Artista deu depoimento sobre sua trajetória na última sexta-feira, 27, no Museu da Imagem e Som em São Paulo
Roberta Pennafort, O Estado de S. Paulo
RIO - Os 70 anos de Paulinho da Viola começaram a ser comemorados no
carnaval, com o primeiro desfile do bloco-tributo Timoneiros da Viola.
Seguem até novembro, mês em que ele nasceu (dia 12) e no qual cantará no
Carnegie Hall (dia 28), em Nova York (no site da casa, os ingressos já
estão pela metade).
Na sexta-feira, sua vida familiar, a carreira, dos momentos iniciais
em que fazer música "era só festa" à profissionalização, as influências,
pontos altos e baixos de sua trajetória foram rememorado pelo próprio,
com o auxílio de amigos, no depoimento à posteridade dado ao Museu da
Imagem e do Som - instituição que recolhe relatos de grandes artistas
brasileiros desde 1966.
Foram seis horas de papo, do qual participaram cinco entrevistadores:
os parceiros Elton Medeiros (Onde a Dor Não Tem Razão, Ame, Pra Fugir
da Saudade) e Hermínio Bello de Carvalho (Timoneiro, Sei Lá, Mangueira),
Sérgio Cabral (jornalista a quem Paulo César Baptista de Faria deve o
apelido, emprestado do sambista Mano Décio da Viola), o também
jornalista Ruy Fabiano, um dos irmãos de sua mulher, Lila Rabello, e a
presidente do MIS, Rosa Maria Araujo.
A procura por senhas para o pequeno auditório, onde couberam cerca de
70 pessoas, foi a maior nos últimos seis anos de depoimentos. O público
- fãs felizes por estarem tão perto dele e uns poucos artistas, como
Monarco e Teresa Cristina - se surpreendeu com o lado contador de
histórias de Paulinho, conhecido somente pelos chegados.
A timidez estava lá, a modéstia, mas ele se soltou ao recordar
peripécias da infância ("fui o único menino da rua a ser pego pela
radiopatrulha, o maior vexame da minha vida"), e até mesmo o motivo que o
fez, em 1977, romper com a Portela, o que sempre preferiu não comentar:
tudo se deveu a uma escolha de samba-enredo no esquema "cartas
marcadas", seguida de declarações grosseiras por parte da escola, na
linha "não precisamos dele".
Paulinho falou da relação com o violão, desde os 12 anos, do papel da
batida de João Gilberto, à qual, como toda a sua geração, não ficou
imune, dos festivais dos anos 60, do perfeccionismo extremo ("já deixei
de cantar uma música por causa de um acorde"), da dificuldade, até hoje,
para escrever letra para melodia já pronta ("para o Eduardo Gudin,
demorei dez anos para entregar; para o Francis Hime, cinco. Até bilhete é
difícil...")
"Dá nervoso uma plateia pequena. Com plateia grande parece que não
tem ninguém", confessou de cara. Sobre o ofício, disse que não sente
falta se fica sem tocar ou cantar, tampouco compor. "Houve períodos em
que pegava no violão todos os dias. Não faço mais isso." Deixou claro o
peso dos 70 - "o médico disse que preciso fazer musculação para a idade;
acho um horror!"
Hermínio estava ali para lembrar o fato que mudaria de vez o destino
do bancário Paulo César: ele levou o jovem de Botafogo ao Zicartola, à
convivência próxima com Zé Kéti, que o estimulou a compor mais e mais.
A noção de que viveria daquilo viria só com o sucesso incrível de Foi
Um Rio Que Passou em Minha Vida, em 1970. "Não era tão conhecido e
estava na Cinelândia num dia de carnaval quando veio um bloco de
milhares de pessoas cantando a música. E eu doido para alguém dizer:
‘Olha ali o compositor!’"
O esperado CD de inéditas (não lança um desde 1997) não deve sair
este ano; falta disposição para compor. Mas ele tem dois discos ao vivo
gravados no Teatro Fecap em 2006 e em 2010 - só falta uma gravadora
lançar.
"Gosto de recordar, é uma maneira de sentir", disse, ao fim. Paulinho
e Ruy Fabiano negociam com a Cosac Naify uma biografia que conte isso
tudo em mais detalhes.
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