Setúbal |
O bilionário americano Warren Buffett pediu a Obama que parasse de
mimar os ricos; no Brasil, nossos Buffetts parecem querer ser ainda mais
mimados.
Isto é o Brasil, pensei depois de ler a matéria que o Financial Times fez com o banqueiro Roberto Setúbal, 57 anos, do Itaú. (Ela passou o dia na seção Essencial.)
Setúbal se queixou.
As coisas, segundo ele, não estão funcionando. Não consegui entender o queixume. O FT registra que o Itaú lucrou mais de 6 bilhões de reais no ano passado.
O FT também nota a situação financeira das três famílias que controlam o Itaú: Setúbal, Villela e Moreira Salles. Dos 40 bilionários brasileiros listados pela Forbes, nove são de uma das três famílias do Itaú. Mais de 20% dos bilionários brasileiros têm, portanto, um vínculo com o Itaú.
O Diário tem alma escandinava, como tem sido dito aqui. O Diário aprecia, assim, o capitalismo com responsabilidade social, tal como praticado na Escandinávia. Isso se traduz em sociedades libertárias, em que “não existem extremos de riqueza e nem de miséria”, para usar a grande divisa de Rousseau. E em gente feliz: todas as listas de felicidade no mundo são lideradas pelos países escandinavos: Dinamarca, Suécia, Finlândia, Noruega e Islândia.
Na Escandinávia, lamentos como o de Roberto Setúbal causariam estranheza. Como alguém com tamanho acúmulo de privilégios pode reclamar assim? Sequer erguer o Itaú é obra dele: Setúbal, como a maioria dos grandes empresários nacionais, herdou o negócio do pai, Olavo. Meritocracia, se a havia, estava ali, com o velho Olavo.
Seu imenso patrimônio pessoal mostra que a herança foi taxada em termos nada escandinavos.
E mesmo assim ele está queixoso.
No mundo inteiro, há um clamor em relação aos impostos (baixíssimos) pagos por grandes corporações mediante malabarismos fiscais classificados na Inglaterra como “imorais”, ainda que legais.
Recentemente, consumidores ingleses iniciaram boicotes contra a Starbucks depois que foi divulgada a informação de que, desde que se instalou no Reino Unido, a empresa praticamente não pagou nada de impostos.
Foram publicados, entre os britânicos, os impostos pagos por outras multinacionais, como Google e Amazon. Baixíssimos, graças a expedientes como declarar o faturamento em paraísos fiscais.
Em Davos, o premiê inglês David Cameron – um conservador absolutamente pró-negócios — disse que a prioridade dos governos, em 2013, deve ser o cerco a manobras de evasão de impostos. (Algum dos enviados da mídia tradicional escreveu isso? Medalhões como Merval e Rossi foram a Davos. Contaram isso? Não os li, mas apostaria que não.)
Escritórios de advocacia especializados em trambiques legais foram nomeados, na Inglaterra, para constrangê-los, e impedidos de realizar qualquer negócio com o governo.
Esta é a floresta.
Na árvore brasileira, o que está se fazendo? O Itaú, de Setúbal: quanto pagou de impostos sobre o lucro? Na Escandinávia seria algo na faixa dos 50%, uns 3 bilhões de reais. E no Brasil, alguém sabe?
É estranho o Brasil. Poucas coisas envolvem tanto o interesse público quanto os impostos, sobretudo os dos superricos e os das grandes corporações. E em poucas coisas há uma ausência tão completa de transparência quanto nisso.
Você constrói hospitais, escolas, estradas, portos como esse dinheiro.
Alguns meses atrás, a seção Radar, da Veja, publicou uma disputa judicial entre a Receita e a Globo na casa de mais de 2 bilhões de reais.
Se isso não é notícia, o que é? Mas nada. Nem a mídia foi verificar o que era, exatamente, e nem a Receita trouxe informações aos brasileiros.
Não há muito tempo, Warren Buffett, o bilionário americano, disse (em vão) a Obama que o governo deveria parar de “mimar” ricos como ele. Buffett notou que, proporcionalmente, sua secretária pagava mais imposto do que ele.
Sucessivas administrações brasileiras mimaram demais nossos equivalentes a Buffett, com enorme prejuízo do resto da população. Dessa aberração derivou uma das sociedades mais vexatoriamente desiguais do mundo.
Os lamentos de Setúbal sugerem que os nossos Buffetts clamam não pelo fim dos mimos – mas por sua eternização.
Isto é o Brasil, pensei depois de ler a matéria que o Financial Times fez com o banqueiro Roberto Setúbal, 57 anos, do Itaú. (Ela passou o dia na seção Essencial.)
Setúbal se queixou.
As coisas, segundo ele, não estão funcionando. Não consegui entender o queixume. O FT registra que o Itaú lucrou mais de 6 bilhões de reais no ano passado.
O FT também nota a situação financeira das três famílias que controlam o Itaú: Setúbal, Villela e Moreira Salles. Dos 40 bilionários brasileiros listados pela Forbes, nove são de uma das três famílias do Itaú. Mais de 20% dos bilionários brasileiros têm, portanto, um vínculo com o Itaú.
O Diário tem alma escandinava, como tem sido dito aqui. O Diário aprecia, assim, o capitalismo com responsabilidade social, tal como praticado na Escandinávia. Isso se traduz em sociedades libertárias, em que “não existem extremos de riqueza e nem de miséria”, para usar a grande divisa de Rousseau. E em gente feliz: todas as listas de felicidade no mundo são lideradas pelos países escandinavos: Dinamarca, Suécia, Finlândia, Noruega e Islândia.
Na Escandinávia, lamentos como o de Roberto Setúbal causariam estranheza. Como alguém com tamanho acúmulo de privilégios pode reclamar assim? Sequer erguer o Itaú é obra dele: Setúbal, como a maioria dos grandes empresários nacionais, herdou o negócio do pai, Olavo. Meritocracia, se a havia, estava ali, com o velho Olavo.
Seu imenso patrimônio pessoal mostra que a herança foi taxada em termos nada escandinavos.
E mesmo assim ele está queixoso.
No mundo inteiro, há um clamor em relação aos impostos (baixíssimos) pagos por grandes corporações mediante malabarismos fiscais classificados na Inglaterra como “imorais”, ainda que legais.
Recentemente, consumidores ingleses iniciaram boicotes contra a Starbucks depois que foi divulgada a informação de que, desde que se instalou no Reino Unido, a empresa praticamente não pagou nada de impostos.
Foram publicados, entre os britânicos, os impostos pagos por outras multinacionais, como Google e Amazon. Baixíssimos, graças a expedientes como declarar o faturamento em paraísos fiscais.
Em Davos, o premiê inglês David Cameron – um conservador absolutamente pró-negócios — disse que a prioridade dos governos, em 2013, deve ser o cerco a manobras de evasão de impostos. (Algum dos enviados da mídia tradicional escreveu isso? Medalhões como Merval e Rossi foram a Davos. Contaram isso? Não os li, mas apostaria que não.)
Escritórios de advocacia especializados em trambiques legais foram nomeados, na Inglaterra, para constrangê-los, e impedidos de realizar qualquer negócio com o governo.
Esta é a floresta.
Na árvore brasileira, o que está se fazendo? O Itaú, de Setúbal: quanto pagou de impostos sobre o lucro? Na Escandinávia seria algo na faixa dos 50%, uns 3 bilhões de reais. E no Brasil, alguém sabe?
É estranho o Brasil. Poucas coisas envolvem tanto o interesse público quanto os impostos, sobretudo os dos superricos e os das grandes corporações. E em poucas coisas há uma ausência tão completa de transparência quanto nisso.
Você constrói hospitais, escolas, estradas, portos como esse dinheiro.
Alguns meses atrás, a seção Radar, da Veja, publicou uma disputa judicial entre a Receita e a Globo na casa de mais de 2 bilhões de reais.
Se isso não é notícia, o que é? Mas nada. Nem a mídia foi verificar o que era, exatamente, e nem a Receita trouxe informações aos brasileiros.
Não há muito tempo, Warren Buffett, o bilionário americano, disse (em vão) a Obama que o governo deveria parar de “mimar” ricos como ele. Buffett notou que, proporcionalmente, sua secretária pagava mais imposto do que ele.
Sucessivas administrações brasileiras mimaram demais nossos equivalentes a Buffett, com enorme prejuízo do resto da população. Dessa aberração derivou uma das sociedades mais vexatoriamente desiguais do mundo.
Os lamentos de Setúbal sugerem que os nossos Buffetts clamam não pelo fim dos mimos – mas por sua eternização.
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