O país está prestes a leiloar cerca de metade de suas reservas de petróleo, mas nem parece que negócio de tamanho vulto está para acontecer. Muito pouco tem sido dito a respeito do assunto, num vício que vem desde a origem, quando o governo Lula impôs goela abaixo um novo modelo para exploração de petróleo no Brasil.
O leilão de Libra é o primeiro dentro do sistema de partilha, pelo qual o consórcio que vencer a disputa entregará à União pelo menos 41,65% do chamado “lucro-óleo” que extrair, ou seja, o volume produzido depois de descontados todos os gastos com as atividades exploratórias. Vence a disputa, que acontece na próxima segunda-feira no Rio, quem se dispuser a entregar percentual maior da produção.
Tudo em torno de Libra é gigantesco. Sua área é de 1.548 km² (o equivalente à do município de São Paulo), localizada na Bacia de Santos, no litoral do Rio de Janeiro, a uma distância que varia entre 166 km e 270 km da costa fluminense. As reservas situam-se em águas profundas, a cerca de 7 mil metros abaixo da superfície.
O mais espantoso, porém, é seu potencial de produção e os valores envolvidos. Estima-se que Libra contenha entre 8 bilhões e 12 bilhões de barris de petróleo. Se confirmado o limite superior, significa dizer que lá está o equivalente a quase todas as atuais reservas provadas de petróleo no Brasil – são 15,3 bilhões de barris, segundo os dados mais recentes da ANP.
O vencedor do leilão terá de pagar R$ 15 bilhões a título de bônus de assinatura. Deste valor, pelo menos 30% terão de vir da Petrobras, uma vez que a estatal foi definida, no novo modelo, como operadora única e sócia obrigatória dos consórcios nesta proporção.
Retirar, no mínimo, R$ 4,5 bilhões dos cofres da maior companhia do país neste momento será uma sobrecarga e tanto, diante das imensas dificuldades que a Petrobras vem enfrentando para levar adiante seu plano de investimentos e aumentar sua produção – sem a qual o Brasil mantém-se dependente da importação de derivados.
Toda esta enormidade que Libra representa será ofertada de uma só vez, num único leilão, numa única manhã. Onze empresas se inscreveram para a disputa, mas estão se rearranjando em torno de consórcios para dar os lances. Há séria ameaça de que, desta dança frenética, acabe sobrando apenas um competidor – o risco é tanto que a presidente Dilma Rousseff desistiu de ir ao leilão, por temer um desfecho decepcionante.
“A presidente precisa se preservar porque, apesar de as expectativas serem positivas, não há certeza sobre quantos consórcios vão disputar o campo de Libra, na bacia de Campos. O governo cita no mínimo dois e no máximo quatro. Contudo, teme-se que só um apresente proposta no dia”, informou a Folha de S.Paulo anteontem.
Como as grandes petrolíferas mundiais preferiram não entrar no leilão – temendo riscos associados às novidades regulatórias brasileiras, que também incluem a subordinação de todo o negócio a uma nova estatal que ninguém sabe como funcionará, a PPSA – mais provável ainda é que a gigantesca reserva de Libra acabe em mãos de estatais estrangeiras, possivelmente chinesas.
Neste caso, o problema é elas usarem o campo não para produzir petróleo e gerar riqueza imediata, como o país necessita para alavancar seu desenvolvimento, mas sim manterem-no como reserva estratégica para suprimento futuro. Assim, Libra acabaria servindo para alimentar o crescimento de outras nações e não o do Brasil.
Mais um aspecto a considerar é o imediatismo que cercou a definição dos valores a serem pagos e, até como forma de engordá-los, a própria decisão de leiloar todo o gigantesco campo de uma só vez, defendida arduamente pela equipe econômica de Dilma. Os R$ 15 bilhões a serem arrecadados são essenciais para que o governo consiga fechar sua contabilidade, evitando um fiasco fiscal maior neste ano. É o curto prazo interferindo indesejadamente numa riqueza de longo prazo.
Tudo considerado, é espantoso que o país esteja prestes a ver este imenso poço de geração de riquezas ser alienado quase que na bacia das almas. É inconcebível que Libra vá a leilão envolta em tamanho improviso, discricionariedade e amadorismo. É risco demais para um patrimônio que é de todos os brasileiros e a eles, só a eles, deveria servir.
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