publicada domingo, 21/04/2013 às 21:29 e atualizada domingo, 21/04/2013 às 21:29
por Janio de Freitas, na “Folha”
Graças ao pudor tardio de Xuxa, comprovam-se em definitivo, e de uma
só vez, duas esclarecedoras faltas de fundamento. Uma, a do advogado
Sergio Bermudes, ao asseverar que seu “amigo de 40 anos” Luiz Fux
“sempre se julga impedido” de atuar em causas suas. Outra, a do hoje
ministro, ao alegar que só por erro burocrático no Supremo Tribunal
Federal deu voto em causa do amigo.
Há pelo menos 26 anos, no entanto, quando Luiz Fux era um jovem juiz
de primeira instância e Sergio Bermudes arremetia na sua ascensão como
advogado, os dois têm participação na mesma causa. Documentada. Tinham,
conforme a contagem referida por Bermudes, 14 anos de amizade, iniciada
“quando foi orientador” [de trabalho acadêmico] de Fux.
O caso em questão deu entrada na 9ª Vara Cível do Rio em 24 de
fevereiro de 1987. Levava as assinaturas de Sergio Bermudes e Ivan
Ferreira, como advogados de uma certa Maria da Graça Meneghel, de
profissão “atriz-manequim”. Já era a Xuxa “rainha dos baixinhos”. E por
isso mesmo é que queria impedir judicialmente a comercialização, pela
empresa CIC Vídeo Ltda., do videocassete de “Amor, Estranho Amor”, filme
de 1983 dirigido por Walter Hugo Khoury.
A justificativa para o pedido de apreensão era que o vídeo “abala a
imagem da atriz [imagem "de meiguice e graciosidade"] perante as
crianças”, o público infantil do Xou da Xuxa, “recordista de audiência
em todo o Brasil”. Não seria para menos. No filme, Xuxa não apenas
aparecia nua, personagem de transações de prostituição e de cenas
adequadas a tal papel. Mas a “rainha dos baixinhos” partia até para a
sedução sexual de um menino.
Em 24 horas, ou menos, ou seja, em 25 de fevereiro, o juiz da 9ª Vara
Cível, Luiz Fux, deferia a liminar de busca e apreensão. Com o duvidoso
verniz de 11 palavras do latim e dispensa de perícia, para cumprimento
imediato da decisão.
Ninguém imaginaria os pais comprando o vídeo de “Amor, Estranho Amor”
para mostrar aos filhos o que eles não conheciam da Xuxa. E nem risco
de engano, na compra ou no aluguel, poderia haver. Xuxa estava já na
caixa do vídeo, à mostra com os seus verdadeiros atributos.
A vitória fácil na primeira iniciativa judicial levou à segunda:
indenização por danos. Outra vez o advogado Sergio Bermudes assina
vários atos. E Luiz Fux faz o mesmo, ainda como juiz da 9ª Vara Cível.
No dia 18 de maio de 1991, os jornais noticiam: “O juiz Luiz Fux, 38,
condenou as empresas Cinearte e CIC Vídeos a indenizar a apresentadora
Xuxa por ‘danos consistentes a que faria jus se tivesse consentido na
reprodução de sua imagem em vídeo’”. Mas o que aumentou o destaque da
notícia foi a consequência daquele “se” do juiz, assim exposta nos
títulos idênticos da Folha e do Jornal do Brasil “Xuxa vence na Justiça e poderá receber U$ 2 mi de indenização”. Mi de milhões.
Ao que O Globo fez este acréscimo: “Durante as duas
horas em que permaneceu na sala do juiz, Xuxa prestou um longo
depoimento e deu detalhes de sua vida íntima [por certo, os menos
íntimos], na presença da imprensa [e de sua parceira à época, e por
longo tempo, Marlene Matos]. Sua declaração admitindo que até hoje
pratica topless quando vai à praia, por exemplo, foi uma das
considerações que o juiz Luiz Fux levou em conta para julgar
improcedente o seu requerimento de perdas morais. Todas as penas
aplicadas se referem a danos materiais”.
Na última quarta-feira, O Estado de S. Paulo,
com o repórter Eduardo Bresciani, publicou que Luiz Fux, “ignorando
documento de sua própria autoria em que afirma estar impedido de julgar
processos do escritório do advogado Sergio Bermudes”, relatou no STF
“três casos” e participou de outros “três de interesse do grupo”
[escritório Sergio Bermudes] em 2011.
Luiz Fux disse, a respeito, que caberia à Secretaria Judiciária
alertá-lo sobre o impedimento e que a relação dos processos com o
escritório de Bermudes lhe passara “despercebida”. Depois foi mencionada
falha de informática.
Sergio Bermudes argumenta que a legislação, exceto se envolvida a
filha Marianna Fux, não obrigava o ministro a se afastar dos processos
de seu escritório. E a ética, e a moralidade judiciária?
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