Eis um caso inaceitável de infração de ética de mão dupla.
Um asterisco aparece no nome da jornalista do Globo que escreve textos sobre Joaquim Barbosa em falas na Costa Rica.
Vou ver o que é o asterisco.
E dou numa infração ética que jamais poderia acontecer no Brasil de 2013.
A repórter viaja a convite do Supremo.
É um dado que mostra várias coisas ao mesmo tempo.
Primeiro, a ausência de noção de ética do Supremo e do Globo.
Viagens pagas já faz tempo, no ambiente editorial mundial e mesmo
brasileiro, são consensualmente julgadas inaceitáveis eticamente.
Por razões óbvias: o conteúdo é viciado por natureza. As contas do
jornalista estão sendo bancadas pela pessoa ou organização que é central
nas reportagens.
Na Abril, onde me formei, viagens pagas há mais de vinte anos são proibidas pelo código de ética da empresa.
Quando fui para a Editora Globo, em 2006, não havia código de ética lá. Tentei montar um, mas não tive nem apoio e nem tempo.
Tive um problema sério, na Globo, em torno de uma viagem paga que um editor aceitou.
Era uma boca-livre promovida por João Dória, e o editor voltou dela
repleto de brindes caros, outro foco pernicioso de corrupção nas
redações.
Fiquei absolutamente indignado quando soube, e isso me motivou a fazer de imediato um código de ética na editora.
Surgiu um conflito do qual resultaria minha saída. Dias depois de meu
desligamento, o editor voltou a fazer outra viagem bancada por Dória, e
desta vez internacional.
Bem, na companhia do editor foi o diretor geral da editora, Fred
Kachar, um dos maiores frequentadores de boca livre do circuito da mídia
brasileira.
Isto é Globo.
De volta à viagem de Costa Rica.
Quando ficou claro que viagens pagas não podiam ser aceitas eticamente, foi a Folha que trouxe uma gambiarra ridícula.
A Folha passou a adotar o expediente que se viu agora no Globo:
avisar que estava precaricando, como se isso resolvesse o caso da
prevaricação.
A transparência, nesta situação, apenas amplia a indecência.
A Globo sabe disso. Mas quando se trata de dinheiro seus limites morais são indescritivelmente frouxos.
Durante muito tempo, as empresas jornalísticas justificaram este
pecado com a alegação de que não tinham dinheiro suficiente para bancar
viagens.
Quem acredita nisso acredita em tudo, como disse Wellington. Veja o
patrimônio pessoal dos donos da Globo, caso tenha alguma dúvida.
É ganância e despudor misturados – e o sentimento cínico de que o leitor brasileiro não repara em nada a engole tudo.
Então a Globo sabe que não deveria fazer o que fez.
E o Supremo, não tem noção disso?
É o dinheiro público torrado numa cobertura jornalística que será
torta moralmente, é uma relação promíscua – mídia e judiciário –
alimentada na sombra.
Para usar a teoria do domínio dos fatos, minha presunção é que o
Supremo não imaginava que viesse à luz, num asterisco, a informação de
que dinheiro do contribuinte estava sendo usado para bancar a viagem da
jornalista do Globo.
Como dizia meu professor de jornalismo nas madrugadas de fechamento
de revista, quando um texto capital chegava a ele e tinha que ser
reescrito contra o relógio da gráfica, a quem apelar?
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