Durante a ditadura militar no país, mais de 400 crianças foram
retiradas de seus pais, que eram militantes políticos, e adotadas por
pessoas ligadas ao regime. Outros militares também foram condenados.
A Justiça da Argentina condenou nesta quinta-feira (05/07) o ex-ditador
Jorge Videla a 50 anos de prisão pelo sequestro de bebês de presos
políticos durante a sangrenta ditadura militar no país, entre 1976 e
1983. O Tribunal Oral Federal 6 considerou que Videla foi o "autor
penalmente responsável pelos delitos de subtração, retenção e
ocultamento de um menor de 10 anos de idade" e que ele participou de
outros 20 casos.
O tribunal também condenou outras dez pessoas envolvidas com o
sequestro de bebês à época – entre elas o ex-capitão Jorge Eduardo
"Tigre" Acosta, antigo chefe de inteligência do grupo de tarefas da
Escola Superior de Mecânica da Armada (Esma), um dos maiores centros
clandestinos de detenção, condenado a 30 anos de prisão; Santiago Omar
Riveros, ex-comandante de Institutos Militares, sentenciado a 20 anos; e
Reynaldo Bygone, último ditador do período militar, condenado a 15
anos.
Videla, Tigre e Bygone já estão cumprindo sentenças perpétuas por outros crimes contra a humanidade.
As crianças foram tiradas de seus pais e adotadas ilegalmente, a
maioria por famílias de militares. O ato revela um dos piores crimes
cometidos durante o regime de terror que deixou cerca de 30 mil
opositores mortos.
"Em alguns casos, os criminosos já são pessoas idosas, por isso a pena
que lhes foi imposta equivale a uma prisão perpétua. Este é um dia
histórico, e vamos continuar", declarou Tati Almeida, integrante da
Associação de Mães da Praça de Maio, a um canal de televisão argentino.
Condenação celebrada
A condenação de Videla, 86 anos, foi celebrada por manifestantes
concentrados nas ruas próximas ao tribunal. Durante o processo, que
começou no final de 1996, o ex-ditador não se mostrou arrependido. Ele
se descreveu como um preso político, reconheceu o sequestro de bebês,
mas afirmou que eles não foram parte de um plano sistemático. Ele negou
ser o principal responsável pelo sequestro de bebês.
Numa entrevista à parte do processo, Videla chegou a afirmar que os
bebês foram sequestrados, "alguns com boas intenções, para dar um bom
lugar a filhos de terroristas, e outros para vendê-los".
Manifestante segura a foto do filho morto pela ditadura e celebra a condenação de Videla
"Todas as grávidas, a quem respeito como mães, eram militantes ativas
da máquina do terrorismo", disse o ex-ditador em sua defesa. "Muitas
delas usaram seus filhos embrionários como escudos humanos na hora de
atuar como combatentes", afirmou o ex-ditador, que no mês passado foi
transferido para uma cela comum
Videla era considerado o cérebro da ditadura militar na Argentina. Ele
foi um dos líderes do golpe de Estado que derrubou Isabel Martinez de
Perón, em 1976, e governou o país daquele ano até 1981.
Centenas de desaparecidos
A sentença desta quinta-feira refere-se ao processo que investigou o
roubo e a adoção ilegal de 34 bebês. No entanto, calcula-se que durante o
período da ditadura militar argentina mais de 400 crianças tenham sido
tiradas de suas famílias. Até hoje, apenas 102 conseguiram descobrir sua
verdadeira identidade.
Alguns dos bebês roubados nasceram em centros clandestinos de tortura.
As enfermeiras relataram que muitos foram amamentados pelas mães em
cativeiros durante dias. Já outros foram levados imediatamente. Não
houve registros de nascimento, o que dificultou e atrasou muito a
identificação destas crianças e o reencontro com seus pais biológicos e
familiares.
Quando a ditadura caiu, em 1983, a Justiça condenou os ex-membros do
regime por violação de direitos humanos. Anos depois, porém, estes
condenados foram beneficiados por uma anistia, revogada apenas em 2005
pela Corte Suprema de Justiça, a pedido do então presidente Néstor
Kirchner. Assim como sua esposa Cristina, Kirchner era militante
político na década de 1970.
Destinos alterados
Entre os que conseguiram encontrar a verdadeira família está o atual
deputado de Buenos Aires Juan Cabandié, atualmente com 34 anos,
militante do governo da presidente Cristina Kirchner. Ele nasceu na
Esma, onde sua mãe – com apenas 16 anos – esteve presa. Cabandié foi
adotado por um policial e ganhou um novo nome.
Algumas crianças, porém, nunca foram encontradas, como a neta de Maria
Isabel Chorobik, fundadora do grupo de direitos humanos Avós da Praça de
Maio. A organização tem como objetivo encontrar bebês roubados de seus
filhos desaparecidos durante a ditadura.
Chorobik busca a neta Clara Anahí Mariani desde 1976, quando ela tinha 3
meses de idade. Agentes do governo invadiram a casa dos pais de Clara,
matando a mãe dela e outros militantes de esquerda na cidade de La
Plata.
MSB/rtr/dpa
Revisão: Alexandre Schossler
Revisão: Alexandre Schossler
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