“As evidências indicam que ela foi inocente” afirma Pat Shipman, autora de “Femme Fatale: Love, Lies and the Unknown life of Mata Hari”. Mata Hari, a bailarina exótica que em 1917 foi condenada e executada por espionagem ao serviço do governo alemão, transformou-se numa eterna lenda. A aura de mistério por detrás da personagem que criou colocou-a no meio de jogos de guerra, como um peão estrategicamente movido entre inimigos. Shipman acrescenta ainda que “ela nunca poderia ser clandestina, pois atraía todas as atenções”.
A criação de “Mata Hari”
Margaretha Gertruida Zelle nasceu na Holanda em 1876. Com apenas 19 anos casou-se com um capitão, funcionário da Companhia das Índias Orientais. Após o casamento, partiram para a Indonésia, onde viveram durante sete anos. Esta nova vida encantou Margaretha que aproveitou, então, para aprender as danças que a tornaram conhecida. No entanto, era também infeliz: o marido era alcoólico e tinha um caso com a ama dos filhos. Com a morte do filho mais velho, decidem regressar à Holanda. E a súbita morte do mais novo, no caminho, leva-a a deixar o marido e ir para França.
Em Paris, Margaretha consegue trabalho como modelo para alguns artistas, e depois num circo. Naquela época, apercebendo-se do fascínio que os parisienses tinham por espectáculos alusivos à cultura oriental, decide criar “Mata Hari” (ou “Olho da Manhã”). Uma bailarina exótica e misteriosa, que actuava em trajes indianos e conquistava todos os homens da alta sociedade.
Fama e espionagem
O sucesso dos seus espectáculos levou-a até aos principais palcos da Europa, muito frequentados por aristocratas e militares. Esta fama trouxe-lhe (mais) um novo amor, pelo qual abandonou a carreira entre 1910 e 1911. Mas pouco depois, terminada essa relação, Mata Hari volta a dançar e viaja para Berlim. Colecciona uma série de amantes e, com a situação na cidade a ficar difícil, a sua vida complica-se também.
Em 1914, com a Primeira Guerra Mundial, Mata Hari, sem trabalho e sem dinheiro, tenta regressar a Paris. Só que, sem saber, a bailarina já está na mira dos militares, que a impedem de entrar. As ligações desprendidas daquela mulher levantam suspeitas nas autoridades francesas e inglesas.
Quando finalmente deixa Berlim, conhece um oficial russo por quem se apaixona. Entretanto, este é vítima de um tiro no olho que o leva a um hospital longe da capital. Mata Hari, ao procurar saber onde estava o oficial, é detida pela polícia francesa. Sob a vigilância de investigadores – desde que entrara novamente em Paris -, a bailarina era considerada uma espia inimiga, a agente H21 ao serviço do governo alemão. As autoridades exigem que “mude de lado” caso queira ver novamente o oficial. Desesperada, aceita a proposta e é enviada para Espanha com a missão de seduzir o militar alemão Hauptmann Kalle.
Pouco habilidosa na espionagem, não consegue nenhuma informação sobre os planos de guerra dos alemães. O próprio militar Kalle envia ainda um telegrama a Berlim, interceptado pelos franceses, referindo-se a Mata Hari como agente secreta. Sem explicação para tal, a bailarina é presa em Fevereiro de 1917 e condenada em Outubro por traição a França e por actuar como espia dupla.
Greta Garbo interpretando Mata Hari.
Condenação e dúvidas sobre a sua actuação
O papel de Mata Hari nas estratégias de guerra tornou-se um mito. A sua vida despertou tanta curiosidade que, em 1931, chegou ao grande ecrã interpretada por Greta Garbo. A personagem que criou em torno de si é vista como um símbolo da ousadia feminina numa época de valores demasiado conservadores. Por essa razão, as dúvidas sobre se teria realmente sido espia ou não sempre pairaram no ar. Nos anos 70, um veterano de guerra que iniciou uma investigação sobre a condenação de Mata Hari afirmou que o governo francês a sacrificou para evitar uma derrota. “Eles usaram-na como uma campanha de propaganda contra a Alemanha. Ela queria aproveitar a vida ao máximo e não percebeu que, com a guerra, tudo tinha mudado”.
No seu julgamento em 1917, não ficou provado que tivesse passado informações secretas. Sobre o telegrama que a denunciou, este veterano explicou que tudo não passou de uma vingança montada, pois o Major Kalle sabia que este seria interceptado pelos franceses. É que a bailarina recebera, em 1916, 20 mil francos do cônsul Karl Kroemer para espiar os aliados. Recebeu o dinheiro, mas nunca actuou como agente H21. Isto levou a que fosse incriminada de forma estratégica.
A escritora Pat Shipman, autora da biografia “Femme Fatale: Love, Lies and the Unknown life of Mata Hari”, afirma também a inocência da bailarina. A autora compara o seu status com o de Marilyn Monroe na década de 60 “Era reconhecida em toda a parte e vista como a mulher mais sexy e desejada da Europa”. Depois de ter analisado vários documentos que tinham permanecido secretos, descobriu que não foi espia, mas apenas um bode expiatório. A sua condenação esteve envolta em provas fabricadas e intrigas de um poderoso jogo de inimigos. Uma mulher como Mata Hari “nunca podia ser clandestina, pois atraía todas as atenções. (…) Ela foi condenada não por espionagem, mas por imoralidade e falta de vergonha” acrescenta.
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