Enviado por luisnassif, qua, 26/09/2012 - 21:00
Lewandowski condena delator do ‘mensalão’
Na sessão mais tensa do
Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do chamado “mensalão”, o
ministro revisor Ricardo Lewandowski votou nesta quarta-feira 26 pela
condenação dos ex-deputados Roberto Jefferson (PTB), delator do
escândalo, José Borba (PMDB) e Romeu Queiroz (PTB) por corrupção
passiva, absolvendo-os do crime de lavagem de dinheiro. O magistrado
considerou não haver provas sobre a culpa de Emerson Palmieri,
integrante da Executiva nacional do PTB, em todas as acusações,
despertando uma série de conflitos com o relator do caso, Joaquim
Barbosa.
Barbosa se disse afrontado
pela afirmação do revisor de que não estava confiante sobre a culpa de
Palmieri, demonstrada, segundo ele, em seu voto. “Nós, como ministros do
STF, não podemos fazer vista grossa das situações”, disse. Os termos
usados por Barbosa incomodaram os demais ministros. Lewandowski chegou a
sugerir que o relator peça ao colegiado a retirada da figura do revisor
das ações penais. O ministro Marco Aurélio saiu em defesa do revisor
dizendo que ninguém faz vista grossa no STF. “Cuidado com suas palavras.
Vamos respeitar os colegas. Agressividade não tem lugar nesse
plenário”, disse. E pediu que o colega escolhesse bem suas afirmações.
“Sou responsável pelas minhas palavras”, retrucou.
Barbosa considerou
“heterodoxo” Lewandowski “ficar medindo tamanho do voto do relator para
replicar do mesmo tamanho”, o que também indignou o revisor. Por fim,
pediu que o colega distribua seus votos por escrito para que ele possa
rebatê-lo quando necessário. Barbosa já havia feito o pedido mais cedo,
alegando que a recusa em distribuir o voto prejudica a transparência do
julgamento. O comentário provocou nova reação de Lewandowski: “Não será
Vossa Excelência que dirá o que eu tenho o que fazer. Cumprirei meu
dever. Por favor, não me dê conselho. Eu não divirjo pelo simples prazer
de divergir”.
Jefferson condenado
Segundo o ministro revisor,
ficou comprovado o acordo para o repasse de 20 milhões de reais do PT ao
PTB para que o partido supostamente financiasse campanhas municipais em
todo o Brasil em 2004. Do acordo, a legenda recebeu apenas cerca de 4
milhões, não contabilizados. “Os repasses ficaram na ilegalidade e o
partido se valeu de mecanismos escusos como maletas repletas de dinheiro
e saques por meio de terceiros, sem que jamais tenha ficado claro o
real destinatário do numerário.” Lewandowski destacou que Jefferson
confessou ter recebido 4 milhões de reais em espécie diretamente do
publicitário Marcos Valério, em parcelas de 2,2 milhões e 1,8 milhões em
2004. “Nas duas oportunidades, Valério trouxe o dinheiro e as cédulas
estavam envoltas em fitas do Banco do Brasil e do Banco Rural.”
Ao dizer que o dinheiro pode
ter sido usado para financiamento de campanha, Lewandowski diverge de
Barbosa e do Ministério Público Federal, para os quais houve compra de
apoio político.
Para o revisor, depoimentos
de Emerson Palmieri confirmam a não contabilização dos recursos dados ao
PTB, a existência do acordo com o PT e o recebimento dos valores
diretamente do publicitário. “Em uma das ocasiões Jefferson e Valério
estavam no PTB em Brasília quando Palmieri entrou na sala, o valor já
estava sob a mesa.” Jefferson, ressaltou Lewandowski, mostrou-se sabedor
de que a soma poderia não ser lícita. “Ele disse que tinha a impressão
de que eram recursos do PT e confiava que o partido fosse legalizá-lo.
Dinheiro de eleição nunca é totalmente declarado, afirmou.”
De acordo com o ministro,
Jefferson assumiu a responsabilidade pelo repasse e recusou-se a
informar o destino dos valores. “Ele assumiu sua participação em todos
os eventos apontados pela acusação, que produziu as provas de sua
conduta”, disse. “O réu recebeu elevadíssima soma de dinheiro em espécie
em pessoa ou por intermédio para o seu partido, não podendo se excluir
que tenha usado o valor em proveito próprio.” A outra forma de repasse,
também comandada pelo ex-deputado, ocorreu por meio de Alexandre Chaves.
Ele recebeu em Belo Horizonte 145 mil reais solicitados a Delúbio
Soares, ex-tesoureiro do PT, para repassar a um publicitário que
prestava serviços ao partido com o qual havia um débito de 520 mil
reais.
Chaves também sacou 200 mil
reais para sua filha Patrícia, que mantinha um romance com o
ex-presidente do PTB José Carlos Martinez, morto em um acidente de
avião. O dinheiro foi solicitado por Jefferson para dar suporte à
mulher, que comprou um apartamento em Brasília com o valor. Além das
provas testemunhais, há comprovantes dos saques realizados por Simone
Vasconcelos, funcionária de Valério, e repassados a Chaves com as
assinaturas de ambos. “Há elementos suficientes que confirmam a acusação
da transferência destes valores por intermédio de Jefferson.”
O ministro destacou também
que 200 mil reais foram recebidos pelo coordenador do PTB-MG José Hertz
em Belo Horizonte nas agências do Banco Rural e Banco do Brasil. O
dinheiro foi trazido de avião a Brasília e entregue a Emerson Palmieri.
“Esta comprovada a materialidade dos saques e a interveniência de
Jefferson, que usou Palmieri e Romeu Queiroz.” Jefferson foi absolvido
da acusação de lavagem de dinheiro por ser um incurso do crime anterior,
não havendo “um segundo conjunto de fatos que poderiam caracterizar a
lavagem.” A lógica foi a mesma usada por Lewandowski ao analisar outros
réus do “mensalão”.
Revisor absolve Palmieri
O clima ficou tenso na corte
quando Lewandowski começou a analisar a conduta de Palmieri. Para o
revisor, o saque no valor de 50 mil reais vindos do PT por meio de
Valério, realizado por Hertz em Belo Horizonte, foi ordenado por Queiroz
e não Palmieri. O ministro ressaltou que Hertz trouxe o valor a
Brasília, sem provas de que o dinheiro foi recebido no aeroporto por
Palmieri. “Ele o implicou de forma confusa, mas foi categórico ao dizer
que recebeu a ordem de saque de Queiroz.”
De acordo com o ministro,
não é possível considerar o depoimento da testemunha devido a suas
diversas contradições. “Primeiro diz que as ordens de saque vieram de
Palmieri porque Queiroz estava viajando à época. Depois alega que veio
de Queiroz.” Por outro lado, prossegue, Palmieri nega ter recebido os
valores. “Há recibo de que um motoboy recebeu a soma e
surpreendentemente ele não foi ouvido nos autos para saber quem era o
destinatário.” Lewandowski trouxe uma série de depoimentos para
demonstrar que o réu não teria função relacionada às finanças no PTB,
sendo apenas um articulador político e secretário nacional da legenda.
Por isso, não teria relação com os saques.
Segundo o revisor, o mesmo
raciocínio pode ser aplicado a outros dois pagamentos na gestão de
Martinez, sacados pelo motorista Jair dos Santos. Um deles ocorreu com
caixa forte em Brasília, todos a pedido do ex-presidente do PTB. “Ele
disse que entregou tudo a Martinez. Não há relação com Palmieri.” Mas, o
revisor deixou a cargo dos demais colegas considerar um depoimento no
qual Simone Vasconcelos cita pessoas a quem teria entregue dinheiro,
entre elas Palmieri.
Sobre os saques de 145 mil
reais e 200 mil reais realizado por Chaves, o ministro sustentou que os
pedidos foram feitos por Jefferson, tendo Palmieri apenas orientado o
sacador a procurar Delúbio Soares. “O réu o fez sob ordens de Jefferson,
que assume a responsabilidade.”
Em outro episódio,
envolvendo a entrega de 200 mil reais levantados por Queiroz na sede do
PTB em Brasília o ministro também diz não haver provas contra o réu.
Segundo o magistrado, Hertz levou o valor ao partido e entregou o
recurso a Palmieri no meio de uma reunião. “Ele ficou surpreso, disse
que não poderia receber a doação sem recibo e que o dinheiro tinha quer
legalizado.” Por isso, levou o valor aos cuidados de Roberto Jefferson,
que disse que tomaria conta do caso. A versão foi confirmada por um
jovem com o qual fazia a reunião.
O ministro também refutou a
participação de Palmieri em uma viagem para Portugal, acompanhado de
Valério e Rogério Tolentino, na Portugal Telecom. A reunião com o
presidente da emnpresa teria, segundo a acusação, ocorrido para que
fossem levantados os 16 milhões de reais restantes do acordo do PT com o
PTB. “Não é possível deduzir que a finalidade era essa, pois algumas
testemunhas estão em colisão com as outras o que muitas vezes invalida
as provas.”
De acordo com o magistrado,
Valério se reuniu sozinho com o presidente do órgão e Palmieri ficou em
uma antessala, tendo um papel secundário na viagem. “Valério tinha a
intenção de negociar com a empresa a manutenção da SMP&B como
agência da Telemig, que seria comprada pela Telecom.”
PMDB
Lewandowski alegou ter
ficado comprovada a corrupção passiva de José Borba devido ao fato de o
réu ter recebido 200 mil reais a mando de Soares, por meio de um esquema
montado por Valério.
O revisor destacou, no
entanto, que não entendeu ter ficado comprovado que Borba recebeu o
dinheiro para votar em favor das reformas tributária e da Previdência,
conforme aponta a denúncia do Ministério Público Federal. “Não há prova
documental ou testemunhal disto, mas ficou decidido pela corte que para a
corrupção passiva não se faz necessária a identificação do ato de
ofício, basta o recebimento da vantagem indevida e isso ficou provado.”
À época dos fatos, Borba era
deputado federal e líder do PMDB na Câmara. O parlamentear recebeu o
montante em uma agência do Banco Rural em Brasília, por meio de Simone
Vasconcelos, funcionária de Valério, porque se recusou a assinar um
comprovante de saque e deixar uma cópia de sua identidade na instituição
financeira. “Os depoimentos demonstram que Simone Vasconcelos sacou o
valor no banco em espécie e o entregou ao réu, após se locomover
pessoalmente à agência depois da negativa de assinar o recibo pelo réu.”
O ministro ressaltou que o
tesoureiro do banco em Brasília, José Francisco de Almeida Rego, entrou
em contato com a agência em Belo Horizonte após a posição do deputado.
Foi informado de que uma pessoa iria à agência resolver o problema e que
fax em nome de Borba reveria ser rasgado porque uma nova autorização de
saque seria enviada para Vasconcelos. “Simone Vasconcelos chegou à
agência naquele mesmo dia após o fim do expediente comum, realizou o
saque e entregou ao deputado, que aguardava no local.”
Lewandowski entendeu não
haver lavagem de dinheiro por parte do ex-parlamentar. “O recebimento de
vantagem indevida oculta é elementar de corrupção passiva. Não há
ninguém que receba propina e o faça a luz do dia, ninguém passa recibo
de corrupção”, disse. A tese do ministro, já utilizada para absolver
outros réus, abriu uma discussão entre os ministros sobre o tema. Os
magistrados buscam um entendimento sobre se é possível haver crime de
lavagem em todos os casos em que se tem corrupção passiva.
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