Empresa de família de deputado federal entra na "lista suja" da escravidão
Complexo Agroindustrial Pindobas,
empresa pertencente à família do deputado Camilo Cola (PMDB-ES), está
entre as 56 novas inclusões no cadastro. Empresário é fundador do grupo
Itapemirim
Por Anali Dupré, Daniel Santini, Guilherme Zocchio e Stefano Wrobleski
O Complexo Agroindustrial Pindobas, que pertence à família do
deputado federal Camilo Cola (PMDB-ES), está entre as 56 empresas e
pessoas físicas incluídas na última atualização do cadastro de
empregadores flagrados explorando pessoas em situação análoga à de
escravos, divulgada na última sexta-feira, 28. Conhecida como "lista suja" do trabalho escravo,
a relação é mantida pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e pela
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH/PR) e
tida como uma das mais importantes ferramentas na luta pela erradicação
da escravidão contemporânea no Brasil.
Deputado Camilo Cola na Câmara dos Deputados em março de 2011. Foto: Rodolfo Stuckert/Agência Câmara |
A empresa da família Cola entra na atualização por conta de fiscalização realizada em 2011, quando foram encontrados 22 empregados do grupo em situação análoga à de escravo.
Suplente da coligação PT-PSB-PMDB no Espírito Santo, o deputado assumiu
a vaga de Audifax Barcelos (PSB-ES) de 6 de julho a 3 de novembro deste
ano. Fundador do grupo Itapemirim, ele é um dos empresários mais
poderosos do Espírito Santo e em 2010 declarou à Justiça Eleitoral crédito de R$ 1,1 milhão com o Complexo Agroindustrial Pindobas. A empresa é uma das propriedades disputadas por seus futuros herdeiros - conforme detalhado no livro Partido da Terra, do jornalista Alceu Luís Castilho. Nem o deputado, nem representantes da empresa foram encontrados para comentar a inclusão.
A
lista serve como parâmetro para bancos na avaliação de empréstimos e
financiamentos e para empresas na contratação de fornecedores. As
signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo,
acordo que reúne alguns dos principais grupos econômicos do país,
comprometem-se a não realizar transações econômicas com os que têm o
nome na relação. Não é a primeira vez que políticos e suas empresas
entram na lista.
"Banheiro" na fazenda de José Essado Neto. Foto: Divulgação/MTE |
Assim
como nas últimas atualizações, foram incluídos parlamentares, além de
representantes de sindicatos patronais e de grupos empresariais. Além do
deputado Camilo Cola, outro caso emblemático é de José Essado Neto,
atual segundo suplente do PMDB para deputado estadual em Goiás. Trata-se
de figura pública bastante influente com tradição na política local.
Ele foi prefeito de Inhumas (GO) de 1983 a 1989 e de 2001 a 2004, cidade
em que o estádio municipal leva seu nome, e deputado estadual de 1990 a
1994 e de 1994 a 1998. Ocupou também, até julho de 2012, o cargo de
secretário extraordinário da prefeitura de Goiânia (GO). O empresário,
que nas eleições de 2010, declarou R$ 4,3 milhões de bens à Justiça
Eleitoral, foi incluído por manter trabalhadores em condições
degradantes na produção de tomates.
Antes de serem incluídos, todos têm chance de se defender em um processo administrativo. Além das inclusões, também foram divulgadas as exclusões. São empregadores que permaneceram por dois anos na relação, quitando débitos trabalhistas e cumprindo todas obrigações previstas na portaria interministerial que criou a lista.
Antes de serem incluídos, todos têm chance de se defender em um processo administrativo. Além das inclusões, também foram divulgadas as exclusões. São empregadores que permaneceram por dois anos na relação, quitando débitos trabalhistas e cumprindo todas obrigações previstas na portaria interministerial que criou a lista.
Pecuária e setores empresariaisOs
pecuaristas José Pereira Barroso, o Barrosinho, e Liro Antônio Ost,
políticos com influência municipal, também foram incluídos. O primeiro
foi eleito suplente de vereador pelo PMDB em Guajará-Mirim (RO) e o
segundo foi vereador em Cacaulândia (RO) pelo PSDB de 1993 a 1996. A
atualização da lista foi marcada pela grande quantidade de pecuaristas flagrados explorando escravos, especialmente na Amazônia.
Entre
os pecuaristas desta atualização também está José de Paula Leão Júnior,
inserido por flagrante de exploração de 28 pessoas em condições
análogas à de escravo na Fazenda Santa Luzia, no município de Araguaçu
(TO), em 2009. O fazendeiro, que tem acordo de comodato com a Comapi
—empresa do grupo Bertin, um dos maiores frigoríficos do país — é um dos que estão na lista de proprietários com áreas embargadas pelo Ibama. Mesmo com tantos problemas, ele recebeu da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg) comenda na categoria "pecuária de corte" em dezembro de 2011,
por cumprir preceitos de segurança e saúde do trabalhador, em evento
que contou com a presença do ministro dos Esportes Aldo Rebelo.
Escravocratas em Brasília
A
presença de um ministro em evento em que um pecuarista flagrado com
trabalho escravo recebeu homenagem está longe de ser caso isolado.
Muitos dos que estão na lista têm relações diretas com o poder. A
Cooperativa Agroindustrial do Estado do Rio de Janeiro (Coagro), empresa
que também entra nesta atualização, foi agraciada recentemente com o
selo de “Empresa Compromissada” concedido pela Comissão Nacional de
Diálogo e Avaliação do Compromisso Nacional para Aperfeiçoar as
Condições de Trabalho na Cana-de-Açúcar.
Frederico
Paes, presidente do grupo, recebeu um certificado da presidenta da
República Dilma Rousseff (PT) e do presidente do Senado José Sarney
(PMDB-AP) em meados deste ano. A Coagro entra na relação devido a
flagrante de 2009, quando fiscais encontraram 38 escravos empregados
pelo grupo. É justamente por conta de problemas trabalhistas e outras
irregularidades que o MPT tem defendido o cancelamento do "selo social" da cana.
Outro
caso é o do empresário do ramo de erva-mate Obiratan Carlos Bortolon,
inserido nesta atualização por ter sido flagrado escravizando índios da etnia Kaingang em 2009.
Bortolon foi recebido em 2011 pela senadora Ana Amélia (PP-RS). Ao lado
de outros empresários do setor ele solicitou à senadora reduções de
impostos, em encontro noticiado na página da senadora.
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Mato Grosso.
Trabalhador dormia dentro do forno de
carvão na Fazenda Araponga. Foto: MTE |
Na fiscalização foram encontrados trabalhadores dormindo dentro dos fornos de produção de carvão. O auditor-fiscal Roberto Mendes, que coordenou a inspeção trabalhista resultante na inclusão de Ademir Furuya na lista suja, chamou a atenção para a gravidade das condições a que os trabalhadores estavam submetidos. "É, sem dúvida, a pior situação que eu já encontrei em vários anos de trabalho atuando nesse tipo de ação de combate ao trabalho escravo".
Em: Repórter Brasil
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