terça-feira, 29 de novembro de 2011

No Brasil, ministra diz que há juízes envolvidos em compra ilegal de terras

29.11.2011
Ministra Eliana Calmon
No Brasil, ministra diz que há juízes envolvidos em compra ilegal de terras
Por ANTONIO CARLOS LACERDA PRAVDA.RU

BRASILIA/BRASIL - Depois de balançar as inabaláveis estruturas do Poder Judiciário do Brasil ao declarar em alto e bom som que na Justiça Brasileira existe 'bandidos de toga', a ministra Eliana Calmon, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e corregedora do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), volta mais uma vez à cena para afirmar que há magistrados envolvidos em compra ilegal de terra nos Estados do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Piauí e na divisa entre Bahia e Goiás.
A corregedora Nacional de Justiça revelou que o CNJ está investigando operações suspeitas envolvendo um grupo de juízes em um esquema de a compra de terras e grilagem em áreas de grande extensão no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Piauí e divisa entre Bahia e Goiás. A trama envolve tabelionatos e cartórios de registro de imóveis, informou a corregedora. Os casos incluem cancelamento de títulos e matrículas em cartórios por ordem judicial, intervenções e ações reivindicatórias sem título adequado e concessão de liminares para imissão de posse indevida, tutela antecipada em ação por usocapião, entre outros expedientes. De acordo com a ministra, as terras têm sido usadas para o cultivo de soja.
"Estão ocorrendo, pelas informações que estamos recebendo e que chegam em razão de denúncias, grilagem de terras que não valiam nada, que eram absolutamente inservíveis, e que hoje são riquíssimas com o agronegócio, com participação de magistrados,", afirmou a ministra, ao participar da 9.ª Reunião Plenária Anual da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (Enccla), em Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul. "Isso está nos preocupando sobremaneira", afirmou.
Na avaliação de Eliana Calmon, trata-se de um esquema semelhante ao que já ocorreu no Sul do Estado do Pará. "Eram terras absolutamente sem valor econômico nenhum e, no entanto, elas começaram a ser valorizadas de repente em razão do agronegócio. O sul do Estado do Piauí está um problema sério, porque aquilo ali era terra de ninguém, abandonadas, de repente, cresceu."
Segundo a ministra, alguns casos no Estado da Bahia chamaram a atenção da Corregedoria. "Temos algumas denúncias de dois ou três magistrados investigados, que inclusive o próprio Tribunal removeu, colocou outro, e em poucos meses o outro estava no mesmo esquema, porque é muito dinheiro", afirmou. No Piauí, os casos estão sendo investigados pela corregedoria regional. "Mas eu tenho já os registros de uns três juízes que não estão afastados e estão sendo investigados", revelou.
Eliana Calmon defendeu uma mobilização direta e conjunta do Ministério da Justiça, Polícia Federal, Ministério Público e CNJ para investigar o caso. "Eu levei minha preocupação ao ministro Cesar Peluso (presidente do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça) porque eu entendo que há necessidade de uma ação conjunta e política. E nas ações políticas é o presidente do CNJ que deve atuar no sentido de nós termos um enfrentamento conjunto", afirmou. "Não adianta punir o juiz porque nós temos de pegar todo o segmento que vem praticando esse ilícito."
A corregedora Nacional de Justiça denunciou o que chamou de um "corporativismo ideológico perigosíssimo" nas corregedorias do Poder Judiciário que favorece a infiltração de "bandidos de toga".
 "O corporativismo é uma visão ideológica. Ideologicamente você parte para defender o Poder Judiciário, e você começa a não ver nada que está ao seu redor. Você não vê sequer a corrupção entrando nas portas da Justiça, porque você acha que, para defender o Judiciário, você tem que manter o magistrado imune às críticas da sociedade e da imprensa", afirmou a ministra.
A ministra disse também que "À medida que nós continuamos com o corporativismo, nós estamos favorecendo que as pessoas venham se esconder nessa grande arrumação que fizemos: 'Aqui é muito bom, eu posso fazer e estou fora do alcance da lei'."
Na avaliação de Eliana Calmon, o Poder Judiciário padece de uma ideologia de dois séculos de falta de transparência no País, em referência os primeiros tribunais portugueses. "Nada se esconde mais, um dos braços e instrumentos da corrupção é exatamente esse fechamento. Você combate a corrupção com transparência", afirmou.
"É uma cegueira causada pela ideologia. Não vêem que isso está se alastrando. Por isso eu falei dos bandidos de toga, porque é uma infiltração, uma cultura que tem sido deletéria no Poder Judiciário", enfatizou Eliana Calmon.
A ministra afirmou que essa é uma das razões pelas quais a atuação do CNJ vem sendo criticada por alguns magistrados e entidades de classe. "Num primeiro momento, houve uma grita em relação à atuação do CNJ. Essa onda passou, como se a intervenção estivesse sendo aceita, mas ela retorna em um momento em que nós começamos a fazer uma apuração disciplinar. Ondas que se repetem toda vez que o corporativismo, leia-se, ideologia, vem sendo atacado por algum órgão, mesmo que estatal", afirmou.
Eliana Calmon alertou para o risco de que a população passe a acreditar que os juízes que não punem magistrados corruptos também sejam corruptos. "Realmente isso é preocupante, porque as pessoas podem pensar que esses magistrados que defendem o corporativismo devem ser corruptos, mas não são", afirmou. "O problema é que não enxergam. Direcionam que têm de defender a magistratura e, para isso, temos de fechá-la, qualquer coisa errada tem de ser resolvida internamente. Mas o espaço público não se decide nada internamente."

ANTONIO CARLOS LACERDA é correspondente internacional do PRAVDA.RU

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