Após dois anos e meio de
polêmicas e negociações, a presidente Dilma Rousseff nomeou nesta
quinta-feira os integrantes da Comissão Nacional da Verdade, que
pretende esclarecer violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e
1988.
Os membros da comissão serão sete:José Carlos
Dias (ex-ministro da Justiça), Gilson Dipp (ministro do Superior
Tribunal de Justiça), Rosa Maria Cardoso da Cunha (advogada), Cláudio
Fonteles (ex-procurador-geral da República), Paulo Sérgio Pinheiro
(diplomata), Maria Rita Kehl (psicanalista) e José Cavalcante Filho
(jurista).
De acordo com o texto que criou a
comissão, os critérios para a escolha dos membros deveria privilegiar
pessoas "de reconhecida idoneidade e conduta ética, identificadas com a
defesa da democracia e institucionalidade constitucional, bem como com o
respeito aos direitos humanos".
Segundo a Agência Brasil, o convite a
cada um foi feito pessoalmente pela presidente, que recebeu os sete em
audiências nesta quinta-feira no Palácio do Planalto. Ainda não há
informações sobre quem presidirá o grupo.
Prevista no Programa Nacional de Direitos
Humanos, assinado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em
dezembro de 2009, a comissão busca trazer à tona a "verdade histórica"
sobre o período e "promover a reconciliação nacional".
A BBC Brasil preparou uma série de perguntas e respostas sobre como a comissão operará.
Quais serão as atribuições da Comissão da Verdade?
A comissão terá como finalidade "examinar e
esclarecer as graves violações de direitos humanos" praticadas entre
1946 e 1988, "a fim de efetivar o direito à memória e à verdade
histórica e promover a reconciliação nacional".
Para isso, a comissão deverá analisar casos de
torturas, mortes, desaparecimentos forçados, ocultação de cadáveres,
ainda que ocorridos no exterior. Também deverá identificar e tornar
públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias
relacionados à prática de violações de direitos humanos, assim como suas
eventuais ramificações nos aparelhos estatais e na sociedade.
A comissão deverá ainda encaminhar aos órgãos
públicos competentes todas as informações que possam auxiliar na
localização e identificação de corpos e restos mortais dos 140
desaparecidos políticos do período.
A Comissão terá o poder de punir ou recomendar que acusados de violações sejam punidos?
Não. Em abril de 2010, instado por ação da Ordem
dos Advogados do Brasil (OAB), o Supremo Tribunal Federal decidiu por
sete votos a dois que a Lei da Anistia, de 1979, não deveria ser
alterada para possibilitar a responsabilização penal dos indivíduos
envolvidos em crimes como a tortura
- ou como em ataques terroristas, no caso dos adeptos da luta armada.
- ou como em ataques terroristas, no caso dos adeptos da luta armada.
A decisão enterrou a possibilidade de que a Comissão da Verdade tivesse qualquer poder punitivo.
Como a comissão atuará?
Os integrantes terão acesso a todos os arquivos
do poder público sobre o período e poderão convocar vítimas ou acusados
de violações para depoimentos, ainda que convocação não tenha caráter
obrigatório.
Ao fim de dois anos, prazo de atuação do grupo, a comissão poderá publicar um relatório com seus principais achados.
O grupo não terá, todavia, a obrigação de divulgar tudo o que descobrir.
Caso elabore uma lista com nomes de torturadores, por exemplo, a comissão pode optar por encaminhá-la somente à presidente e ao ministro da Defesa.
Caso elabore uma lista com nomes de torturadores, por exemplo, a comissão pode optar por encaminhá-la somente à presidente e ao ministro da Defesa.
Quais as principais críticas à comissão?
Ativistas que defendem a investigação de crimes
cometidos durante a ditadura afirmam que, sem o poder de punir, a
comissão não colaborá para que se faça justiça.
Dizem ainda que o longo período contemplado pela
comissão impedirá uma análise aprofundada da época em que houve mais
violações, a ditadura militar.
Já alguns militares e policiais temem que o
grupo não dê o devido peso aos crimes cometidos por organizações
esquerdistas e se queixam por não terem representantes na comissão.
Eles ainda afirmam que os trabalhos podem "reabrir feridas" na sociedade brasileira.
Para alguns analistas, a comissão disporá de
prazo muito curto (dois anos) e terá poucos integrantes para concluir
seu trabalho de forma satisfatória.
O modelo já foi testado em outros países?
Sim. Segundo pesquisa de Simone Rodrigues Pinto,
professora da Universidade de Brasília, desde 1974, mais de 20
comissões semelhantes foram criadas no mundo todo. Na África do Sul, a
comissão ajudou a esclarecer violações de direitos humanos ocorridas sob
o regime do apartheid.
Também foram instaladas comissões em nações
sul-americanas como Argentina, Chile e Peru - nesses países, no entanto,
alguns militares, policiais e até ex-presidentes foram presos após os
trabalhos.