia. Abrão deve entregar mais de 200 certificados de homenagem e anistia política, com pedido de desculpas oficial, aos parentes dessas pessoas. "Não se trata unicamente de conhecer a história, mas de reconhecer as violações de direitos humanos praticados pelo Estado, de reconhecer o legítimo direito de revolta dos que lutavam contra a ditadura", destacou Abrão.
Segundo o secretário nacional de Justiça, o ato servirá também para lembrar o projeto original da UnB desenhado por Darcy Ribeiro e por Anísio Teixeira. "Estamos resgatando as razões originais da fundação da UnB para que ela possa cumprir um papel democrático dentro da nossa sociedade, com profundo respeito à liberdade, aos direitos humanos e ao espírito crítico, que foi interrompido pela ditadura militar", afirmou.
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sexta-feira, 20 de setembro de 2013

"Sou maior que a história grega. Sou gaúcho e me chega, pra ser feliz no universo" Esse cara tá doente!!!!

Roberta Sá e Ney Matogrosso. Dois grandes talentos da música brasileira

O Papa Francisco e os homossexuais - Wilson Gomes


Por Wilson Gomes
Traduzo abaixo os trechos que considerei mais pertinentes da entrevista do papa Bergoglio a La Civilità Cattolica, de que se está falando. E faço dois comentários em seguida. 

“Em Buenos Aires eu recebia cartas de homossexuais, que são “feridos sociais” porque me dizem que sentem o quanto a Igreja lhes tenha condenado sempre. Mas a Igreja não quer fazer isso. Durante o voo de retorno do Rio de Janeiro disse que, se um homossexual é uma pessoa de boa vontade e está à procura de Deus, eu não sou ninguém para julgá-lo. Ao dizer isso, eu expressei o que já diz o Catecismo. A religião tem o direito de manifestar a própria opinião para com ela servir a todos, mas Deus, na criação, nos fez livres: a ingerência espiritual na vida pessoal não é mais possível”.
“Uma vez uma pessoa me perguntou, na forma de uma provocação, se eu aprovava a homossexualidade. Eu então lhe respondi com outra pergunta: «Diga-me: Deus, quando olha um homossexual, aprova-lhe a existência com afeto ou a rejeita por meio de uma condenação?». É preciso sempre considerar a pessoa. Aqui entramos no mistério do homem. Na vida, Deus acompanha as pessoas, e nós devemos acompanhá-las a partir da condição delas. É preciso acompanhá-las como misericórdia”.
“O confessionário não é uma sala de tortura, mas o lugar da misericórdia no qual o Senhor nos estimula a fazer o melhor que pudermos. Penso também na situação de uma mulher que deixou para trás um matrimônio fracassado no qual tenha até mesmo abortado. Depois esta mulher se casou de novo e agora está tranquila com cinco filhos. O aborto lhe pesa enormemente e é sinceramente arrependida. Gostaria de continuar na vida cristã. O que faz o confessor? Não podemos insistir apenas sobre questões ligadas ao aborto, casamento homossexual e uso de métodos anticoncepcionais. Isso não é possível. Nunca falei muito disso e fui criticado. Mas quando se fala disso, é preciso falar em um contexto. O ponto de vista da Igreja, ademais, já é conhecido e eu sou um filho da Igreja, mas não é preciso ficar falando o tempo todo disso”
Parece pouco, meus caros, mas não é.
O papa resolveu enfrentar a questão do ponto de vista pastoral (i. é, para ficar na metáfora rural do cristianismo, do modo como os pastores devem cuidar do seu rebanho) e não do ponto de vista da doutrina. Preocupa-lhe que doutrinas duras sobre os pontos nevrálgicos das divergências morais (gays, aborto, métodos contraceptivos) em que a Igreja representa uma posição minoritária se materializem em atitudes impiedosas, humilhantes ou de rejeição por parte do clero em face das pessoas que adotaram comportamentos não obedientes à prescrição moral eclesial nestas questões. Tematiza particularmente o sofrimento dos homossexuais, que se sentem ofendidos e rejeitados pela Igreja, dos divorciados recasados e das mulheres que já abortaram. As palavras-chave do papa aqui são “misericórdia” (versus “impiedade”), “acolhimento” (versus “rejeição”), compreensão (versus “julgamento”). Além disso, refuta a obsessão clerical, na pregação e na confissão, por estes temas nevrálgicos que provocam tanto sofrimento em muitas pessoas.
Não quer dizer que queira mudar doutrinas, quer dizer que deseja que mudem as atitudes do clero e dos religiosos a respeito dos homossexuais, dos divorciados recasados e das pessoas que já abortaram. Não vê porque se deva ficar preso nesses temas, como se isso fosse o centro da espiritualidade e da crença católica; Não concorda com uma atitude constante de dedo em riste e julgamentos punitivos, mas na confiança que Deus, que fez todo mundo livre, não rejeita, mas acolhe todos os seus filhos; Recusa, além disso, a atitude clássica, defensiva, das religiões sobre estes temas, segundo a qual se não tratarmos com severa impiedade os "pecadores" eles voltarão ao pecado (ou se respeitarmos os homossexuais, todos começarão a achar normal a homossexualidade). Não, a posição pastoral de Francisco não parece estar preocupada em salvar a doutrina (que continua em seu lugar) pela correção e punição do comportamento; o papa parece mais preocupado com o sofrimento daqueles que são o objeto do juízo severo e pouco acolhedor dos religiosos e clérigos - o que é uma posição muito incomum no campo religioso hoje.
Eu achei digno. Muito digno

Ônibus de Aécio faz ultrapassagem proibida em propaganda partidária na TV

Divulgação do vídeo marca início da propaganda do PSDB de olho em 2014 

Do R7

Durante propaganda oficial do PSDB lançada nesta quinta-feira (19) na TV, que marca o início das movimentações para a eleição de 2014, o ônibus que leva o senador Aécio Neves (PSDB-MG) para uma conversa com agricultores aparece no vídeo fazendo uma ultrapassagem proibida, em Mato Grosso.
O artigo 203 do CTB (Código Brasileiro de Trânsito) "prevê infração gravíssima e multa como penalidade para os seguintes casos de ultrapassagem pela contramão: "nas curvas, aclives e declives, sem visibilidade suficiente; nas faixas de pedestre; nas pontes, viadutos ou túneis; parado em fila junto a sinais luminosos, porteiras, cancelas, cruzamentos ou qualquer outro impedimento à livre circulação; onde houver marcação viária longitudinal de divisão de fluxos opostos do tipo linha dupla contínua ou simples contínua amarela".

No caso, o ônibus de Aécio ultrapassou na faixa dupla contínua.


O tucano, que é pré-candidato do PSDB à Presidência da República, usou o programa de seu partido exibido em rede nacional para criticar a falta de investimentos em infraestrutura, as obras do governo federal que estão paradas, o que chamou de "paternalismo'' do PT, e defendeu "tolerância zero" com a inflação.

A estratégia do partido é percorrer o País "conversando com os brasileiros", e Aécio domina os quase 11 minutos da propaganda. O ônibus passa pelo interior do Ceará, Paraíba, Mato Grosso e São Paulo, sempre encontrando pessoas com queixas do governo Dilma Rousseff.

Entre os temas das conversas entre Aécio e ruralistas estão os recordes de produção, mas também problemas de logística que impedem o crescimento da agricultura.

A reportagem do R7 procurou a assessoria do PSDB, que não se manifestou sobre o caso até a publicação desta reportagem. No entanto, a assessoria deve se posicionar ainda hoje. 

Receita Federal pega mais uma "esperteza" da Rede Goebbles pra não pagar o que deve


Receita vê “milagre” e cobra R$ 713 milhões da Globo. Mas a mídia ignora


decisão é pública e está na internet, acessível a qualquer jornalista. Mas quase ninguém se interessou pela notícia: o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais do Ministério da Fazenda negou recurso das organizações Globo contra uma multa aplicada pela Receita Federal. O processo envolve a cobrança de R$ 713 milhões.
Não, não é o mesmo processo sobre o qual já tratamos aqui neste blog, relativo aos direitos da Copa do Mundo de 2002 e que também envolviam centenas de milhões de reais. É outro. Mais uma multa da Receita por outra operação da Globo consideradas igualmente irregular.
A mesma Globo cujos colunistas, articulistas e editoriais pregam diariamente o discurso da ética (embora a ética deles seja seletiva). É claro que, sobre esse processo, nenhum deles escreveu coisa alguma.
A nova multa
A multa da Receita, essa nova, foi aplicada por aproveitamento de ágio formado em mudanças societárias entre as empresas do grupo. Foi a chamada triangulação, usada para tirar vantagem financeira da operação. Nesse caso, uma dívida pode até se transformar em lucro.
A Receita considerou que a Globopar (Globo Comunicações e PArticipações S.A.) fez em 2005 amortização indevida no cálculo do IRPJ (Imposto de REnda de Pessoa Jurídica) e da CSLL (Contribuição Social sobre Lucro Líquido).
Quando uma empresa compra a outra, essa mesma empresa tem o direito de abater tributos. Acontece que o valor usado na operação foi artificial, como concluiu a Receita Federal.
Diante da irregularidade, aplicou a multa de R$ 713 milhões em 2009.
Isso porque a dívida da Globopar foi “adquirida” pela TV Globo, que usou a Globo Rio Participações e Serviços Ltda para passar a ser credora e sócia da Globopar, que já era controlada pela Globo Rio. A compra se deu por meio de desconto da dívida que a Globo Rio tinha com a TV Globo. Resumindo, a operação usou empresas da mesma organização para reduzir o prejuízo da Globopar, que em 2005 era de R$ 2,34 bilhões.
A Receita considerou que as operações foram “legais apenas no seu aspecto formal”, já que todas as empresa pertenciam às mesmas pessoas.
“Como podemos perceber, operou-se um milagre dentro da Globopar, que teve um PL [patrimônio líquido] negativo de R$ 2,34 bilhões transformado em PL positivo, de R$ 318 milhões, tudo isso no exíguo prazo de 30 dias”, concluiu a Receita. “A Globopar passou a desfrutar de um ágio a amortizar que nada mais é que seu próprio patrimônio líquido negativo.”
Uma reportagem do portal Consultor Jurídico explica outros detalhes da intrincada operação.
A Globo recorreu da multa ao Carf, que agora rejeitou os argumento. Ainda cabe recurso para a Globo.
E agora, a mídia vai ficar calada de novo?
Como aconteceu com a multa em relação aos direitos da Copa, a imprensa novamente fechou os olhos para essa notícia. Se fosse qualquer outra grande empresa do país, o caso estaria nas manchetes. Como se trata da Globo, o silêncio de sempre.

‘Venci’, diz ex-catadora de latinhas do DF que passou em concurso do TJ

Marilene Lopes trocou renda mensal de R$ 50 por salário de R$ 7 mil.

'Passei um ano com uma só calcinha', lembra a hoje técnica judiciária.

Raquel Morais Do G1 DF

Uma catadora de latinhas do Distrito Federal conseguiu passar em um concurso de nível médio do Tribunal de Justiça estudando apenas 25 dias. Com isso, ela trocou uma renda mensal de R$ 50 por um salário de R$ 7 mil. “Foi muito difícil. Hoje, contar parece que foi fácil, mas eu venci”, afirma. Agora, ela diz que pensa em estudar direito.
Ex-catadora de latinhas Marilene Lopes e os filhos, em frente ao barraco em que moravam em uma invasão em Brazlândia, no Distrito Federal (Foto: Marilene Lopes/Arquivo pessoal)Ex-catadora de latinhas Marilene Lopes e os filhos em frente ao barraco em que moravam em uma invasão em Brazlândia, no Distrito Federal (Foto: Marilene Lopes/Arquivo pessoal)
Sem dinheiro nem para comprar gás e obrigada a cozinhar com gravetos, Marilene Lopes viu a vida dela e a da família mudar em 2001, depois de ler na capa de um jornal a abertura das inscrições para o concurso do Tribunal de Justiça do Distrito Federal.
Ela, que até então ganhava R$ 50 por mês catando latinhas em Brazlândia, a cerca de 30 quilômetros de Brasília, decidiu usar os 25 dias de repouso da cirurgia de correção do lábio leporino para estudar com as irmãs, que tinham a apostila da seleção. Apenas Marilene foi aprovada.
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Nunca tinha nem fruta para comer. Eu me lembro que passei um ano com uma só calcinha. Tomava banho, lavava e dormia sem, até secar, para vestir no outro dia. Roupas, sapato, bicicleta [os filhos puderam ter depois da aprovação no concurso]. Nunca tive uma bicicleta"
Marilene Lopes, ex-catadora de latinhas que hoje trabalha no TJDF
"Minha mãe disse que, se eu fosse operar, ela cuidava dos meninos, então fui para a casa dela. Minha mãe comprou uma apostila para as minhas irmãs, aí dei a ideia de formarmos um grupo de estudo. Íamos de 8h às 12h, 14h às 18h e de 19h às 23h30. Depois eu seguia sozinha até as 2h", explica.
O esforço de quase 12 anos atrás ainda tem lugar especial na memória da família. Na época, eles moravam em uma invasão em Brazlândia.

Marilene já havia sido agente de saúde e doméstica, mas perdeu o emprego por causa das vezes em que faltou para cuidar das crianças. Como os meninos eram impedidos de entrar na creche se estivessem com os pés sujos, ela comprou um carrinho de mão para levá-los e aproveitou para unir o útil ao agradável: na volta, catava as latinhas de alumínio.

Segundo ela, a situação durou um ano e meio, e na época a família passava muita fome. "Nunca tinha nem fruta para comer. Eu me lembro que passei um ano com uma só calcinha. Tomava banho, lavava e dormia sem, até secar, para vestir no outro dia. Roupas, sapato, bicicleta [os filhos puderam ter depois da aprovação no concurso]. Nunca tive uma bicicleta", conta.
"Tinha medo [de não passar] e ao mesmo tempo ficava confiante. Sabia que se me dedicasse bem eu passaria, só precisava de uma vaga", diz. "Dei uma flutuada ao ver o resultado. Pedi até para minha irmã me beliscar."Mesmo para se inscrever na prova Marilene, que é técnica em enfermagem e em administração, encontrou dificuldades. Ela lembra ter pedido R$ 5 a cada amigo e ter chegado à agência bancária dez minutos antes do fechamento, no último dia do pagamento. E o resultado foi informado por uma das irmãs, que leu o nome dela no jornal.
Ganhando atualmente R$ 7 mil, a técnica judiciária garante que não tem vergonha do passado e que depois de formar os cinco filhos pretende ingressar na faculdade de direito. "Mesmo quando minhas colegas passavam por mim com seus carros e riam ao me ver catando latinhas com o meu carrinho de mão eu não sentia vergonha. E meus filhos têm muito orgulho de mim, da nossa luta. Eles querem seguir meu exemplo."
Marilene já passou pelo Juizado Especial de Competência Geral, 2ª Vara Cível, Órfãos e Sucessões de Sobradinho, 2ª Vara Criminal de Ceilândia, 12ª Vara Cível de Brasília e Contadoria. A trajetória dela inspira os colegas. Por e-mail, o primeiro chefe, o analista Josias D'Olival Junior, é só elogios. "A sua história de vida, a sua garra e o seu caráter nos tocavam e nos inspiravam profundamente."
Servidora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal Marilene Lopes, que foi catadora de latinhas (Foto: Marilene Lopes/Arquivo pessoal)
Servidora do Tribunal de Justiça do Distrito Federal
Marilene Lopes, que foi catadora de latinhas
(Foto: Marilene Lopes/Arquivo pessoal)
A técnica afirma ainda que não se arrepende de nada do que passou, nem mesmo de ter tido cinco filhos – como diz terem comentado amigos. "Ainda hoje choro quando me lembro de tudo. Eu não tinha gás e nem comida e não ia falar pra minha mãe. Se falasse, ela me ajudaria, mas achava um abuso. Além de ficar 25 dias na casa dela, comendo e bebendo sem ajudar nas despesas, ainda ia pedir compras  ou o dinheiro para o gás? Ah, não. Então assim, quando passei, foi como se Deus me falasse 'calma, o deserto acabou'."
Da época de catar latinhas, Marilene diz que mantém ainda a qualidade de ser supereconômica. Ela afirma que não junta mais alumínio por não encontrá-los mais na rua. "As pessoas descobriram o valor, descobriram que dá para vender e juntar dinheiro". Já as irmãs com quem estudou, uma se formou em jornalismo em 2011 e outra passou quatro anos depois no concurso do TJ de Minas Gerais, e foi lotada em Paracatu.
Dificuldades
O primeiro problema enfrentado por Marilene veio na posse do concurso. A cerimônia ocorreu três dias após o nascimento do quinto filho, em um parto complicado. A médica não queria liberá-la para a prova, mas só consentiu com a garantia de que ela voltaria até 18h30. Por causa do trânsito, a catadora se atrasou em uma hora.

"A médica chamou a polícia dizendo que eu tinha abandonado meu filho. É que eu estava de alta, mas o bebê não, e ele precisava tomar leite no berçário enquanto eu estivesse fora", lembra. "A enfermeira ligou para a polícia do hospital e explicou a situação e aí pararam de me procurar. A médica me deixou com o problema e foi embora, no término do plantão dela."
Resolvida a situação, Marilene e a família viveram bem até 2003, quando o marido resolveu sair de casa. O homem, que já havia sido preso por porte ilegal de arma, havia "se deslumbrado" com a situação econômica da mulher. A casa e o carro comprados a partir do salário do tribunal precisaram ser divididos.
Atualmente, ela mora com os filhos na casa de um amigo, na Estrutural, enquanto aguarda a entrega de um apartamento de três quartos em Águas Claras. Marilene tem uma moto e, junto com uma das irmãs, está pagando um consórcio para comprar um carro zero.

quarta-feira, 18 de setembro de 2013

Cidades: que sentido terá a “revolução dos aplicativos”?



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Cena do filme “Koyaanisqatsi”, de Godfrey Reggio

Tecnologias permitirão obter cada vez mais dados sobre vida nos espaços urbanos. Para quê: multiplicar autonomia dos cidadãos ou controlá-los? 

Uma nova revolução urbana pode ter começado. Segundo reportagem especial da revista inglesa The Economist, a quantidade de dados que uma cidade produz, combinada com as tecnologias móveis e em rede que permitem compartilhá-los, será tão transformadora quanto foi a eletricidade. Inúmeras inovações já começaram a antecipar este futuro. Podem ser para bem ou para mal.
A ONU calcula que, até 2050, a população mundial urbana será de cerca de 6,3 bilhões de pessoas. Uma parcela sempre crescente dos habitantes urbanos está disposta a compartilhar informações publicamente, como é possível perceber com a popularidade de aplicativos como o Foursquare (que indica o local onde o usuário está e mostra se seus amigos estão por perto). Além disso, prefeituras também concentram dados sobre o que acontece em suas ruas: informações de trânsito, dados sobre fluxos, áreas com mais problemas de segurança etc. Como usar esses dados de maneira que eles façam a experiência de viver em uma cidade ser algo menos caótico, mais sustentável e humano?
Muitas cidades começam programas para tornar-se “smart cities”, como mostra a reportagem. Em Barcelona, por exemplo, há um projeto para inserir, nos postes de luz, telas que indicam lugares para estacionar, filas para museus, cestas de lixo que estão muito cheias e até movimentos “suspeitos” de pessoas. No website de San Francisco (EUA), dezenas de aplicativos informam desde a programação cultural da semana a locais com registros de abuso sexual. Já no Rio de Janeiro, as informações captadas são geridas apenas pela prefeitura: dezenas de operadores vigiam as cerca de 400 câmeras de segurança espalhadas pela cidade, além de denúncias policiais e até previsão do tempo.
Como é possível perceber pelo exemplo carioca, isso traz também um grande problema: a cidade vira um grande panóptico eletrônico, que controla todas as ações de seus cidadãos. E se o governo pudesse, por exemplo, prever protestos que estão para acontecer, e impedi-los? E se isso virasse um mecanismo para excluir ainda mais as classes economicamente empobrecidas? Como imaginar um governo de uma cidade digitalmente integrada que não pareça uma sala de controle de um filme de ficção científica? Outro problema é o fato de que se a cidade é organizada por redes de dados — algo como um “sistema nervoso digital –, é muito possível que crackers consigam invadi-lo e paralisá-lo.
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Saskia Sassen, socióloga da universidade Columbia, é incisiva: segundo ela, para a cidade ser realmente de domínio público, as prefeituras devem tornar públicos todos os seus sistemas de dados. O próprio governo poderia ser uma plataforma, provendo serviços básicos e informações e permitindo que as pessoas pudessem ter mais controle sobre si mesmas.
O sistema dos governos ainda não é transparente, mas os moradores de grandes cidades já podem utilizar a tecnologia e o crowdsourcing (fontes coletivas de informações) a seu favor. Muitos aplicativos para celulares já funcionam desta maneira. O Foursquare, provavelmente o mais conhecido, serve para seus usuários dizerem em quais lugares comerciais (principalmente restaurantes) já foram, e qual sua opinião sobre eles.
Outro exemplo mais interessante é o Colab, criado por brasileiros e eleito pela New Cities Foundation como o melhor do mundo no prêmio App My City. Ele funciona como uma rede social, onde é possível fiscalizar, propôr e avaliar os serviços de uma cidade. Pela rede, o usuário Humberto propõe uma ciclovia em um local na asa norte de Brasília. Já Ticiana confere pontuação de duas estrelas para a Universidade Federal da Bahia. A maioria dos usuários, por enquanto, limita-se a registrar problemas como buracos ou sujeira nas ruas.
Para The Economist, não existe apenas uma maneira de tornar as cidades “inteligentes”, assim como houve diversos modos de levar a elas a eletricidade. O necessário é lutar para que não percamos o controle sobre nossos dados e nossas vidas, e exigir que essa mudança seja em favor das pessoas, e não de empresas ou da vigilância dos governos.

“Mensalão”: por que reabrir o caso



Um erro primário do STF virá à tona. E surgirá oportunidade de debater o financiamento empresarial dos partidos, principal mecanismo de corrupção política no Brasil
Por Antonio Martins |
Este texto inaugura uma parceria entre “Outras Palavras” e “Carta Capital”. A partir de hoje, parte de nosso conteúdo passará a ser publicada simultaneamente no site da revista, em nova iniciativa para fortalecer os laços entre as mídias contra-hegemônicas. –  
Se o voto do ministro Celso de Mello encerrar, nesta quarta-feira (18/9), o julgamento do chamado “Mensalão” pelo Supremo Tribunal Federal (STF), milhões de brasileiros irão sentir-se aliviados e engrandecidos. Tendo acompanhado o episódio, durante oito anos, por meio dos jornais e da TV, eles acreditarão que surgiu, enfim, um caso em que o desvio de verbas públicas não ficará impune. Certas circunstâncias ampliarão seu júbilo. Entre os condenados, haverá “peixes graúdos”. Não será poupado o PT, partido no governo há dez anos. E, glória máxima, parte dos réus irá para a cadeia – o símbolo maior e mais humilhante dos sistemas punitivos modernos. Ficará aberto caminho, pensarão estes milhões, para moralizar a vida política e resgatar a República.
Será um engano trágico, por dois motivos. Do ponto de vista factual, surgiram, nos últimos meses, sinais concretos de que o chamado “Mensalão” não envolveu desvio de recursos públicos. O ministro Joaquim Barbosa, relator do processo e hoje presidente do STF, ignorou estes sinais; teme que este erro primário torne-se claro; é, também por isso, um opositor ferrenho da reabertura do caso.
Mas o engano principal seria político. O encerramento do processo, no pé em que está, evitará que a sociedade debata a corrupção da vida política por meio do dinheiro oferecido pelas empresas aos partidos e a suas campanhas eleitorais. Este é, de longe, o principal mecanismo para submeter as decisões políticas ao poder econômico, e para promover o enriquecimento ilícito de ocupantes de cargos públicos. Está exposto, em detalhes, no episódio do “Mensalão”. Encarcerar José Dirceu e seus colegas, e não examiná-lo, satisfará o ímpeto punitivo com que alguns julgam possível enfrentar a corrupção. Mas varrerá para debaixo do tapete o motor que a impulsiona.
 * * *
A derrubada do mito segundo o qual o “Mensalão” envolveu apropriação e desvio de recursos públicos é obra de um mestre: o jornalista Raimundo Rodrigues Pereira, que dirigiu, nos anos 1970 e 80 algumas das principais publicações da imprensa de resistência à ditadura1. Hoje, toca a revista Retrato do Brasil, Lá, ele e a repórter Lia Imanishi, escrevem, desde fevereiro de 2012, uma série de reportagens investigativas sobre o julgamento, pelo STF, da Ação Penal 470 (AP-470) – a que examina o “Mensalão”. Seu trabalho estende-se por ao menos nove edições regulares da revista [1 2 3 4 5 6 7 8 9], um número especial e um livro. Os textos expõe em detalhes como dois Procuradores-Gerais da República e diversos ministros do Supremo, a começar por Joaquim Barbosa, passaram por cima dos fatos e construíram, para o episódio, a versão que mais interessava à mídia, à opinião pública conservadora e… ao próprio sistema político.
Denunciado pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) em junho de 2005, o “Mensalão” chegou à Procuradoria-Geral (PGR) e ao STF um mês depois. Alguns fatos muito graves eram conhecidos, mostram as reportagens. No início do governo Lula, a direção nacional do PT repassou, por orientação de seu tesoureiro, Delúbio Soares, e com apoio do publicitário Marcos Valério, cerca de R$ 55,3 milhões a políticos de cinco partidos: o próprio PT, PL, PP, PMDB e PTB. Os pagamentos foram feitos por meio do chamado “valerioduto” – um esquema que incluía os bancos Rural e BMG, mais a agência de publicidade de Valério e empresas de seus sócios. Além disso, desde agosto daquele ano Delúbio admitiu que cometera crimes eleitorais: arrecadação de fundos junto a empresas sem contabilização (“caixa 2”); distribuição de somas a correligionários e aliados, também “por fora”.
 No entanto, mostra o Retrato do Brasil, os procuradores-gerais Antonio Fernando de Souza (que atuou no caso até o final de seu mandato, em junho de 2009) e seu sucessor, Roberto Gurgel, omitiram-se da investigação deste delito. Estavam empenhados em argumentar que a admissão do “caixa 2” era mera estratégia para ocultar outro crime. Os dirigentes PT, no governo federal, teriam abastecido o partido e as agremiações aliadas com recursos desviados do Estado.
Formular hipóteses é parte das atribuições do procurador-geral, responsável por comandar inquéritos. Mas nem Antonio Fernando de Souza, nem Roberto Gurgel preocuparam-se com os passos posteriores indispensáveis: investigar; demonstrar a suposição; reunir provas. Ao denunciar ao STF, em abril de 2006, quarenta pessoas envolvidas no episódio, o primeiro assegurou que houvera desvio de recursos públicos. À falta de provas, serviu-se de um atalho. Henrique Pizzolato, diretor de marketing do Banco do Brasil (BB) à época dos fatos, figurava ao mesmo tempo em duas pontas do inquérito. Ele havia recebido, por meio do valerioduto, R$ 326 mil. E, na condição de dirigente do BB, autorizara o pagamento de R$ 72,8 milhões à DNA, agência de publicidade de Marcos Valério. Isso bastou para que o procurador juntasse as pontas. A origem primeira do dinheiro repassado ao PT e aliados seria o Banco do Brasil. Pizzolato desviara os R$ 72,8 milhões da instituição que ajudava a dirigir; como recompensa, recebera suborno de R$ 326 mil.
A “demonstração” foi aceita e repetida acriticamente (e à exaustão), nos últimos sete anos – a começar pelo sucessor de Souza e pela maioria dos ministros do STF. Num de seus textos, Raimundo Pereira descreve, com humor, o discurso empolado que o ministro Gilmar Mendes proferiu na sessão do tribunal, transmitida ao vivo pela TV, em 29/8/12. Está no YouTube. Voz empostada, gestos teatrais, Mendes indigna-se: “O que fizeram com o Ban-co-do-Bra-sil?” E prossegue: “Em operações singelas, se tiram desta instituição 73 milhões, sabendo que não era para fazer serviço algum. […] Eu fico a imaginar […] como nós descemos na escala das de-gra-da-ções”. Três semanas antes, ao apresentar sua acusação, no plenário do Supremo, o procurar-geral Roberto Gurgel, assegurara: “Foi sem dúvida o mais atrevido e escandaloso caso de corrupção e desvio de dinheiro publico realizado no Brasil”.
Em nenhum momento, Pizzolato admitiu as acusações que lhe foram feitas. Os R$ 326 mil recebidos via valerioduto, sustentou, foram para o PT. Todos os pagamentos do BB à DNA correspondiam a serviços efetivamente prestados pela agência. Conforme reza um princípio elementar do Direito, cabia aos que o acusavam provar sua culpa.
Poucos sabem, mas o princípio básico da presunção de inocência não foi respeitado, no julgamento da AP-470. O STF considerou que, sendo os réus pessoas “muito poderosas”, e tendo eles supostamente formado uma quadrilha para apagar as marcas de seus crimes, era possível condená-los com base em indícios consistentes. Pizzolato, por exemplo, foi condenado por unanimidade, em três das acusações que enfrentou e, por 11 votos contra um, numa quarta. Devido à ampla diferença de votos, não poderá beneficiar-se do direito a apresentar “embargos infringentes”, mesmo que o ministro Celso de Mello considere-os legítimos. Sua pena está fixada em 12 anos e 7 meses de prisão mais multa em torno de R$ 1,3 milhão.
A partir de outubro, no entanto, restou-lhe um alento moral. As reportagens de Retrato do Brasil refizeram a trilha de seus argumentos e comprovaram sua veracidade. O STF não permite a Pizzolato reivindicar sua presunção de inocência, mas Raimundo Pereira e Lia Imanishi estão conseguindo comprovar que ele não é culpado do que lhe atribui o Supremo. A partir dos próprios autos do processo, flagrantemente ignorados por dois procuradores-gerais e diversos ministros do Supremo, levantaram 99 notas fiscais que comprovam: os R$ 72,8 milhões pagos à DNA referem-se a promoções e eventos reais, que ocorreram às vistas de milhares ou milhões de brasileiros e têm documentação fiscal regular.
Se estivessem interessados em cumprir sua função constitucional, e não em condenar de antemão, os procuradores e ministros poderiam ter chegado às mesmas conclusões dos repórteres. Verificariam que os recursos pagos pelo BB à DNA não “tiraram da instituição 73 milhões, sabendo que não era para fazer serviço algum”. Custearam eventos patrocinados pelo cartão de crédito do banco (bandeira Visa), ou promoções para divulgá-lo. Entre elas, o Réveillon do Rio de Janeiro; o Círio de Nazaré, em Belém; o Festival de Inverno de Campos do Jordão; a exposição de cultura africana Projeto África, no Centro Cultural do banco no Rio de Janeiro; a publicidade do BB nos biquínis, sutiãs e bandanas das campeãs mundiais de vôlei de praia, Shelda e Adriana; dezenas de peças publicitárias veiculadas pela Rede Globo…
As descobertas de Raimundo e Lia, que desmentem os vereditos do STF, foram feitas em outubro do ano passado e têm sido apresentadas, desde então, com profundidade e detalhes cada vez maiores, nas sucessivas edições do Retrato do Brasil. Foram tema central de debates e atos de protesto contra a forma como se deu o julgamento do “Mensalão”. Até agora, não foram contestadas por nenhum ministro do Supremo, nenhum dos dos procuradores-gerais da República envolvidos no caso, nenhum dos jornais ou jornalistas que defendem a tese do “desvio de dinheiro público”. Todos usam, como defesa, o silêncio e a inércia.
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 Ao desprezarem a investigação de crime eleitoral e optarem pela tentativa de caracterizar desvio de dinheiro público, ministros e procuradores fizeram uma opção política e de, digamos, marketing pessoal. Desvio atrai manchetes e holofotes, além de evocar cadeia. Afirmar que a AP-470 tratou do “mais atrevido caso de corrupção da História” reforça a tese, sempre repetida pelos jornais e TVs, de que o Brasil seria melhor se jamais tivesse sido governado pela esquerda. Em contraste, caixa dois de campanha parece coisa banal e corriqueira, algo que todos os partidos praticam, assunto desimportante. Será?
O economista Ladislau Dowbor, professor da PUC-SP e consultor de diversas agências da ONU, tem se empenhado em demonstrar o contrário. Numa série de artigos e entrevistas publicados nos últimos meses (inclusive em Outras Palavras), ele sustenta que o modelo empresarial de financiamento dos partidos e dos políticos, no Brasil, é a principal causa do esvaziamento da democracia, do sequestro da política pelo poder econômico e do enriquecimento ilícito dos governantes. Sem desmontar este modelo, diz Ladislau, combater a corrupção será sempre uma caça catártica – porém vã – a bodes expiatórios.
Nas “sociedades de espetáculo”, altamente midiatizadas, explica o professor, eleger um político tornou-se extremamente caro; e possuir recursos para bancar muitos mandatos assegura enorme poder político. Em 1997, o Congresso Nacional modificou a legislação eleitoral e autorizou as empresas a investir em partidos e políticos. Desde então, os gastos globais dos candidatos nas eleições dispararam. Segundo o TSE, saltaram de R$ 827 milhões, em 2002, para R$ 4,09 bilhões, em 2012 – um aumento de 591%, em apenas uma década – isso, sem contar o caixa dois. “Eleger um simples deputado, em qualquer Estado do país, não custa menos de R$ 2,5 milhões”, diz Ladislau.
Quem é capaz de mobilizar estes recursos? Uma pesquisa dos professores Wagner Praion Mancuso (USP) e Bruno Speck (Unicamp) revela que “os recursos empresariais ocupam o primeiro lugar entre as fontes de financiamento de campanhas eleitorais brasileiras. Em 2010, corresponderam a 74,4% de todo dinheiro aplicado nas eleições”. Mais uma vez, sem contar os recursos transferidos “por fora”. Quais os efeitos deste vínculo entre pode econômico e mandatos?
Ladislau retorna: “Os interesses manifestam-se do lado das políticas que serão aprovadas – por exemplo, contratos de construção de viadutos e de pistas para mais carros, ainda que se saiba que as cidades estão ficando paralisadas. As empreiteiras e as montadoras agradecem. Do lado do candidato, apenas assentado, já lhe aparece a preocupação com a dívida de campanha que ficou pendurada, e a necessidade de pensar na reeleição. Quatro anos passam rápido. Entre representar interesses legítimos do povo – por exemplo, mais transporte coletivo, mais saúde preventiva – e assegurar a próxima eleição, ele […] sabe quem manda, está preso numa sinuca”.
As consequências deste controle são claras. Ladislau fornece um exemplo, entre inúmeros. “Existe uma bancada Friboi no Congresso, com 41 deputados federais e sete senadores. Dos 41 deputados financiados pela empresa, só um, o gaúcho Vieira da Cunha, votou contra as mudanças no Código Florestal. O próprio relator do Código, Paulo Piau, recebeu R$ 1,25 milhão de agropecuárias (…) Com o financiamento corporativo, temos bancadas ruralista, da grande mídia, das montadoras, dos grandes bancos, das empreiteiras, e temos de ficar à procura de uma bancada do cidadão”…
De que forma este fenômento se desdobra também em lesão direta aos cofres públicos? “Uma dimensão importante deste círculo vicioso”, arremata Ladislau, “é o sobrefaturamento. Quanto mais se eleva o custo financeiro das campanhas, mais a pressão empresarial sobre os políticos se concentra em grandes empresas. Quando são poucas, e poderosas, e com muitos laços políticos, a tendência é a distribuição organizada dos contratos, que reduz as concorrências públicas a simulacros e permite elevar radicalmente o custo dos grandes contratos. Os lucros assim adquiridos permitirão financiar as campanhas da eleição seguinte”…
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Nas eleições de 2012, o PT foi, segundo o TSE, o partido que mais recebeu financiamento privado para suas campanhas: R$ 255 milhões. As grandes empresas são pragmáticas: investem em quem é mais capaz de reunir votos, eleger-se e defender seus interesses: importa-lhes pouco a cor partidária. A entrada dos petistas no circuito das campanhas sustentadas por empresas é, porém, uma das explicações centrais para o retrocesso político do partido – reconhecido por algumas de suas lideranças, como o governador gaúcho Tarso Genro. Nas eleições para o Executivo, os choques são mais crus. Mas na atuação parlamentar, por exemplo, estão se dissolvendo as diferenças – antes nítidas – entre as bancadas petistas e as dos partidos conservadores.
Também por isso, a conduta dos procuradores-gerais e da maioria dos ministros do STF, no julgamento da AP-470, foi grotesco. Tendo em mãos um caso que poderia revelar alguns dos mecanismos centrais de corrupção da política – desde que investigado a fundo –, eles optaram pela busca fácil e preguiçosa de “culpados” individuais, por “jogar para a plateia”, por buscar sem descanso os holofotes. Ao fazê-lo, cometeram, como se viu, injustiças e erros primários.
Se o ministro Celso de Mello optar, nesta quarta-feira, por reconhecer o direito dos réus aos embargos infringentes, haverá alguma esperança de reparar o estrago. Tecnicamente, o espaço para corrigir as sentenças é exíguo. No plano do debate político, serão outros quinhentos. Reaberto o caso, é provável que as revelações factuais recentes feitas pelo trabalho jornalístico de Raimundo Pereira e Lia Imanishi ganhem novo destaque. E – muito mais importante – talvez surja uma brecha para argumentar que o resgate da democracia começa com uma vastíssima reforma política, não com um espetáculo ritual de encarceramento.
1Raimundo Pereira criou e editou Opinião (1971-1977) e Movimento (1975-1980), sobre o qual há um livro, disponível na Internet. Antes disso, dirigiu, entre outros trabalhos, a edição especial da revista Realidade sobre a Amazônia, considerada por alguns como “a maior de todas as reportagens da imprensa brasileira”.

terça-feira, 17 de setembro de 2013

Empresários dos EUA pagam viagem e Ana Amélia volta pedindo que Brasil os ajude

Agência Senado - Ao relatar viagem de dois dias aos Estados Unidos, patrocinada pela Câmara Americana de Comércio, a senadora Ana Amélia (PP-RS) afirmou que os empreendedores americanos têm “sempre as mesmas queixas” em relação ao Brasil: burocracia excessiva, alto custo operacional, morosidade nas negociações e a imprevisibilidade decorrente da insegurança jurídica.
A senadora afirmou que a missão do Congresso é “tentar destravar um pouco essas barreiras que emperram o desenvolvimento, aqui e nas relações bilaterais”. Ressalvou que não se trata de melhorar as condições para atuação dos empreendedores americanos, mas, sim, dos brasileiros, o que, no atual mundo globalizado, acabará por ajudar a todos.
Em pronunciamento nesta quinta-feira (12), a parlamentar afirmou que, embora oposição e situação estejam unidas no Brasil contra as denúncias de espionagem feitas pelo governo americano, as relações econômicas entre as duas nações não podem ser contaminadas pelos problemas diplomáticos. Em palestra em Washington, o embaixador brasileiro, Mauro Vieira, afirmou aos parlamentares que participaram da viagem que o Brasil foi o único país da América Latina que recebeu 17 visitas presidenciais americanas, ressaltando a importância das relações bilaterais.
A corrente de comércio entre Brasil e Estados Unidos superou US$ 70 bilhões no ano passado, com déficit para o Brasil de US$ 6 bilhões, informou Ana Amélia. A senadora chamou a atenção para a necessidade de mudar este quadro, uma vez que o saldo da balança comercial brasileira deve ficar este ano entre US$ 7 bilhões e 8 bilhões, o pior resultado em oito anos,
A viagem, informou a parlamentar, foi sem custos para o Senado e durou dois dias, nos quais houve 12 compromissos. Dela participaram, além da senadora, o senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) e outros seis deputados federais.

Em encontro com Comitê Gestor da Internet, Dilma defende neutralidade da rede



A presidenta Dilma Rousseff se reuniu, nesta segunda-feira (16), no Palácio do Planalto, com integrantes do Comitê Gestor da Internet no Brasil e se posicionou favoravelmente à neutralidade da rede – princípio segundo o qual todas as informações que trafegam na rede devem ser tratadas da mesma forma e com a mesma velocidade. De acordo com o professor Sérgio Amadeu, representante do terceiro setor no CGI, foram tratadas questões relevantes na reunião, como a aprovação do Marco Civil da Internet, segurança da informação, inimputabilidade da rede e privacidade dos usuários e do governo. O Comitê se posicionou a favor da aprovação do Marco Civil com a neutralidade da rede, da liberdade de expressão e da privacidade. Também foi tratada da preocupação de não se permitir a remoção de conteúdo sem ordem judicial.

domingo, 15 de setembro de 2013

Gilberto Maringoni: Black Blocs, cobrir o rosto é o de menos

Black Blocs concentrados em frente à Câmara dos Vereadores do Rio de Janeiro. Foto: Fernando Frazão/ABr
por Gilberto Maringoni
A esquerda não pode, em hipótese alguma, ser condescendente com as ações dos Black Blocs.
Assim como é imperativa a condenação da violência policial, deve-se igualmente negar qualquer aprovação a táticas individualistas, desagregadoras e isolacionistas de grupelhos que se valem de manifestações para desatar sua bílis colérica sobre orelhões, lixeiras e vitrines de lojas.
Qual o programa dito radical dos Black Blocs?
Nenhum, pois os Black Blocs não são radicais. Fazem ações epidérmicas, levianas e superficiais.
Radical quer dizer ir à raiz das questões. Qual a radicalidade de se juntar meia dúzia de garotos hidrófobos e depredar a fachada de um banco? Em que isso penaliza o sistema financeiro?
Baixar em um ponto as taxas de juros é algo muito mais eficiente e danoso à especulação do que as travessuras de meninos e meninas pretensamente rebeldes que cobrem os rostos para parecerem malvados ou misteriosos.
Aliás, qual a finalidade de máscaras e rostos ocultos, além do desejo infantil de um dia ser Batman, Zorro ou National Kid e sair por aí saltando sobre prédios e vivendo aventuras espetaculares? De se ter uma identidade secreta, na qual de dia enfrenta-se uma vidinha besta e à noite, na calada, devolve-se anonimamente à sociedade o mal que se esconde nos corações humanos, como dizia o Sombra em voz gutural?
O pior é que as peripécias dos blocos de blaques isolam os protestos da população que a eles poderia aderir e reduz o ímpeto das mobilizações à idéia de baderna pura e simples. Que acaba sendo complementar à violência policial. Ambas se justificam e se explicam.
Trotsky tem um texto admirável chamado “Porque os marxistas se opõem ao terrorismo individual”, escrito em 1911 e que está no link do pé da página. Ali, o revolucionário russo opõe a consequente manifestação coletiva a ações estrepitosas de poucos indivíduos tomados de fúria aleatória.
O seguinte trecho tem a precisão de um compasso:
Para nós o terror individual é inadmissível precisamente porque apequena o papel das massas em sua própria consciência, as faz aceitar sua impotência e volta seus olhos e esperanças para o grande vingador e libertador que algum dia virá cumprir sua missão.
E mais adiante, completa:
Nos opomos aos atentados terroristas porque a vingança individual não nos satisfaz.
Os Black Blocs têm uma ação deletéria. Acabam justificando a violência policial para um grande número de potenciais participantes de mobilizações de protesto. Exacerbam o reacionarismo existente na sociedade e transformam movimentos sociais em sinônimo de vandalismo. Animam pit bulls existentes nos aparelhos de segurança, como o boçal que atende pelo nome de capitão Bruno, da tropa de choque de Brasília.
Os Black Blocs não organizam nada, não querem nada.
E podem fazer com que manifestações maciças virem nada.