quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Desdobramentos políticos e institucionais do julgamento do mensalão




Antônio de Queiroz, em Congresso em Foco

“Se o julgamento produzir mudanças legais e comportamentais que contribuam para o aperfeiçoamento do sistema político e das instituições brasileiras, já terá cumprido um papel fundamental para o país”
A grande pergunta que se faz hoje é quais serão os desdobramentos políticos e institucionais do julgamento do chamado “mensalão”, em face da expectativa criada pela imprensa de condenação pesada para os denunciados naquele escândalo.
É preciso registrar, antes de qualquer coisa, que a divulgação da existência do “mensalão” já produziu resultados, entre os quais a cassação dos deputados Roberto Jefferson (PTB) e José Dirceu (PT), em 2005, a realização do segundo turno entre Lula e Alckmin, assim como a redução da bancada do PT na eleição de 2006.
Os reflexos do julgamento sobre a eleição municipal de 2012, considerando que o tema já foi muito explorado em três eleições anteriores (geral de 2006, municipal de 2008 e geral de 2010), tende a ser menor do que se imagina.
Os eleitores, especialmente no pleito municipal, estarão mais preocupados com os problemas locais. Mesmo nos grandes centros urbanos mais politizados, este episódio será pouco considerado no momento do voto, refletindo residualmente no desempenho eleitoral dos partidos, inclusive do PT.
Na disputa por voto, os partidos que não tiveram integrantes denunciados nesse episódio irão explorar o escândalo, buscando tirar proveito durante a campanha, mas a tendência é que a Justiça Eleitoral fique atenta a isto e puna quem utilizar seu horário para se referir ao mensalão.
Vários dos crimes apontados na denúncia já prescreveram, ou seja, mesmo que a sentença condene os réus, eles não poderão ser punidos (presos) em função desses crimes já prescritos. A punição (civil ou penal) poderá se concretizar, no entanto, por outros crimes ainda não prescritos.
Assim, o que se pode esperar como desdobramento do julgamento, especialmente em função da pressão da opinião pública, são aperfeiçoamentos na legislação e nos mecanismos de controle que impeçam a repetição de situações como essas no futuro.
Nesse diapasão, certamente o Poder Executivo ampliará o escopo de atuação – com mais estrutura e pessoal – do sistema brasileiro de prevenção e combate aos crimes financeiros, com fortalecimento das unidades de inteligência dos órgãos envolvidos, dentro dos parâmetros da recente lei sancionada sobre lavagem de dinheiro.
O resultado do julgamento também poderá impulsionar a votação dos vários projetos que aceleram a prestação jurisdicional, com mudanças nos códigos de processos, para, entre outras medidas, reduzir drasticamente os recursos de natureza protelatórios, que levam à prescrição dos crimes praticados.
Poderá contribuir, ainda, para que o Congresso conclua a votação de dois projetos importantes para a higienização da política e da administração pública: o projeto que trata do conflito de interesse (PLC nº 26/2012, no Senado), com quarentena e pena pesada para servidor que utilizar de modo indevido o cargo público, bem como o que responsabiliza a pessoa jurídica por atos irregulares (PL 6.826/2010, na Câmara), determinando que, além do corrupto, haja punição também para o corruptor.
E, por fim, poderá jogar luzes sobre o debate relativo ao financiamento de campanhas eleitorais, que representa a origem de tudo isto. Seja adotando o financiamento exclusivamente público, que seria a solução mais drástica, seja eliminando o financiamento de pessoa jurídica, com a permissão de doação apenas de pessoas físicas e, ainda assim, limitada a determinado valor.
Se o julgamento desse episódio produzir mudanças legais e comportamentais que contribuam para o aperfeiçoamento do sistema político e das instituições brasileiras, já terá cumprido um papel fundamental para o país, com reflexos sobre a melhoria ética da representação política.

* Jornalista, analista político, diretor de documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), colunista da revista Teoria e Debate, idealizador e coordenador da publicação Cabeças do Congresso. É autor dos livros Por dentro do processo decisório – como se fazem as leis e Por dentro do governo – como funciona a máquina publica.

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