segunda-feira, 29 de novembro de 2010

A economia do tráfico. Para quem gosta de debater com números

 Desconhecimento de Causa: Economia do Tráfico
Plínio Fraga e Janaina Lage (Folha de S. Paulo, 28/11/10) apontam, baseados em estudo que dimensionou essa economia subterrânea, que “o tráfico emprega na cidade do Rio 16 mil pessoas, vende mais de cem toneladas de droga e arrecada R$ 633 milhões por ano. Ou seja, gera tantos empregos quanto a Petrobras na capital fluminense, arrecada o mesmo que o setor têxtil no Estado e vende o equivalente a cinco vezes mais do que o total de apreensão anual de cocaína pela Polícia Federal em todo o país”. Será verdade?! Quais foram as fontes de informações sobre essa atividade ilegal e, portanto, não registrada? Qual foi a metodologia do estudo?
O economista e professor do Ibmec-RJ Sérgio Ferreira Guimarães, subsecretário da Adolescência e Infância da Secretaria de Estado de Ação Social, usou pesquisas de consumo de entorpecentes, custos médios da venda de droga no varejo e no atacado calculados pela ONU e projeções de ocupação de mão de obra em favelas para fazer a “contabilidade simulada do tráfico”: faturamento de R$ 317 milhões (versão mais conservadora ) a R$ 633 milhões por ano (teto imaginado a partir dos números de que dispõe). Margem de diferença de 100%? Não é muito impreciso esse cálculo?
Esse dinheiro vem da venda de nove toneladas de cocaína, noventa toneladas de maconha e quatro toneladas de crack, em total de 103 toneladas de drogas por ano, segundo cálculos de consumo declarado em pesquisas. Caberia perguntar: qual o volume que ocuparia esse total se fosse reunido apenas em um local? Haveria capacidade de transporte e de armazenamento desse total, mesmo de maneira pulverizada, sem despertar suspeita? Qual seria a demanda, isto é, quantas pessoas cheirariam nove toneladas de cocaína, fumariam noventa toneladas de maconha e se espetariam com tamanha quantidade de droga em um ano?
O tráfico emprega na cidade no Rio de Janeiro cerca de 16 mil pessoas. O pesquisador chegou a esse número a partir de estudo da ONG Observatório de Favelas sobre a participação no tráfico de jovens residentes em comunidades e projeções da polícia. Se a população carcerária no Brasil atingiu 473.626 pessoas, em 2009, esse contingente de traficantes não parece pequeno, comparativamente? Considerando apenas a população carcerária no Estado do Rio (26.651), de fato, é número expressivo. Em São Paulo há 163.915 presos. A polícia do Rio de Janeiro parecer prender pouco, relativamente, pois o Estado, embora tenha a terceira maior população estadual, possui a quinta carcerária.
De qualquer jeito, a comparação com a Petrobrás é descabida, dando impressão equivocada. Estima-se que um quarto dos trabalhadores com carteira assinada no país trabalham para fornecedores da Petrobras.
O Complexo do Alemão é considerada a principal base logística e de venda de drogas da facção criminosa Comando Vermelho. Ele representa a principal fonte de renda do mercado de droga hoje no Rio, com faturamento anual estimado em R$ 8 milhões pela polícia.
O Estado do Rio gasta com segurança pública cinco vezes mais do que o tráfico de drogas fatura na capital. O governo estadual despendeu com segurança no ano passado R$ 4,096 bilhões. Calcula precisar de R$ 4 bilhões a mais para estender o projeto de UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora) das 13 atuais para 40 nos próximos anos. Pergunta ingênua: não sairia mais barato empregar todos os traficantes de menor escalão?
Em sua análise, Guimarães aponta que, descontando custos como “folha salarial” do tráfico e perdas de drogas e armas apreendidas, chega-se a lucro presumível entre R$ 26 milhões, em cenário conservador, e R$ 236 milhões, em cenário mais agressivo. Nove vezes mais?!
“A oferta de serviços ‘piratas’ por traficantes (gás, transporte clandestino, etc.) sugere que a lucratividade do tráfico não seja tão grande. Ajuda a explicar a ênfase dos traficantes em manter o controle territorial de certas áreas, onde o crime passa a controlar serviços que vão da eletricidade à TV a cabo”, afirma o economista. Em outra matéria, a Folha de S.Paulo informa que a Receita Federal apreendeu neste ano US$ 96 milhões (R$ 166 milhões) em mercadorias irregulares do Paraguai. A sonegação fiscal, conforme indica o aumento no número de viagens de muambeiros, de maneira agregada, não é atividade de maior retorno e com menor risco?
O estudo sugere que tornar a operação do tráfico mais cara é o caminho para a repressão policial. “A apreensão de armas afeta a demanda pela droga, por aumentar seu preço em razão do custo adicional que cria pela necessidade de reposição do arsenal do tráfico. A ação tende a facilitar a identificação de fornecedores, restringindo a oferta. O aumento do custo da operação do negócio também reduz o excedente operacional do comércio e portanto a remuneração dos que dele participam, diminuindo o estímulo da ‘carreira’ do tráfico.”
Além da ofensiva militar aos traficantes no Complexo do Alemão, com o objetivo de retomada do território, a operação contra o tráfico no Rio passou a fechar o cerco aos bens e dinheiro dos traficantes do Comando Vermelho, facção que comanda as favelas onde os criminosos estão concentrados. A Folha de S. Paulo (28/11/10) apurou que, nos últimos dez anos, os traficantes Márcio Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, e Alexander Mendes da Silva, o Polegar, acumularam fortuna de R$ 60 milhões. Será verdade?
Marcinho VP teria acumulado R$ 40 milhões. A mulher dele, Márcia Gama, acusada de lavagem de dinheiro do narcotráfico foi presa. A polícia também prendeu ontem o empresário Henrique Herman Oliveira, acusado de administrar investimento financiado pelo traficante Marcinho VP. A Polícia Civil afirma que a estratégia é cortar o braço financeiro do Comando Vermelho, tirando o dinheiro em poder das famílias dos traficantes líderes da facção.
A polícia prendeu também a mulher do Polegar, um dos chefes do tráfico na região, Viviane Sampaio, na Barra da Tijuca, zona oeste. Na casa dela, foram apreendidos cinco laptops que podem conter informações sobre o tráfico. Ela tem aos menos cinco imóveis avaliados em R$ 3 milhões e costumava fazer viagens de cruzeiro.
Também o Exército busca cercar os bens e dinheiro do tráfico nos bloqueios montados no Alemão. Os soldados prenderam um homem com US$ 50 mil e mais R$ 20 mil dentro de mochila, o que totaliza aproximadamente R$ 106 mil. O dinheiro estava sendo retirado de um dos morros do complexo. “Os militares nunca viram tanto dinheiro”, disse o coronel, mas esse varejo é muito diminuto face aos milhões dos chefões, não?
Outra notícia (FSP, 29/11/10) informa que a sangria de recursos no PanAmericano ocorria desde 2006, segundo documentos em posse do Ministério Público Estadual de Minas Gerais. Naquele ano, o empresário Adalberto Salgado Júnior aplicou R$ 3 milhões em título da instituição financeira a taxa três vezes superior às de mercado. O mesmo empresário, morador em Juiz de Fora (MG), mantinha como pessoa física R$ 400 milhões em outro papel do banco do grupo Silvio Santos, CDB (Certificado de Depósito Bancário) que lhe rendia juros de 30% ao ano. Técnicos do Banco Central suspeitam que os juros desses investimentos eram inflados artificialmente para camuflar o desvio de recursos da instituição.
No final do ano passado, a Caixa Econômica Federal comprou 35,54% do capital do banco por R$ 739,2 milhões. Em outras palavras, quando o governo se tornou sócio do apresentador de TV, fazia pelo menos três anos que suposto esquema para retirar dinheiro ilegalmente do banco estava em curso. O crime de colarinho branco rende bem mais e com menor risco, não? Mas, no final, todas essas atividades criminosas, compensam? Quero crer que não.
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